Yago Travagini é economista e consultor de mercado pela Agrifatto
Caroline Matos é zootecnista e trainee pela Agrifatto

 

Resumo da semana:

 

A pressão altista sobre o boi gordo ganhou um ar mais intenso na última semana. A escassez de animais prontos está dificultando o preenchimento de escalas por parte dos frigoríficos, e, mesmo com a demanda interna ainda derrapando, os preços do boi gordo seguiram firme e apresentaram valorização pela quarta semana consecutiva. A referência para o animal em São Paulo ficou em média cotado a R$ 286,54,20/@, 3,18% maior que na semana retrasada. Cabe a ressalva de nos dias finais da última semana, a cotação do boi gordo já flertava com os valores recordes observados em novembro/20, acima dos R$ 290,00/@, destacando a situação crítica vivenciada pelos frigoríficos no que diz respeito a oferta de gado pronto para o abate, com números comparáveis aos do mês de novembro/20, quando o abate de bovinos no Brasil chegou ao menor nível mensal dos últimos anos.
Seguindo a movimentação do boi gordo, o bezerro finalmente embarcou em uma valorização na última semana. O preço do animal voltou a fechar uma semana acima dos R$ 2.500/cabeça, recuperando o patamar que havia sido perdido no início de dezembro/20. A alta do boi gordo trouxe de voltas os compradores de reposição para o mercado, o marasmo e a desvalorização que preocupava esses participantes do mercado na primeira quinzena de dezembro/20, deu lugar a um otimismo generalizado, e com isso os preços da reposição se aqueceram e começaram o movimento de alta nos últimos dias.
Do lado dos insumos, o desempenho registrado na última semana continuou apontando para as altas das cotações, no entanto, as justificativas para as valorizações vieram em grande parte de fora do país. O preço do milho em São Paulo fechou a semana com alta de 1,86% no comparativo semanal, ficando cotado à R$ 83,73/sc. Essa variação positiva sobre os preços do cereal foi causada pela movimentação das cotações em Chicago, já que logo após a divulgação do relatório de oferta e demanda do USDA na terça-feira as cotações do milho na CBOT bateram limite de alta (5,00%), e com isso a semana se encerra com o preço do cereal em Chicago atingindo o maior valor dos últimos 41 meses, cotado a US$ 5,33/bu. No capítulo “a compra do pecuarista” abordamos de maneira mais complexa o que está acontecendo com o mercado e o que ainda pode acontecer.
Além do milho, a soja teve um bom desempenho na última semana, chegando a encostar na máxima histórica que foi observada no dia 11/11/2020. A cotação da oleaginosa em Paranaguá/PR voltou ao patamar dos R$ 170,00/sc, apresentando uma alta de 2,45% em relação à última sexta-feira da semana retrasada. Assim como no caso do milho, o preço da soja brasileira foi impulsionado pela valorização em Chicago, onde o relatório do USDA pontuou um estoque final de oleaginosa nos EUA ajustadíssimo em pouco mais de 3 milhões de toneladas, pressionando assim as cotações em Chicago que chegaram aos US$ 14,16/bu, com alta de 3,19% no comparativo semanal.

 

1. Na tela da B3

 

E pela segunda semana consecutiva de janeiro as cotações do boi gordo na B3 fecharam com valorização. O apoio da oferta escassa que tem feito o mercado físico buscar os R$ 290,00/@ abriu espaço para que os contratos negociados com vencimento em 2021 batessem suas máximas. O contrato para janeiro/21, que ainda detêm o maior volume de contratos em aberto, fechou a semana com alta de 2,64%, fechando a sexta-feira cotado a R$ 289,75/@. Já o com vencimento para maio/21 voltou a bater recorde durante a semana, chegando a ser negociado a R$ 282,60/@ na terça-feira, no comparativo semanal a alta foi de 1,27%, fechando a sexta-feira cotado à R$ 279,50/@.
O rompimento de máximas tem atraído de volta os operadores de mercado, não à toa o número total de contratos em aberto (futuro + opções) voltou a crescer após várias semanas consecutivas em queda. Até o final da última semana haviam 23,77 mil contratos em aberto, 1,93% a mais do que na semana retrasada, tal incremento foi puxado sobretudo pelos contratos futuros que registraram um volume 10% maior que na semana retrasada. Tal movimento traz de volta a esperança da retomada da liquidez dos futuros de boi gordo, que chegaram ao seu menor volume dos últimos anos na primeira semana de janeiro/21.
O aumento vertiginoso dos preços frente a máximas traz oportunidades de negócio para aqueles que necessitam proteger parte do seu rebanho, no entanto, com a volatilidade elevada, o número de opções de venda (PUTs) negociadas seguiu reduzindo pela 3ª semana consecutiva, com apenas 10,54 mil PUTs em aberto até o fim da última semana, o menor volume desde a primeira semana de junho/20.
Apesar da movimentação altista, há pouca consolidação por parte dos players de mercado sobre a posição tomada. Com exceção das Pessoas Físicas, que mantém uma grande posição comprada (+3,03 mil contratos), e dos Investidores Institucionais, que aumentaram levemente sua exposição vendida (-1,40 mil contratos) na última semana, os outros participantes do mercado não “apostam” de maneira contundente em nenhum direcionamento do mercado. O maior “culpado” para essa falta de interesse continua sendo a alta volatilidade implícita sobre o contrato do boi gordo, que dificulta o pagamento de prêmios aceitáveis sobre as opções e ao mesmo tempo assusta aqueles que querem operar futuros.

