Yago Travagini é economista e consultor de mercado pela Agrifatto
Caroline Matos é zootecnista e trainee pela Agrifatto
Resumo da semana:
E pela 11ª vez consecutiva o boi gordo finaliza uma semana sem saber o que é o seu preço médio semanal desvalorizar. Com isso, mais uma máxima foi batida, chegamos ao valor médio em São Paulo de R$ 252,09/@, valorizando 1,20% no comparativo semanal. A principal resposta para essa alta segue vindo da oferta, que, com um volume escasso dificulta qualquer reajuste negativo de preço ou até mesmo uma paralisação do movimento de alta. Nesta semana, tal fato se uniu ao câmbio que voltou a romper os R$ 5,50 e melhorou significativamente os negócios de carne bovina para o mercado externo. Ainda assim, há uma preocupação grande com a demanda interna.
A preocupação com o consumo brasileiro de carne bovina é algo que cresce, pois, sem uma valorização da proteína bovina no varejo e consequentemente no atacado, dificilmente a indústria encontrará espaço para continuar a pagar cada vez mais pelos animais. O cenário de consumo interno travado se dá pelo fato de que as classes com menor poder aquisitivo não estão conseguindo pagar valores cada vez mais elevados pelos cortes do dianteiro, o que tem impedido reajustes de preços da carcaça casada bovina no mesmo ritmo do boi gordo. O começo de mês deve dar um respiro para as cotações avançarem, no entanto, com as margens achatadas, já começam a pipocar notícias de frigoríficos optando por férias coletivas ou redução no abate.
Ao mesmo tempo que os frigoríficos visualizam uma forte valorização do boi gordo com preocupação, devido à dificuldade de repassar as altas ao varejo/atacado da carne bovina. A semana foi preocupante também para o produtor que foi cotar preços de insumos. O milho no mercado físico paulista valorizou mais de 6,50% no comparativo semanal, batendo a máxima histórica de R$ 62,45/sc, pressionado pelo câmbio que estourou, graças ao aumento da preocupação com o descontrole fiscal no Brasil.
Além do cereal, a compra de proteinado também assustou, isso porque o farelo de soja no Brasil embarcou em uma variação positiva de 7,00% em quase todo o país, e, não há tal insumo com um valor menor do que R$ 2.000/t em todo o país. E com a China aumentando as compras de grão e dificultando o acesso do mercado interno a oleaginosa, o esmagamento no país poderá reduzir consideravelmente, restringindo a oferta há níveis preocupantes. Ou seja, ao mesmo tempo em que viu o boi gordo surfar em uma alta, o pecuarista não vê sua margem melhorar pois os custos com a compra de insumos subiram ainda mais do que o animal.
1. Na tela da B3
O aperto da margem dos frigoríficos, com o preço do boi gordo se distanciando do preço da carne bovina ainda não transmitiu fraqueza para a cotação do animal na B3. O vencimento para outubro/20 valorizou 1,84% na última semana, fechando a sexta-feira cotado à R$ 251,85/@. Para maio/21, mês o qual há pouco mais de 200 contratos em abertos, a cotação recuou cerca de R$ 2,00/@ durante a semana, estabelecendo-se próximo dos R$ 241,00/@.
Recheado de indefinição sobre até onde dura o movimento de alta do boi gordo, e com alguns sinais piscando sobre a tela dos frigoríficos (margem da venda da carne bovina no atacado). Alguns dados compensam a despontar na nossa visão, um deles diz respeito sobre a proporção das opções de contratos de boi gordo na B3.
Ao longo de 2020, visualizamos o volume de negócios de opções aumentar significativamente, desde o início de junho/20, o total de opções negociadas na B3 cresceu mais de 145%, chegando ao final de setembro/20 com um volume de mais de 80 mil contratos de opções negociados. No entanto, em grande parte deste intervalo (junho-setembro), quem ditou o ritmo desse crescimento foram as CALLs, chegando a ter uma participação de 71% no total de opções em aberto.
No entanto, desde o início de setembro/20 começamos a perceber uma movimentação inversa, reduzindo o volume de CALLs em aberto e aumentando o volume de PUTs, indicativo de que o mercado de opções poderia estar começando um movimento de inversão. Na última semana, a participação de PUTs no total de opções em aberto atingiu 43%, o maior valor desde 29/04/2020. Tal aumento não é uma certeza de que o movimento de alta está “morto” ou de que agora iremos para uma maré de baixa, no entanto, pode ser um indicativo de que: sim, o mercado não está tão firme de que a alta perdurará.
