Yago Travagini é economista e consultor de mercado pela Agrifatto
Caroline Matos é zootecnista e trainee pela Agrifatto
Resumo da semana:
Destaque para o corte acima do esperado na Selic, que deu o tom dos negócios no mercado brasileiro na última semana. Com a taxa de juros em 3%, os rendimentos reais ficam próximos ou inferiores a 0%, algo inédito no Brasil.
Isso levou o Dólar à máxima em R$ 5,88, levando consigo a soja que alcançou alta recorde de R$ 111,00/sc. O rompimento de máximas históricas tem sido uma constante no mercado da oleaginosa. Dada a situação atual, inesperada, inédita e com consequências de difícil mesura, a resistência dos R$ 6,00 parece possível e mais próxima a cada semana que passa.
Outro destaque positivo da semana foi o petróleo WTI, que voltou a ser negociado acima dos US$ 25,00/barril, com o alivio das medidas de quarentena em parte dos países europeus e estados norte-americanos, algo que deve retomar lenta e gradualmente a atividade econômica nessas regiões.
No mercado de proteínas animais, a movimentação no atacado começa a se alterar, em sinalização de ajuste após as movimentações reflexivas à crise atual.
Enquanto a carcaça casada bovina seguiu em leve queda no comparativo semanal (- 1,01%), o frango resfriado e a carcaça suína especial subiram 4%, devolvendo uma parte das enormes perdas acumuladas das últimas semanas. Ainda assim, a diferença entre o preço das proteínas alternativas (frango e suíno) e a carne bovina (spread) permanece em níveis recordes e muito acima da média histórica, ou seja, o mercado de proteína animal ainda tem bastante espaço para se ajustar.
Ainda assim, é possível que a semana seja pautada por valores em recuperação no atacado, já que o recebimento da 1ª parcela do auxílio emergencial levou ao aquecimento das vendas, também impulsionadas pela celebração do Dia das Mães.
1. Na tela da B3
Pela quarta semana consecutiva o preço médio semanal do contrato com vencimento para maio/20 subiu, ou seja, o mercado engoliu a diferença de quase R$ 13,00/@ que havia entre o preço físico e o vencimento maio/20, e chega à 2ª semana de maio cotado a R$ 194,95/@.
O valor do contrato com vencimento em outubro/20 não teve a mesma força e derrapou feio na última sexta-feira, fechando a semana 2% abaixo dos patamares registrados no início do mês, o que chama a atenção pelo fechamento brusco do spread.
O ajuste ficou em R$ 192,80/@, invertendo o spread, o que significa que o mercado futuro projeta o pico da entressafra mais baixo do que o fundo da safra de 2020. Isso pode ser considerado uma distorção, especialmente considerando o efeito tradicional do regime de chuvas sobre os preços.
Isso é reflexo especialmente do enorme grau de incerteza sobre as consequências da crise atual sobre o consumo doméstico de carne bovina, que faz com que os investidores não apostem em uma tendência futura e percam a confiança no comportamento sazonal dos preços.
1.1 O que o mercado futuro proporciona?
A busca por uma semana sem “bombas” foi frustrada já logo nesta segunda-feira pela suspensão da habilitação das maiores plantas australianas de carne bovina para exportar para a China. O tempo fechou por lá, mas isso ainda não refletiu sobre os contratos futuros, que seguem inertes e desvalorizando a curva futura, o que continua dificultando a fixação.
O mercado de opções seguiu sem grandes alterações nesta semana, caro e dificultando assim a trava via compra de PUT. A PUT sintética continua no radar sendo a estratégia mais interessante, especialmente se realizada em combinação com a venda de animais a termo, visto que pode melhorar o preço mínimo se comparada à PUT simples sem incorrer na incidência de ajustes até que o mercado bata o strike da CALL.
Os futuros do boi gordo para contratos mais longos perderam totalmente sua atratividade com a desvalorização registrada nos últimos pregões, de modo que se posicionar vendido na atual conjuntura pode parecer precipitado. A recomendação para o momento é aguardar.
