Motivados pela derrota simbólica que o governo federal teve esta semana dentro da Câmara, os deputados de oposição que tiveram ontem acesso ao texto de reforma da Previdência entregue por Jair Bolsonaro, começaram a buscar as fragilidades do projeto para fortalecer a bancada que se oponha às premissas sugeridas pelo Planalto.

Segundo parlamentares e assessores ouvidos pelo DCI, a oposição deve se concentrar em três frentes: apoio popular – principalmente dos servidores públicos; diálogo com deputados de centro que não concordam com o novo regime previdenciário para parlamentares, e inserção de ajustes no texto dentro das comissões especiais.

A expectativa é que PT e PSOL fortaleçam o diálogo junto aos trabalhadores e servidores públicos, criando pressão externa no Congresso. O PSB, por sua vez, deve atuar no diálogo com parlamentares sobre como vai se dar o processo de aposentadoria dentro do meio político. Por fim, PDT fará atuação propositiva, sugerindo alterações no texto dentro das Comissões. “Ainda que essa articulação da oposição não tenha se dado de modo formal, os papéis dos partidos que não estão na base de apoio de Bolsonaro fica cada vez mais claro”, diz o cientista político e doutor pela UnB, Bruno Ricardo Damasceno.

Na visão do acadêmico, até mesmo parlamentares que se dizem à favor da reforma tendem a se mostrar mais receosos com o texto enviado ontem. “É uma reforma muito mais ampla do que a sugerida por Michel Temer em 2017, e abocanha também os políticos e cidadãos de maior poder aquisitivo. Esse pode ser o calcanhar de Aquiles do texto de Paulo Guedes.”

Preparando terreno

Um dos fatores que fortaleceu a oposição nos últimos dias foi, justamente, a falta de diálogo do Planalto com o Congresso. Um deputado que integra um partido que apoiará a reforma contou à reportagem que há um descompasso entre Executivo e Legislativo. “Esperamos o Presidente sair do hospital, agora queremos entender qual é o papel dos aliados no processo da reforma.”

De fato, o único partido que hoje integra o governo, somado ao PSL de Jair Bolsonaro, é o DEM que, além de dois ministérios, tem a liderança da Câmara e Senado. “O Brasil tem 35 partidos, boa parte deles com deputados eleitos. O governo precisa sinalizar boa vontade a esses parlamentares para pavimentar o caminho que levará à reforma da Previdência”, avalia Damasceno.

É justamente nesse momento de ausência de diálogo que a oposição colocará em prática a estratégia. Marcelo Freixo (PSOL–RJ) e Jandira Feghali (PCdoB-RJ) são alguns dos deputados que começaram ontem a tratar das “fragilidades” do texto para marcar território.

Entre os temas questionados pela oposição está a necessidade de contribuição de 40 anos para que a aposentadoria seja efetuada integralmente. “O governo alardeia que, com a reforma, ‘rico se aposentará na idade do pobre’. Esqueceu de dizer que o pobre terá mais dificuldade para atingir o tempo de contribuição exigido”, disse a deputada do PCdoB.

Freixo, no PSOL, se mostrou contra a Capitalização. “A Capitalização seria trágica no Brasil, onde 40% da mão de obra sobrevive na informalidade e não tem capacidade de poupar. Segundo o IBGE havia 37,3 milhões trabalhando sem carteira assinada em 2017. Como pessoas vão capitalizar suas aposentadorias? A desigualdade vai piorar!”, alertou.

Disposto a dialogar com o governo, o deputado Mauro Benevides (PDT-CE), cotado para presidir Comissão de Seguridade Social e Família (CSSF), afirmou que a legenda não apoiará a reforma nos termos atuais, ainda mais se no regime de capitalização não houver contrapartida de contribuição patronal. “Esse, nós não abrimos mão”.

Na mesma linha de pensamento de Freixo, o deputado pedetista citou o Chile como exemplo negativo. “O trabalhador, que já é pobre e não consegue se aposentar com nada, não pode ganhar um salário.”

O período de transição também surgiu como argumento na oposição “Transição de 20 anos já é dura. De 12 anos é impor uma mudança com grandes impactos em um período muito curto”, disse a presidente do PT e deputada pelo Paraná, Gleisi Hoffman.

Nesse sentido, o deputado Paulo Teixeira (PT–SP) acredita que o texto mobilizará trabalhadores, e questões como a ausência dos militares na reforma e a falta de sensibilidade com realidades distintas dos brasileiros terá impacto bem negativo na opinião pública. (DCI)