 

 

1.1 O que o mercado futuro proporciona?

 

Voltamos a romper recordes, de certa maneira se mostrando um bom momento para quem deseja se proteger de quedas. Por isso, atenção aos produtores que tem animais para serem negociados nos próximos meses, boas condições foram “postas à mesa”.
No caso das opções, ainda que a volatilidade esteja acima da média histórica dificultando a negociação de bons prêmios a serem pagos, com a cotação do contrato futuro do boi gordo para fevereiro/21 ultrapassando os R$ 290,00/@ e para maio/21 os R$ 280,00/@, as PUTs para esses meses entraram no seu melhor momento de negociação desde novembro/20. Com o custo médio de R$ 2,05/@ é possível proteger o valor de R$ 275,00/@ para fevereiro/21, considerando a volatilidade atual tal valor nos parece justo e é capaz de proteger a um preço historicamente elevado. Para os outros meses, a volatilidade pesa mais, e, desta forma, os valores pagos de prêmio estão elevados para os preços que protegem.
As PUTs sintética podem servir como uma boa opção para aqueles que buscam se proteger para esse período de maio/21, especialmente se realizada em ajuste com a venda de animais a termo, visto que pode melhorar o preço mínimo se comparada à PUT simples sem incorrer na incidência de ajustes até que o mercado bata o strike da CALL.
Com o rompimento de recordes nos futuros de boi gordo, a comercialização de animais via a venda de futuros na B3 continua a se apresentar como uma boa opção neste início de terceira semana do mês de janeiro/20. Ainda mais para o intervalo de maio/21, visto que as opções de venda se mostram mais caras do que o comum. A estratégia sugerida na semana passada de venda de 20% dos animais no patamar de R$ 276,00-280,00/@ para maio/21 continua no radar.
A pressão que a oferta está causando sobre os preços tende a continua durante esta próxima semana, visto que ao fim da última semana se consolidou uma valorização de R$ 0,50/kg sobre a carcaça bovina no atacado, que bateu novamente os R$ 18,50/kg. A janela de comercialização que pontuávamos como até o fim da última semana, se postergou para mais uma semana, no entanto, com a possibilidade de chegada de mais animais de pasto já no fim de janeiro/21, essa pressão forte causada pela oferta pode se dissipar.
Com a alta do boi gordo na B3, o mercado a termo voltou a se aquecer, no entanto, o volume de negócios continua pequeno, com os pecuaristas se mantendo fora das vendas.

 

2. Enquanto isso, no atacado…

 

Semana arrastada, mas resultou em reajustes positivos no mercado atacadista de carne bovina. Após a quebra de braço entre os players do mercado, a escassez de matéria-prima deu força para os avanços das cotações.
A carcaça casada bovina, que vinha sendo negociada a R$ 18,00/kg desde a última semana de 2020, valorizou R$ 0,50/kg, tanto para o boi casado castrado quanto para o inteiro, com os preços chegando a R$ 18,50 e R$ 18,00/kg, respectivamente.
As carnes de segunda, como dianteiros e pontas, que demonstravam melhor desempenho de venda ao decorrer da semana, mas sem força suficiente para mudar de patamar, também entraram na onda e valorizaram, as indicações dos produtos giram entre R$ 15,50 e R$ 16,00/kg.
Em contrapartida, a proteína suína demonstra baixo fluxo de saída no mercado atacadista, relacionado principalmente ao fraco consumo da população interna, cenário bem distinto do que vem ocorrendo com as exportações. Com isso, a carcaça especial suína encerrou a semana cotada a R$ 10,78/kg, acumulando desvalorização semanal de 7,15%, porém avanço de 4,56% ante o mesmo período do mês anterior.
Para o frango resfriado, os preços seguem praticamente estáveis, porém com tendência baixista. As cotações do produto encerraram a sexta-feira em R$ 5,43/kg, desvalorização de 0,96% quando comparado a semana anterior. Já na comparação mensal a baixa foi acentuada, acumulando queda de 11,57%.
No mercado de ovos, a semana foi de avanços, mas a tendência aponta para cautela durante nos próximos dias, relacionado principalmente menor poder de compra do avicultor, o que também atinge tanto o produtor de ovos quanto o de carne. As cotações da caixa com 30 dúzias encerraram a sexta-feira em R$ 103,00, valorização de 5,10% ante a semana anterior.

