As exportações do agronegócio brasileiro podem recuar US$ 10 bilhões caso se confirme um acordo pleno entre Estados Unidos e China, apontou estudo do Insper Agro Global. Esse recuo, entretanto, só ocorreria em dois anos ou mais, segundo o professor e pesquisador sênior do Insper Agro Global, Marcos Jank. Ele esclareceu que o impacto ainda não deve ser sentido em 2020, uma vez que os EUA enfrentaram quebra de safra de grãos na colheita 2019/20.

“Houve uma quebra mais de 20 milhões na produção norte-americana de soja e uma redução da mesma ordem na safra de milho. Primeiro teve muita chuva no começo do plantio, depois neve no momento da colheita”, destacou Jank. “Neste momento não tem como os norte-americanos recuperarem esse espaço, e o Brasil continuará sendo beneficiado nesta safra que está sendo plantada no País. Vejo impacto maior a partir da safra 2020/21.”

O estudo considera os volumes anunciados pelo representante comercial norte-americano, Robert Lighthizer, de que a China chegaria a um volume de compras de produtos agropecuários norte-americanos de US$ 56 bilhões em dois anos, com aumento de US$ 16 bilhões por ano em relação aos volumes adquiridos em 2017, que era de US$ 24 bilhões. “Realmente não acredito que esse acordo possa ser cumprido. Mas, se for cumprido na sua plenitude, a gente vai acabar sendo prejudicado”, apontou Jank.

O principal impacto seria na soja, que foi o produto brasileiro mais favorecido pela guerra comercial entre EUA e China. Entre 2016 e 2018, o Brasil aumentou as vendas do agronegócio para a China em US$ 14,6 bilhões, enquanto os EUA reduziram as exportações do setor para o país asiático em US$ 12 bilhões. Só de soja, o aumento das exportações do Brasil para a China no período foi de US$ 12,8 bilhões, enquanto a diminuição dos embarques dos EUA chegou a US$ 9,4 bilhões. “A gente se beneficiou muito da guerra comercial desde 2017. Houve uma explosão da exportação brasileira para a China e isso foi feito em detrimento dos EUA.” Em 2019, houve uma recuperação de parte dessas perdas norte-americanas por causa da trégua comercial entre os dois países.

Conforme o professor, a China pode ampliar ou reabrir mercados para outros produtos norte-americanos, como carne bovina, suína, de frango e algodão, em que o Brasil teve forte desempenho nos últimos anos. “Quando a gente olha todos esses produtos e o forte crescimento que o Brasil teve, não é difícil imaginar que, em um acordo pleno, o Brasil pudesse pagar uma parte dessa conta”, disse. “A gente compete com os EUA em praticamente 70% da nossa pauta exportadora do agronegócio.”

Jank destacou ainda que é preciso observar se EUA e China farão um acordo dentro das regras da Organização Mundial do Comércio (OMC) ou se haverá algum tipo de privilégio aos EUA em detrimento do Brasil. “Uma coisa é voltar a competir pelo mercado da China com os EUA nas mesmas condições. Outra coisa é a chave trocar de lado”, disse. “Esses dois anos de guerra comercial beneficiaram o Brasil por causa das tarifas impostas pelos EUA. Mas de repente a chave vira ao contrário, o Brasil poderia ser prejudicado por um acordo altamente benéfico aos EUA que descumprisse regras multilaterais.” (AE)