1.1 O que o mercado futuro proporciona?
Poucas alterações em relação ao que pontuávamos anteriormente, valendo a ressalva de que os sinais de saturação da alta do boi gordo ganham mais volume (aumento do volume de PUTs em aberto).
No caso das PUTs, para 2020, a proteção continua válida pensando em riscos inimagináveis a exemplo do passado (carne fraca, delação do Joesley, etc), há opções com custo abaixo de R$ 1,00/@ que proteja cotações acima dos R$ 240,00/@. Para 2021, as opções mais atrativas são para jan/21, com PUTs acima dos R$ 225,00/@ custando menos de R$ 1,00/@. No entanto, para os meses restantes, as precificações ficam muito caras e não imprimem uma atratividade para a realização da proteção no atual momento.
Os futuros de boi gordo se apresentam como uma opção plausível, no entanto, vale a ressalva que a demanda financeira para este tipo de operação é elevada. O posicionamento de hedge em futuros mais interessante seria de olho em 2021, a venda de alguns contratos e uma pequena montagem de posição para produtores em maio/21 nos parece atrativa, com valores à R$ 241,00/@, próximo as cotações atuais. Tal recomendação se une aos sinais de saturação da alta que o mercado físico e futuro vem passando nas últimas semanas, podendo assim ser uma boa opção para proteção.
O mercado a termo começa a redução de ritmo, com negociações focadas apenas em novembro e dezembro de 2020, frigoríficos de mercado interno com margens apertadas estão repensando estratégias e devem aguardar a chegada do boi de pasto para ofertar preços a termo para 2021.
2. Enquanto isso, no atacado…
O atacado paulista de carne bovina, em decorrência da curta oferta, viu os preços cederem a pressão altista e registraram reajustes positivos na última semana. A dificuldade de escoamento no mercado interno tem deixado a ponta compradora com o pé atrás, entretanto, os aumentos são feitos pelo direcionamento da carne ao mercado externo, que foi favorecida pelo câmbio e pela baixa disponibilidade de produtos. Neste ambiente, a carcaça casada bovina retornou aos R$ 16,20/kg, demonstrando alta de 1,90% na comparação semanal.
Destaque também para o traseiro bovino, na composição do boi casado, que ultrapassou a casa dos R$ 19,00/kg e vem sendo negociado a R$ 19,10/kg, aumento de 6,41% ante a semana anterior. Já o avulso, chega a ser negociado a R$ 19,50/kg, com alta procura para atender a demanda de cortes mais nobres que são escoados principalmente pelas classes média/alta.
Enquanto isso, os preços do frango dispararam, o que pontua fortemente a migração do consumo para proteínas alternativas, deixando a carne bovina de lado pela população com menor poder aquisitivo. O frango resfriado, encerrou a sexta-feira cotado a R$ 5,80/kg, aumento de 4,80% quando comparado ao mesmo período da semana anterior e avanço de 13,85% na comparação mensal.
Já a carne suína está praticamente estável, o ajuste produtivo realizado e a alta procura pelo mercado externo sustenta as cotações atuais da carcaça suína no atacado. Neste ambiente, a carcaça especial suína especial encerrou a quarta semana de setembro em R$ 11,46/kg, ajuste negativo pontual de 0,61% na comparação semanal e alta de 7,91% ante o mesmo período de agosto/20.
3. No mercado externo
A segunda semana de julho/20 trouxe consigo aumento nos volumes embarcados de carne bovina para fora do país, a média diária saiu de 5,90 mil toneladas na 1ª semana do mês para 7,02 mil toneladas na 2ª semana do mês, com isto a média do mês está em 6,60 mil toneladas/dia. Já são 52,80 mil toneladas de proteína bovina embarcadas no mês de julho/20, enquanto que no mesmo período do ano passado foram 46,33 mil toneladas.
A receita obtida com a venda da proteína bovina já chega à US$ 215,80 milhões, com a média diária avançando 13% frente a semana passada, estabelecendo-se em US$ 26,97 milhões/dia. Apesar destes avanços, os números de julho/20 ainda estão abaixo aos de junho/20, o que poderia indicar uma redução mensal da exportação de carne bovina, no entanto, com 15 dias úteis restantes, estimamos que julho/20 reserve uma exportação entre 130 a 150 mil toneladas de proteína bovina, dentro da linha dos últimos meses.