 

3. No mercado externo 

 

Com um desempenho muito fraco na segunda semana do mês de janeiro/21, as exportações de carne bovina observaram sua média diária desacelerar 26% no comparativo com a semana inicial deste mês. Foram 19,83 mil toneladas de proteína bovina embarcadas no acumulado da 2ª semana do mês, 51% a menos que na primeira semana.
Desta forma, a média diária do mês de janeiro/21 caiu para 6,05 mil toneladas, nível 7% abaixo quando comparado a dezembro/20.
O impacto sobre a receita seguiu o mesmo caminho, visto que o preço médio continuou estabilizado na casa dos US$ 4.500/t. A receita média diária caiu 26% comparado a 1ª semana do mês de janeiro/21, estabelecendo-se em US$ 27,30 milhões/dia. Ainda que seja 7% maior que a média observada durante o mesmo período do ano passado, este fraco desempenho da 2ª semana coloca em “xeque” o possível recorde que seria batido.
A redução vertiginosa da oferta continua a acometer os embarques de milho brasileiro para fora do país. Com cerca de 601,88 mil toneladas exportadas na 2ª semana de janeiro/21 (6% a menos que na 1ª semana), a média diária exportada no mês caiu 3% em relação a semana retrasada, estabelecendo-se em 124,32 mil toneladas/dia. Cabe a ressalva que apesar da piora nos embarques nas últimas semanas, a média diária do mês de janeiro/21 está 30% maior que no mesmo período do ano passado.
Com uma queda de 11% no preço médio comercializado, a receita caiu de maneira ainda mais intensa no comparativo semanal. Foram obtidos US$ 104,42 milhões com a venda de cereal na segunda semana do mês, 27% menos em relação a semana retrasada. Desta forma, a média diária obtida com a venda de milho chegou à US$ 24,69 milhões, 13% a menos do que era visto na 1ª semana do mês.
Praticamente sem oferta no mercado interno, as exportações de soja seguiram lentas na 2ª semana do mês. Foram 17,50 mil toneladas embarcadas na última semana, fazendo finalmente o contador dos embarques de oleaginosa sair do “zero” no Brasil. Ainda assim, a média diária embarcada no mês está em 1,75 mil toneladas, 86% menor que em dezembro/20 e 97% menor que em janeiro/20.
A receita seguiu caminho parecido, foram US$ 6,66 milhões obtidos com a venda de soja no Brasil na segunda semana do mês de janeiro/21, elevando a média diária do mês para US$ 666,7 mil. Cabe a ressalva de que os preços da tonelada da oleaginosa brasileira continuam elevados, cotados em média a US$ 381,00/t.

 

4. A compra do pecuarista

 

Como reportado na coluna do “resumo da semana”, o milho obteve um desempenho muito forte em Chicago, o preço do cereal na CBOT com vencimento para março/21 fechou a semana cotado à R$ 5,31/bu, uma alta de 6,94% na semana e o maior valor dos últimos 41 meses.
O relatório de oferta e demanda divulgado pelo USDA na terça-feira trouxe números ainda menores para a produção e estoques finais da safra 20/21 norte-americana. O reajuste na produção dos EUA foi de cerca de 8 milhões de toneladas, e fez o total produzido na última safra do país recuar para 360,25 milhões de toneladas. Ainda que seja 4,34% maior que a produção na safra 19/20, a demanda esperada para esta safra coloca os estoques finais nos EUA no menor nível das últimas sete safras, com 39,42 milhões de toneladas.
Grande parte dessa escassez de milho nos EUA vem da demanda externa, com um cliente antigo (mas que era pequeno) ganhando destaque e “secando” os estoques mundiais de milho, a China. Com o apetite do mercado consumidor de milho chinês crescendo em ritmo acelerado nos últimos dois anos, por conta do processo de melhora no processo produtivo de criação de suínos pós-PSA, o gigante asiático já aumentou suas importações em 290% nas últimas duas safras, se posicionando já como o principal importador mundial de milho na safra 20/21. Com isso, os preços em Chicago têm rompido recordes atrás de recordes nas últimas semanas, e batendo na casa dos US$ 5,30/bu.