Tal recomendação vem em linha com o posicionamento dos frigoríficos no mercado a termo, que estão voltando a ativar este mercado gradualmente para o 2º semestre de 2020.
2. Enquanto isso, no atacado…
No atacado paulista de carne bovina, mesmo trabalhando com estoques enxutos, as vendas foram bastante favoráveis no início da última semana. O mercado foi marcado por forte movimentação estimuladas pelo recebimento da 1ª parcela do auxílio emergencial, mas os preços se mantiveram em torno de R$ 13,00/kg devido às escalas alongadas e recomposição facilitada dos estoques.
O spread no atacado de carne bovina (diferença de preços entre a carcaça e a arroba do boi gordo) se manteve em campo positivo, encerrando a segunda semana de maio em campo negativo, ficando em -0,07%. É um bom resultado para o equivalente físico, entretanto, ele não diz muito sobre o resultado operacional da indústria.
O problema para a operação de mercado interno reside no custo operacional alto pela redução da utilização das unidades de abate, que tem encorajado o deslocamento produtivo para a operação de mercado externo, como já observado.
O frango resfriado voltou a perder força, encerrou a sexta-feira (08/05) em R$ 3,72/kg – queda semanal de 1,33%, retornando aos patamares de agosto/18. Na comparação mensal a queda acumulada é ainda mais marcante, ficando em torno de 10,37%.
As indicações da carcaça especial suína reagiram neste início de maio, registrando uma alta de 10,60% nos últimos sete dias, os preços giram em torno de R$ 6,30/kg. Entretanto, as cotações estão longe de voltar aos patamares do início do ano, quando estavam na faixa dos R$ 9,00 a 10,00/kg. No acumulado mensal a baixa é de aproximadamente 7,86%.
Após chegar a um pico há 3 semanas atrás, o preço do ovo no atacado paulista recuou novamente nesta semana, caindo pouco mais de 8%, demonstrando assim que a demanda pela proteína mais barata do mercado está se ajustando após longo período de valorização.
3. No mercado externo
Os envios de carne bovina iniciaram o mês de maio aquecidos. A Secretaria de Comércio Exterior (Secex) divulgou as exportações de carne bovina in natura referentes aos 5 (cinco) primeiros dias úteis de maio/20 que contabilizaram um volume total de 53,50 mil toneladas e uma receita de US$ 235,21 milhões.
A média diária registrada ficou em 10,7 mil toneladas – alta de 84,16% ante o mês anterior e avanço de 89,31% em comparação ao mesmo período do ano passado. O valor médio por tonelada registrou-se em US$ 4.396,23, aumento de 0,42% quando comparado com o valor médio de abril/20 e avanço de 13,32%.
Projeções preliminares apontam para exportações totais entre 150 e 180 mil toneladas enviadas até o final de maio, um cálculo considerando o histórico dos últimos três meses e uma queda nos embarques no final do mês. Com isso, o valor médio (165 mil ton) ultrapassaria o recorde de out/19, quando foram enviadas 160,10 mil toneladas ao exterior.
Se confirmado, o total exportado será em média 42% menor do que o volume enviado em abril/20 (116,30 mil toneladas) e avanço de 33% ante o mesmo período do ano passado, quando foram enviadas 124 toneladas.
Sem disponibilidade interna, os envios de milho continuaram tímidos na primeira semana de maio. Foram pouco mais de 10,86 mil toneladas encaminhadas para fora do país, com um total de receita gerado US$ 2,39 milhões.
O que impressiona é o preço da tonelada exportada que apesar de estar apenas 18,43% maior em dólares no comparativo anual, em reais o valor da tonelada já chegaria em R$ 1.254/t, ou seja, R$ 75,30/sc, o número impressiona, pois é quase o dobro do valor que era negociado no mesmo período do ano passado.
Os envios de soja continuam de vento em popa, foram 5,35 milhões de toneladas nos 5 primeiros dias de maio, o que dá uma média de 1,07 milhão de tonelada por dia. Esse número diário é 135,13% maior que o registrado no mesmo período do ano passado.
