Yago Travagini é economista e consultor de mercado pela Agrifatto
Caroline Matos é zootecnista e trainee pela Agrifatto
Resumo da semana:
Já é a quinta semana consecutiva que o boi gordo apresenta alta, sustentado pela oferta escassa em todo o país. O preço do animal chegou ao patamar dos R$ 293,73/@ na média da última semana, evoluindo 2,51% no comparativo semanal e batendo a máxima histórica que fora observada na segunda semana de novembro/20. A variação mensal chega ser ainda mais impressionante, o boi gordo subiu mais de R$ 32,00/@ nos últimos 30 dias (mais de R$ 1,00/@ por dia), e agora flerta com os R$ 300,00/@. E a sustentação para essa valorização continua baseada na oferta escassa, visto que, mesmo com o aumento dos valores ofertados pelos frigoríficos, as escalas das unidades frigoríficas dificilmente ultrapassam os 6 dias úteis.
Pra onde o boi vai, o bezerro segue atrás. Esta frase resume o momento vivenciado pelos animais de reposição nas últimas semanas. A forte valorização do boi gordo nos últimos 30 dias continua a abrir espaço para a que os compradores de bezerro aceitem pagar mais pelo animal. Com isso, a cotação do bezerro evoluiu 7,61% na comparação com a sexta-feira retrasada, fechando a última semana cotado á R$ 2.791,34/cabeça, rompendo novamente as máximas históricas observadas ao fim de novembro/20. Apesar da evolução dos preços da reposição, a Agrifatto alerta sobre a compra desses animais a preços mais elevados há algum tempo, e detalha mais o risco dessa posição no capítulo “A compra do pecuarista”.
Enquanto no Brasil o caminho foi de estagnação, nos EUA a soja e o milho recuaram fortemente na última semana. Com o mercado reduzindo intensamente sua posição comprada durante a semana e a melhora das condições climáticas na safra sul-americana já aumentando a expectativa de aumento de safra, a CBOT sentiu tal posicionamento, e experimentou variação negativa de 5,70% para o milho e 7,28% para a soja. Tal pressão não encontrou respaldo no Brasil já que o dólar e a oferta ainda escassa no país auxiliaram a manutenção das cotações no mercado interno.
A dificuldade vista no escoamento da carne bovina no varejo, que faz o preço desta no atacado travar, começa a ganhar contornos mais gerais. Enquanto a proteína bovina ainda se mantém estável, as outras proteínas animais sofrem desvalorizações, na última semana quem mais sofreu foi a carcaça suína. O preço desta em São Paulo recuou mais de 8% no comparativo semanal, atingindo a mínima dos últimos cinco meses, ficando cotada à R$ 9,87/kg. Como a carne bovina está conseguindo se manter estável, a diferença entre essas voltou a bater recorde, atingindo a maior marca desde julho/20, com a proteína bovina custando 90% a mais que a suína no atacado paulista. Ainda que o movimento do boi gordo esteja atrelado a escassez de oferta, o atacado e o varejo vão dando cada vez mais sinais de possível saturação e o consumidor vai tendo escolhas com o custo-benefício cada vez melhores.
1. Na tela da B3
De olho na evolução do mercado físico, o boi gordo na B3 seguiu rompendo máximas para os contratos futuros. Entrando na sua última semana de negociação o contrato com vencimento para janeiro/21 atingiu os R$ 297,30/@ na última sexta-feira, valorizando-se 2,59% no comparativo semanal e atingindo assim a máxima histórica. O vencimento para maio/21 também bateu recordes e fechou a semana cotado à R$ 283,90/@.
Apesar de chegar as máximas, a volatilidade ainda afasta os operadores de mercado, o número de contratos (futuros + opções) em aberto cresce em ritmo lento, desta vez, o avanço foi de 4,73%, com um total de 25,05 mil contratos em aberto. A alta volatilidade vista no mercado do boi gordo tem afastado os operadores, não à toa o número de contratos em aberto neste início de ano é 58% menor que no mesmo período do ano passado.