 

 

Se nos EUA as cotações do milho flertam com patamares historicamente elevados, no Brasil o caminho não poderia ser diferente, ainda mais com o câmbio facilitando tal direcionamento. O preço do cereal no Brasil já rompeu a máxima histórica no mercado físico e futuro. Em São Paulo, as negociações do milho buscam o patamar dos R$ 85,00/sc, enquanto na B3, a referência para março/21 já está nos R$ 88,00/sc, em ambos os casos, a alta nos últimos 30 dias ultrapassou os 10%. Sendo a valorização em Chicago o grande “culpado” para essa alta dos preços do milho no Brasil.
E, mesmo com o boi gordo já experimentando uma forte valorização no mês de janeiro/21, em comparação com dezembro/20, a alta do milho ocorre de maneira mais intensa e coloca a relação de troca milho/boi gordo no pior nível desde maio/18, sendo possível comprar apenas 3,40 sacas de milho com a venda de uma arroba de boi gordo em São Paulo, sendo essa menor relação de troca para um mês de janeiro dos últimos sete anos.
A situação se torna ainda mais preocupante para o pecuarista que ainda não detêm milho pois a tendência é que os preços subam ainda mais até o mês de março/21. Isso por que, até lá a safra de verão que teve seu plantio atrasado ainda não deverá ter chego no mercado com a força suficiente para fazer os preços caírem a patamares mais “atrativos”. Por isso, para aqueles que ainda não compraram seu milho e tem necessidade de consumo para os próximo dois meses, não há outra mensagem a não ser: se apressem!
Visualizando um cenário de mais longo prazo, há expectativas de uma melhora da situação, principalmente com a chegada da segunda safra no país, no entanto, mesmo com a chegada dessa, o grande volume de cereal comercializado de maneira antecipada e a expectativa de uma demanda chinesa ainda aquecida levam a crer que as cotações do milho devem circular dentro do patamar atual de R$ 70,00-75,00/sc, isso, levando em consideração que teremos uma boa 2ª safra de milho para ser colhida, sem problemas climáticos. Para aqueles que ainda precisam comprar cereal para esse período (2º semestre), não vemos o momento atual como um bom período para realizar tais compras.

 

 

5. O destaque da semana

 

O destaque dessa semana fica para o comportamento do dólar, que passou por reduções alarmantes durante alguns dias da semana, mas se recuperou após a divulgação do pacote de estímulos de Biden e os temores sobre a política interna.
A moeda norte-americana operou a sexta-feira com forte pressão altista e encerrou a semana próximo aos R$ 5,31, variando positivamente 1,93% ante a véspera. Apesar da recuperação ante a véspera, ainda acumula queda de 1,92% na comparação semanal.
O estrondo sobre rumores da política interna, a respeito da pandemia de coronavírus, coloca os investidores estrangeiros em modo de alerta, o que prejudica o desempenho do real frete as outras moedas globais. Neste cenário, a moeda brasileira ainda performa entre as piores. Além disso, os juros em patamares historicamente baixos também barra possíveis melhoras.
Além disso, o atual presidente dos EUA, Joe Biden, divulgou o pacote de estímulos na última quinta-feira, 14. O chamado “Plano de Regaste Americano” promete US$ 1,9 trilhão para conter os danos causados pela pandemia, com foco na recuperação das famílias e empresas.
Com isso, o cenário global passa a ser mais otimista e apostar em uma possível recuperação, o que tem relação ao preço das commodities agrícolas, pois tem relação direta ao dólar e ao ambiente externo.

 

6. E o que está no radar?

 

Os preços da arroba no mercado físico são impulsionados pela baixa oferta de animais prontos para abate e as exportações aquecidas, o que vem aliado ao comportamento da moeda norte-americana nos patamares atuais, fornecendo assim, suporte aos preços. Com isso, a atenção se volta para o desempenho dos envios de carne bovina ao exterior nas próximas semanas, com atenção aos nossos principais clientes, os chineses.
Sobre o mercado interno, os próximos dias, com a chegada da segunda quinzena do mês, deverão revelar momentos poucos favoráveis para os preços no atacado, o que deve se agravar com pelo fim do auxílio emergencial e a taxa de desemprego em números alarmantes.
Desta forma, s “solidez” pela qual o boi gordo passa no atual momento é de certa forma delicada frente as preocupações que o desempenho do mercado interno traz consigo na 2ª quinzena do mês. Ainda assim, o cenário de preços demonstra que há perspectiva para que o preço do boi gordo se mantenha em patamares elevados, visto que a oferta imediata de animais para abate continua escassa, e os frigoríficos estão sofrendo para completar escalas.