Para o governo de Santa Catarina, não basta produzir alimentos de qualidade, é preciso ser sustentável. Com esse objetivo a Epagri está desenvolvendo o projeto Pecuária conSCiente Carbono Zero, que visa a redução das emissões de Gases do Efeito Estufa (GEE) provenientes da produção de bovinos.
Com o projeto, os pesquisadores da Epagri contribuem para o cumprimento do compromisso assumido pelo governador Carlos Moisés na COP 26 de reduzir em 50% as emissões de GEE e 30% as emissões de metano, até 2030. A Secretaria de Estado da Fazenda destinou R$2.573.200,00 para desenvolvimento das pesquisas, que serão realizadas em parceria com a Udesc, Embrapa, UFRGS e UFSC.
A agropecuária responde por cerca de 12% das emissões de gases do efeito estufa (GEE) mundiais. “No Brasil, do total de emissões, aproximadamente 28,5% são oriundos da agropecuária. A produção de bovinos de leite e de corte tem grande participação na emissão de metano, representando 65% de toda a emissão do país”, explica Tiago Celso Baldissera, pesquisador da Estação Experimental da Epagri em Lages e coordenador do projeto Pecuária conSCiente Carbono Zero. O Brasil tem o segundo maior rebanho bovino do planeta, com 218 milhões de animais, é o segundo maior produtor de carne bovina e o quarto maior produtor de leite do mundo.
Aquecimento global – A emissão de gases do efeito estufa é uma das responsáveis pelo aquecimento global. Tiago esclarece que a presença de metano e gás carbônico em concentrações elevadas na atmosfera impede que o calor irradiado pelos raios solares retorne ao espaço, provocando a elevação da temperatura do planeta.
Gás carbônico (CO2), metano e óxido nitroso são os principais causadores do efeito estufa. “Metano é o principal gás emitido pelos bovinos durante a digestão do pasto via eructação, ou seja, o arroto. Quando se trabalha a pecuária bem manejada, principalmente à base de pastagens, se consegue estabelecer estratégias de mitigação, para alcançar saldo positivo do balanço do efeito estufa, ou seja, capturar mais do que emitir”, descreve o pesquisador, lembrando que este é um dos objetivos do projeto.
A pesquisa vai também definir parâmetros que permitam calcular a pegada de carbono da pecuária bovina à base de pastagens em toda Santa Catarina. Segundo o pesquisador, a alimentação à base de pasto preconizada pela Epagri tem papel fundamental. “É a partir da raiz que as plantas vão acumular e armazenar carbono no solo. A planta faz a fotossíntese, onde captura CO2, utilizado para produzir folhas, colmos e raízes. Como a planta serve de alimento para os animais, as raízes constantemente se renovam. A raiz morta que fica no solo se degrada e o CO2 que foi obtido da atmosfera vai parar na raiz e é aí que vai acontecer o acúmulo de carbono”, descreve o pesquisador da Epagri.
Resultados esperados – Entre os resultados esperados do projeto estão a redução potencial de mais de 50% da produção de metano entérico; redução das emissões de óxido nitroso e de 30% da adubação nitrogenada; definição da intensidade das emissões de metano por bovinos de corte e leite; elaboração de recomendações técnicas de inclusão de aditivos nutricionais, manejo adequado de pastagens, introdução de leguminosas e de árvores que permitam aumento da eficiência e produtividade de bovinos em pastagens, com redução da intensidade das emissões de GEE; estabelecimento de recomendações técnicas visando o aumento da estocagem de carbono no solo, com potencial de incorporação de mais de uma tonelada ao ano de carbono.
Também serão gerados subsídios para políticas públicas, além de definição do potencial de agregação de valor para abertura de mercados para produtos de origem bovina, visando consumidores que valorizam a produção sustentável.
Investimentos – O projeto, que começou a ser executado em maio, tem prazo de quatro anos para ser concluído. Nesta primeira fase estão sendo adquiridos os equipamentos. O principal deles é o GreenFeed Pasture System, um analisador de emissão de gases metano (CH4) e dióxido de carbono (CO2) em bovinos. Tiago esclarece que o equipamento permite atingir objetivos de forma rápida, econômica e precisa, quando comparado ao método tradicional de avaliação. A compra elimina a necessidade de investimentos em estrutura física e equipamentos de laboratório para análise de gases emitidos pelos sistemas avaliados. Os equipamentos a serem adquiridos ainda têm como vantagens a obtenção dos resultados em tempo real. Também serão feitos investimentos em estrutura e instalações de campo para experimentos com animais, além da compra de outros itens e contratação de serviços
“O nosso desafio é mostrar para a sociedade catarinense e para o mundo que é possível produzir e conservar, oferecendo um alimento diferenciado dos demais estados e mostrando que os pecuaristas catarinenses colaboram na conservação ambiental por meio de boas práticas de produção”, argumenta Cassiano Eduardo Pinto, pesquisador da Epagri e um dos integrantes do projeto. Ele complementa: “a nossa pecuária, de corte ou leite, é pautada em pequenas propriedades e é muito difícil conseguir competir com a carne ou leite commodities, então nós buscamos, através do conhecimento gerado nos centros de pesquisa da Epagri e de instituições parceiras, mostrar que é possível diferenciar nosso sistema produtivo, com qualidade resultante dos fatores ambientais”.
Papel da agropecuária – A agropecuária tem papel fundamental na redução da emissão de gases do efeito estufa. No relatório do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC), lançado em 4 de abril, ficou claro que a redução nos próximos oito anos das emissões GEE no setor de agricultura, florestas e outros usos da terra no Brasil e demais países da América Latina e do Caribe é essencial para atingir a meta de limitar o aquecimento global a 1,5 ºC até 2030. “Esse setor é especialmente relevante para solucionar a crise climática porque pode proporcionar não somente a redução das emissões de GEE, mas também remover e armazenar CO2 em escala”, declarou Mercedes Bustamante, professora da Universidade de Brasília (UnB) e uma das autoras do relatório.
Neste cenário, a produção à base de pasto, preconizada pela Epagri, é uma importante aliada da pecuária catarinense na busca por sustentabilidade. Estudo realizado pela Embrapa apontou que pastagens degradadas são um sério problema por apresentarem balanço de carbono bem desfavorável, pois além das emissões dos animais também ocorreram emissões do solo, provenientes da decomposição e perda da matéria orgânica das áreas em processo de degradação.
Artigo assinado pelo pesquisador da Embrapa Rodrigo da Costa Gomes estabelece que apenas o bom manejo e a recuperação das pastagens podem não ser suficientes para atingimento da meta. “O bom manejo das pastagens continuará tendo que ser protagonista, para reduzir a idade ao abate e aumentar a produtividade dos rebanhos de cria. No entanto, a composição química do capim inevitavelmente favorece a produção de metano pela digestão dos bovinos, proporcionalmente à sua qualidade, o que exigirá eficiência ainda maior dos rebanhos e a integração de outras práticas complementares, com potencial de redução da produção do gás”, relata o pesquisador.
(Epagri-SC)