No mercado de opções, as PUTs ainda dominam o cenário e crescem em um momento em que as cotações batem máximas. Na última semana, o total de opções de venda (PUTs) em aberto cresceu 5,05% no comparativo semanal, atingindo o total de 11,07 mil. Por outro lado, o mercado não vê as CALLs com preços atrativos e fogem de tal proteção, o número de opções de compra que já são pequenos (4,45 mil contratos), ainda recuaram 1,15% na última semana, flertando novamente com o menor volume dos últimos doze meses. Neste momento, o mercado aproveita a máxima, e, de olho na volatilidade começa a aumentar o volume de PUTs.
1.1 O que o mercado futuro proporciona?
As condições de negócios para aqueles que precisavam se proteger contra desvalorizações do boi gordo que já estavam boas, melhoraram ainda mais na última semana com a renovação das máximas no mercado futuro.
Como dito anteriormente, a volatilidade dificulta a operação de opções, pois tem tornado oneroso a proteção via tal instrumento. Ainda assim, para vencimentos mais curtos, boas condições de negócios se apresentam para aqueles que tem animais para venda e ainda não se protegeram. Para se ter uma ideia, a PUT para fevereiro/21 com strike nos R$ 285,00/@ tem um custo de R$ 2,35/@, menos de 1% do valor protegido. Para os meses conseguintes, a volatilidade elevada pesa e dificulta a compra de PUTs secas a preços atrativos.
As PUTs sintética podem servir como uma boa opção para aqueles que buscam se proteger para esses próximos meses, especialmente se realizada em ajuste com a venda de animais a termo, visto que pode melhorar o preço mínimo se comparada à PUT simples sem incorrer na incidência de ajustes até que o mercado bata o strike da CALL.
Com o rompimento de recordes nos futuros de boi gordo, a comercialização de animais via a venda de futuros na B3 continua a se apresentar como uma boa opção neste momento, no entanto, para aqueles que vão operar tal tipo de negociação, atenção aos ajustes e a margem de depósito. A atratividade maior se dá para o intervalo de maio/21, visto que as opções de venda se mostram mais caras do que o comum. A venda de futuros acima dos R$ 285,00/@, se mostra interessante nesse momento, visto que o mercado do boi gordo se encontra posicionado entre uma linha tênue de oferta muito escassa e preços da proteína animal no atacado em desvalorização, pressionando as margens frigoríficas. Desta forma espera-se um movimento das unidades frigoríficas na tentativa de baixar preços, a proteção a esta movimentação se mostra sobretudo estratégica.
O mercado a termo esfriou de vez, visto que os frigoríficos enfrentam dificuldade em compor escalas e também tem suas margens pressionadas, e do outro lado, os produtores continuam confiantes em altas ininterruptas, o que tem travado o comércio a termo.
2. Enquanto isso, no atacado…
A última semana foi morna para o mercado atacadista de carne bovina. A maior parte dos dias foi de baixa liquidez e pouca procura, ao final da semana houve uma pontual melhora no fluxo de saída, mas não foi suficiente para dar sustentação aos preços. Com isso, a precificação da carcaça casada bovina fechou a sexta-feira em R$ 18,40/kg, redução de 1,08% na comparação semanal. Outros produtos, provindos de boi inteiro, vaca e novilha, permaneceram estáveis.
Já o frango resfriado, continua andando de lado com tendência baixista, as cotações fecharam a semana em R$ 5,35/kg, queda de 1,38% na comparação semanal. Quando observada a evolução mensal, houve um pontual avanço de 0,85%. A comercialização da carne de aves se dá, principalmente, pelo descompasso entre a oferta e a demanda, como aponta o Cepea. O fraco escoamento, altos estoques e as exportações em ritmo cadenciado barram possíveis altas.
Cenário parecido é visto com as carnes de suíno, onde a carcaça especial suína fechou a quarta semana de janeiro negociada a R$ 9,87/kg, acumulando queda de 8,40% quando comparada a semana anterior. Na comparação mensal, a redução se aproxima dos 10%. Assim como o caso do frango, pelo menor ritmo de exportações e baixo consumo doméstico, os preços não resistem.
Para o mercado de ovos, os preços registraram alta de R$ 0,50 a caixa com 30 dúzias, pontuais 0,49 p.p. na comparação semanal, sendo negociados a R$ 103,50. Segundo relatos, as expectativas giram em torno de mais avanços nos próximos dias, porém, apenas especulação. Fato é que o poder compra do avicultor está no menor patamar da série histórica inicia em 2003 do Cepea, relacionado principalmente aos insumos nutricionais.