Apesar da aceleração e da melhora de 6% na média diária de milho exportada para fora do país, os embarques de cereal ainda seguem lentos frente ao mesmo período de 2019. Nos oito dias úteis de julho/20 foram exportadas 809,41 mil toneladas de milho, com uma média de 101,17 mil por dia. No comparativo com julho/19 a redução nos embarques chega a 60,73%.
A receita gerada pelas exportações de milho chegou a US$ 130,51 milhões nestes oito dias úteis de julho/20, mais do que o dobro de todo o mês de junho/20, no entanto, assim como o volume enviado, a receita obtida ainda está em níveis bem abaixo quando comparado a 2019. A tendência é que os embarques se intensifiquem apenas em agosto/20, com números compatíveis com os de 2019.
Justificada pela redução na oferta de oleaginosa disponível, a média diária dos embarques de soja para fora do país reduziu praticamente ¼ dentro de uma semana, saindo de 648,09 mil toneladas na primeira semana para 489,45 mil toneladas na segunda semana. Ainda assim, os números de julho/20 são mais de 50% maiores dos os que foram registrando em julho/19.
A receita obtida com a venda da soja já ultrapassou US$ 1,00 bilhão, e mesmo com a redução na oferta, deve chegar a mais de US$ 2,5 bilhões até o fim do mês. A janela de envio de soja para fora do país vai se fechando no Brasil, dando lugar aos embarques de milho, que devem começar a ocupar o lugar da oleaginosa nos navios graneleiros.
4. A compra do pecuarista
Com a forte arrancada do dólar durante a semana, saindo da casa dos R$ 5,30 e chegando a ser negociado até nos R$ 5,60, os principais insumos alimentares surfaram em uma onda de alta. O preço do milho no mercado físico paulista superou os R$ 62,00/sc, atingindo assim um novo recorde nominal histórico para a cotação do cereal. Câmbio e a preocupação com o plantio da 1ª safra preocuparam o mercado e trouxeram o movimento altista que estava ausente do mercado físico do milho há algumas semanas.
A soja e seus subprodutos também obtiveram um forte movimento de valorização na última semana no mercado físico, o grão em Paranaguá/PR chegou a ser negociado acima dos R$ 150,00/sc e o farelo em Rio Verde rompeu os R$ 2.100/t. Com a escassez de oleaginosa tomando conta do mercado, a preocupação com abastecimento cresce e o câmbio se valorizando dificulta qualquer possível desvalorização que esteja no radar.
Como alertamos em alguns relatórios passados, o movimento das principais commodities brasileiras está sendo guiada pelo câmbio. Desta forma, com a forte e repentina alta do dólar frente ao real no último dia, os “momentos” de compra se encerraram por enquanto. Na nossa opinião, apenas necessidades que atendem uma demanda “da mão para a boca” devem ser atendidas. O ideal é esperar um movimento de arrefecimento e calmaria para o câmbio para voltar as compras de insumos.
Cabe a ressalva de que mesmo com a valorização de mais de 5% do milho no mês de setembro/20, a relação de troca boi/milho melhorou no durante esse mês, devido ao fato de que o boi gordo subiu mais de 8%. Com a venda de uma arroba de boi gordo é possível adquirir 4,15 sacas de milho, valor dentro da média dos últimos cinco anos.
5. O destaque da semana
O destaque desta semana fica para o aumento de casos de PSA (Peste Suína Africana) na Alemanha, que já contabilizam 32 animais contaminados desde a descoberta do primeiro caso em 10 de setembro. Apesar de apenas casos com animais selvagens, como javalis, terem sido descobertos, muitos países já suspenderam as importações de carne suína do mercado alemão, por se tratar de uma doença altamente contagiosa. Todos os javalis foram encontrados na região de Brandeburgo, no leste do país.
Com relação a proibições, o mercado chinês proibiu por uma semana as importações de frutos do mar da empresa brasileira Monteiro Indústria de Pescados LTDA. A decisão vem após a detecção de coronavírus em um pacote de peixe espada congelado, segundo a alfândega chinesa.
Vale a pena ressaltar que ainda não existem comprovações científicas de que a contaminação de covid-19 ocorra através de alimentos, entretanto, o gigante asiático tem estreitado fortemente os controles sanitários a fim de barrar novas infecções no país.
Há ainda uma expectativa da onde os países importadores da carne suína alemã irão optar para se abastecer com o atual embargo a Alemanha. Os números das exportações brasileiras tanto de proteína suína quanto bovina não apresentaram alta nos últimos dias, no entanto, há uma expectativa de que isso aconteça em outubro/20.
6. E o que está no radar?