Na nova missão brasileira à China, na próxima semana, um dos objetivos do ministro da Agricultura, Carlos Fávaro, será assegurar apoios adicionais ao plano, ambicioso, de financiar a conversão de 30 milhões de hectares de pastagens degradadas em lavouras nos próximos anos e quase dobrar a área plantada no Brasil. Ele já apresentou a ideia a empresários chineses em sua viagem anterior a Pequim, no mês passado. A primeira empresa a ouvir a proposta foi a multinacional chinesa Cofco International, que deve participar de um projeto-piloto.
Fávaro quer contar com a ajuda internacional, principalmente dos países clientes do agronegócio brasileiro para dar andamento ao plano, que está em discussão desde a campanha eleitoral de 2022. Com as limitações do orçamento federal, o ministro sabe que o crédito rural oficial não será suficiente para bancar a transformação dessas áreas.
Nos cálculos da Pasta, transformar um hectare de pastagem improdutiva em área de cultivo agrícola custará, em média, US$ 3 mil, o que exigiria cerca de US$ 90 bilhões – o equivalente, hoje, a quase R$ 500 bilhões – em investimentos. Para efeito de comparação, todas as linhas de crédito do Plano Safra 2022/23, para produtores de todos os portes e perfis, totalizaram R$ 340,88 bilhões.
O ministro negocia com o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) a criação de um programa estruturado para financiar essa conversão de pastagens. Em paralelo, ele quer costurar com as tradings multinacionais a compra da produção dos grãos das áreas a serem recuperadas, o que geraria receita para os produtores e incentivaria a prática no campo.
A ideia é que os compradores da soja e do milho brasileiros ofereçam contratos de longo prazo aos agricultores para assegurar demanda firme pela produção dessas novas áreas de lavoura. Procurada, a Cofco não se manifestou.
A proposta inclui a possibilidade de antecipação de pagamento da safra, o que daria fluxo e capital de giro aos produtores. Na visão da equipe de Fávaro, o comprometimento dos importadores pode ser decisivo para complementar a oferta de recursos para as iniciativas de conversão.
O assessor especial do ministro, Carlos Augustin, disse ao Valor que o grande interesse por temas como sustentabilidade e crédito verde que os chineses manifestaram nas reuniões do mês passado surpreendeu a delegação brasileira. Segundo ele, o Brasil pode aproveitar esse momento para atrair os investimentos.
Augustin lembra que a parceria do Brasil com o governo japonês nos anos de 1970, por meio da agência Jica, foi decisiva para a abertura de áreas do Cerrado que transformou o país na potência agrícola que é hoje. Hoje, na segunda fase desse processo de evolução produtiva, que teria capacidade de quase dobrar a área de lavouras, o Brasil precisa do dinheiro da China e de nações árabes. “Esses países precisam garantir a segurança alimentar deles”, afirmou.
O ministério também quer criar um protocolo de sustentabilidade para a soja brasileira, a exemplo do que já existe para o algodão, considerado um modelo de sucesso e que tem reconhecimento dos importadores. A ideia, no entanto, é implementar algo menos complexo. No caso da fibra, existem vários programas de rastreabilidade e certificação por meio dos quais o comprador na China consegue identificar, via QR Code, em que fazenda ocorreu o cultivo da pluma.
Para a soja, o objetivo é “empacotar” algumas práticas que os produtores já adotam e garantir a eles uma classificação de sustentabilidade. O agricultor precisaria se encaixar em um determinado perfil. Entre os requisitos estariam o de produzir soja seguida de milho ou outra cultura de cobertura que proteja o solo e capture carbono e, também, o de expandir a produção em área de pasto degradada.
O protocolo produtivo estaria associado à proposta de financiamento para a conversão de pastagens. Os produtores apresentariam esse atestado de transformação de áreas aos países importadores mais exigentes, e de maneira antecipada.
(Valor Econômico)