3. No mercado externo
Com mais de 1,22 milhão de toneladas enviadas para fora do país na terceira semana de novembro/20, as exportações de milho chegaram ao total de 3,49 milhões de toneladas nos 14 primeiros dias úteis de novembro/20. A média diária estabeleceu-se em 249,70 mil toneladas, 21,50% a mais do que fora registrado em novembro/19. Desta forma, a tendência é que o mês de novembro/20 seja o melhor da história para um mês de novembro em volume embarcado, com mais de 4,8 milhões de toneladas exportadas.
A evolução dos preços internacionais tem proporcionado uma melhora nos negócios para as empresas exportadoras. Isso por que o preço médio do milho exportado já subiu 7,29% no comparativo anual, chegando ao valor de US$ 182,2/t. Diante disso, a receita obtida com a venda de cereal brasileiro chegou aos US$ 636 milhões, com uma média diária de US$ 45,49 milhões, 30% a mais do que foi registrado em novembro/19.
Após duas semanas inicias frenéticas, os embarques de carne bovina brasileira apresentaram uma desaceleração forte na terceira semana de novembro/20. Foram 32,10 mil toneladas enviadas para fora do país na última semana, 29% a menos do que fora registrado na segunda semana de novembro/20. Com tal desempenho, a média diária embarcada do mês de novembro/20 reduziu 12% em relação a semana retrasada, se posicionando em 8,50 mil toneladas/dia. Ainda assim, se mantido esse desempenho até o fim do mês, romperíamos um recorde nos embarques diários de proteína bovina.
Com a manutenção do preço médio de venda na casa dos US$ 4,39 mil/t, a receita diária obtida também reduziu 12%, ficando em US$ 37,32 milhões/dia. Apesar do recuo, tal resultado ainda é 8% superior ao de outubro/20, quando a receita diária obtida rondava a casa dos US$ 34,52 milhões/dia.
Com um volume ínfimo de soja disponível, as exportações da oleaginosa continuam a recuar semana após semana. Desta vez, foram apenas 307,36 mil toneladas enviadas para o exterior durante toda a última semana, com isso, a média diária exportada de soja recuou para 88,75 mil toneladas, 14% menor que a média da semana anterior. A manutenção deste desempenho deve levar as exportações de soja a menos de 2,00 milhões de toneladas embarcadas em novembro/20, pior desempenho para um mês de novembro desde 2016.
A receita obtida com as vendas da oleaginosa atingiu os US$ 456,27 milhões no acumulado até a terceira semana de 2020, com os preços de exportações estabilizado próximo dos US$ 365/t, a receita média diária também recuou 14% no comparativo semanal, chegando a um valor de US$ 32,59 milhões/dia, 64% menor do que foi em novembro/19.
4. A compra do pecuarista
Após iniciar o ano em um relativa “melancolia” a reposição começou finalmente a embarcar na onda de alta do boi gordo. Aos poucos, os compradores de gado magro vão aceitando pagar mais caro pelo animal visto que as cotações do boi gordo vão extrapolando recordes e levando otimismo a atividade.
O preço do bezerro em São Paulo que começou o ano se desvalorizando frente as cotações de dezembro/20, cotado em média à R$ 2.400/cabeça na primeira semana do ano, começou a desenhar uma forte valorização a partir da segunda semana do mês e fechou a última sexta-feira cotado à R$ 2.791/cabeça, rompendo assim qualquer preço nominal que havia sido registrado no último ano e atingindo níveis recordes.
A animosidade e o otimismo se espalharam por todos os elos da atividade pecuária, apesar de ser o último a “embarcar” na alta de janeiro/21, o bezerro finalmente foi junto com o boi gordo. Ótimo para o criador, mas nem tanto para o recriador. Ainda que a cotação do animal gordo esteja atingindo patamares históricos, lembramos da máxima do mercado financeiro: “Rendimentos passados não são garantias de lucros futuros”.
A atividade de engorda no país passa por um momento muito bom, os animais de reposição que foram adquiridos a 12 ou 18 meses atrás (bezerros) e os que foram comprado a 3 ou 6 meses atrás (boi magros) a preços comparativamente “baixos” aos atuais (28% mais baixos), agora são vendidos em preços de boi gordo nominalmente recordes, isso é ótimo e garante uma rentabilidade muito boa.