A receita obtida também impressiona, já que evoluiu 124,09% em relação a maio de 2019 e já chega a US$ 1,73 bilhão em cinco dias úteis, metade do que fora registrado em todo o mês de maio do ano passado, ou seja, os envios de soja caminham para bater mais um recorde mensal de exportações.
4. A compra do pecuarista
Maio chegou, mês de decisão, já que as entradas de bois em confinamentos começam a se intensificar e o planejamento desenhado em janeiro ganha forma. No entanto, se as compras de insumos não foram feitas antecipadamente – e elas precisam ser feitas agora -, a situação corre grandes chances de se complicar, já que os custos cresceram dramaticamente.
Um bezerro que era comprado a R$ 1.601/cab em SP em janeiro/20 já não é adquirido por menos de R$ 2.000/cab, ou seja, alta de mais de 25%. O foco de reposição do confinador, o boi magro em SP, acumulou alta de 22% entre janeiro e abril de 2020 e não sai por menos de R$ 2.800/cab no Estado.
A alta não vem só da reposição, uma das principais fontes proteicas utilizadas em confinamentos, o farelo de soja já acumulou alta de mais de 22% em 2020 e 43% entre abril/20 e abril/19. O milho, se acalmou no mês de abril, mas em relação ao ano passado a alta ainda é de 45%. O Dólar rompeu todas as máximas com força, e a tendência de novos cortes na Selic reforça a tendência de sustentação cambial.
Todos esses números apontam para um cenário em que o custo do confinamento se mostra historicamente elevado, batendo todos os valores já registrados. Com os contratos futuros desvalorizados, indicando que o boi gordo não acompanhará a alta dos custos, resta uma projeção conservadora acerca do volume de animais confinados que estarão disponíveis para compor as escalas de abate do segundo semestre.
Aliás as indicações no mercado físico e mercado futuro seguiram em descompasso, com o indicador Cepea avançando pouco mais de 3% entre jan/20 e abr/20 e o contrato futuro para outubro/20 caindo 5% no mesmo período.
Ou seja, o prognóstico que se constrói para pecuaristas que necessitam fazer compras de animais ou de insumos é negativo, e a percepção é de que a conta de custo e receita para os confinamentos não fecha em SP, e assim, poderemos ter um volume de gado ainda menor no 2 semestre de 2020. Não é à toa os frigoríficos voltam a ofertar o termo para o período neste momento.
A movimentação no mercado de grãos no Brasil continuará a ser pautada pelo Dólar. No entanto, o USDA divulgará os dados de oferta e demanda de grãos no mundo nesta terça-feira, e números maiores de estoques poderão movimentar ainda mais o mercado mundial de soja e milho.
Fonte: Broadcast AE / B3 / Agrifatto
5. O destaque:
O destaque da última semana foi o pronunciamento do governador de São Paulo, João Doria, que estendeu a quarentena até o dia 31/05. A medida que teve início no dia 24/03 deveria encerrar no 11/05, mas foi prolongada por mais 20 dias. Junto a nova data, o rodízio de carros também foi alterado, com a pretensão de diminuir a quantidade de pessoas circulando pela cidade. Isso reduz ainda mais o impacto de do auxílio emergencial no longo-prazo.
Além disso, na sexta-feira (06/05), o BC diminuiu pela sétima vez consecutiva a taxa de juros básicos da economia (Selic). O Comitê de Política Monetária (Copom) reduziu em mais 0,75 p.p. a taxa Selic, passando a ser 3% a.a. A nova taxa ficará em vigor pelos próximos 6 meses. Se trata do patamar mais baixo adotado pela política de juros nacional desde 1999, momento em que o Brasil adotou Regime de Metas de Inflamação.
A adoção dos cortes está diretamente relacionada a pandemia da Covid-19 que vem provocando uma desaceleração econômica do PIB global, queda nos preços da commodities e aumento da volatilidade nos preços de ativos, informou a autoridade monetária. O corte foi maior do que esperava o mercado (que previa algo em torno de 0,50 p.p.), e por isso, o dólar voltou a encostar nos R$ 5,90.