Gustavo Machado é consultor de mercado pela Agrifatto

 

O Departamento de Agricultura dos EUA (USDA) confirmou a importação de 1,13 milhão de toneladas de soja pela China na última quinta-feira (13/dez).

Em alguma medida, as importações já estavam precificadas na bolsa de Chicago, pela expectativa de que a China não conseguiria deixar de comprar a matéria-prima dos EUA na virada do ano – período de entressafra na América do Sul.

Por outro lado, as compras da China acontecem em momento oportuno, após a trégua anunciada no encontro do G20 e com a recente retomada das negociações – a princípio acontecendo via telefone entre o vice-primeiro-ministro chinês e o secretário do Tesouro norte-americano.

Mas adicionando um ponto de incerteza neste cenário, no dia 01/dez houve a prisão no Canadá da executiva da Huawei (empresa chinesa de tecnologia), provocando a detenção de dois cidadãos canadenses na China alguns dias depois, em 13/dez.

O fato é que no meio deste cenário nebuloso, a China parece ter concordado em reduzir de 40% para 15% as tarifas sobre carros e autopeças fabricadas nos EUA. Essa era uma importante demanda norte-americana, e que pode permitir avanços das negociações.

Em outras palavras, apesar do cenário exigir cautela, é preciso começar a considerar cada vez mais a possibilidade de a China voltar a comprar a matéria-prima norte-americana, o que pressionaria para cima os preços em Chicago.

E embora a volta da demanda chinesa cause viés altista, a oferta atual é mais ampla ante o início da disputa comercial. A produção deve subir 4,30% nos EUA, além de possível recuperação de 46,80% da produção Argentina, enquanto o Brasil deve manter os patamares recordes de produção em torno de 120 milhões de toneladas.

Soma-se ainda os estoques com soja dos EUA passando de 5,35 milhões de toneladas na temporada 2016/17 para a projeção de 11,92 milhões de toneladas em 2018/19 (alta de 122% em 2 safras).

Ou seja, oferta maior significa um limitante para a tendência de alta. E se o contrato na CBOT para janeiro/18 (atualmente o mais líquido), caiu 13,80% desde final de maio, uma recuperação entre 5,10% e 7,30% elevaria as cotações dos patamares atuais para níveis entre US$ 9,50 e 9,70/bushel – o que pode ser uma janela de possível novo equilíbrio, recuperando parte das perdas.

Para o Brasil, um acordo levará a prêmios menores, acomodando os preços domésticos, especialmente com o país mantendo níveis elevados de produção. E não se descarta que os prêmios voltem a operar em níveis negativos durante o período da safra.

Neste ponto vale outro destaque, recentemente um período de clima quente e seco começa a causar perdas em algumas lavouras brasileiras, o que pode colaborar para gerar nova pressão positiva.

Em resumo, ainda que os prêmios nos portos se acomodem, as quedas dos preços domésticos serão compensadas por cotações mais fortes em Chicago. Ou seja, um acordo levará a cotações internas menores, mas normalizando o mercado da soja após um ano de comercialização totalmente incomum.

A participação do câmbio também será fundamental. Atualmente, o dólar tem equilíbrio em torno de R$ 3,90, colaborando para sustentar os valores das commodities, mas também pressionam os custos de produção (combinando insumos em alta com os fretes já encarecidos).

Portanto, um acordo comercial criaria um ambiente com menos incertezas, que tanto travaram as vendas antecipadas nesta temporada, reduzindo riscos de longo prazo. Entretanto, a combinação será de preços menores com custos mais elevados em 2019, demandando maior cuidado no momento de comercialização.

Para o milho, as exportações também deverão avançar com as tensões mais amenas entre os dois países. A expectativas iniciais giram em tono de 3 milhões de toneladas do milho norte-americano para China.

Com consumo internacional aquecido, o valor do cereal teria valorização. Mas além disso, a principal pressão positiva para o milho brasileiro causado pela China, deve vir da ampliação de embarques com proteínas animais para o gigante asiático. E assim, a maior demanda da indústria brasileira de proteínas vivas deverá oferecer fôlego para os preços do milho no mercado doméstico.