No entanto, a reposição desses animais agora ganha contornos preocupantes sobre a margem, isso por que, o custo de aquisição do animal já está 52% mais caro do que há um ano atrás e os insumos de alimentação (segundo principal componente de custo de quem faz engorda de animais), como milho e farelo de soja, estão 64% e 121% mais onerosos quando comparados a janeiro/20. Entramos em uma janela de operação perigosa, mas ainda “saudável”, temos custos elevados, mas o boi gordo circula acima dos R$ 295,00/@ em São Paulo, o retorno ainda é positivo.
Este é o cenário atual, mas o que garante a manutenção dele para o bezerro comprado hoje (janeiro/21) e que será entregue em 2022? Nada.
O ciclo pecuário é forte e historicamente quem determina o preço do boi gordo são as fêmeas, ou melhor, o volume delas que são abatidas. Em 2020, tivemos o menor volume de fêmeas abatidas dos últimos 17 anos, e como o abate de machos permaneceu estagnado, a participação dessas no abate total caiu ao menor nível desde 2002. Não havia escapatória para o boi gordo, o preço deste tinha que subir.
E desculpem a redundância, mas o ciclo é cíclico. Os criadores estão segurando essas fêmeas, que estão produzindo um grande volume de bezerros que irá encher o mercado de boi gordo em algum momento. Provavelmente isso acontecerá nos próximos anos. Estamos nas máximas, mas como o gráfico abaixo mostra, o boi gordo não é capaz de se manter em alta constante e sem ser interrompido. Uma hora o preço irá cair, e se isso acontecer e você ainda estiver com o bezerro de R$ 2.700/cabeça na fazenda, o prejuízo é certo.
Por isso, vemos esse momento como o mais preocupante para as fazendas de engorda do país. Levar um bezerro há níveis máximos agora pode significar vendê-los em 2022 a preços de boi gordo que estariam longe dos R$ 300,00/@. O otimismo do mercado é geral, e a cotação do animal justifica, no entanto, o olhar de longo prazo deve estar atento a tais ressalvas, lembrando que a pecuária eficiente não se faz em um ano, mas sim em vários.
5. O destaque da semana
O destaque da última semana foi para as medidas políticas adotadas pelo governo estadual de São Paulo. Em um primeiro momento foi determinado endurecimento da quarentena na grande São Paulo, após o aumento no nível de disseminação da COVID-19, a cidade e regiões do interior irão regredir de fase no plano de reabertura econômica. De acordo com o secretário estadual de saúde, Jean Gorinchteyn, comentou que foi a pior semana em relação ao crescimento no número de casos, havendo uma elevação de 9% se comparado com a semana anterior.
A fase vermelha valerá para todas as cidades paulistas, e será implementada a partir de segunda-feira (25), com isso, o serviço presencial em bares, restaurantes, comércio e serviços não essenciais estão proibidos de funcionar das 20:00 até a manhã seguinte. Eventos também ficam suspensos enquanto a medida estiver valendo. Para autoridades da saúde frente às novas medidas, é que é preciso coibir aglomerações arremetidas por bares e restaurantes.
Além disso, ainda houve o corte de benefícios fiscais de ICMS no estado de São Paulo, que de acordo com o governo devem ser encarados como esforço conjunto para garantir investimentos em áreas prioritárias, como saúde, segurança pública e educação. A secretária de Desenvolvimento Econômico, Patrícia Ellen, declarou que as suspensões dos benefícios foram feitas em caráter emergencial e temporário.
A redução dos benefícios causou o desagrado de empresários e comerciantes de diversos setores, resultando em “tratoraços” para protesto contra mudanças. A pressão então surtiu efeito, e o governo recuou algumas das alterações. Contudo vários produtos foram afetados, dentre eles alimentos como carne e leite, máquinas e equipamentos, combustível, entre outros.
As duas notícias são de certa forma negativas para a cadeia da pecuária de corte, visto que, o consumo de proteína animal no food service paulista deve voltar a cair após a recuperação dos últimos meses e o aumento dos impostos para o setor cárneo deve trazer consigo maiores preços (sem maior rentabilidade a cadeia pecuária), dificultando o já complicado o escoamento de proteína bovina no varejo paulista.
6. E o que está no radar?