Yago Travagini é economista e consultor de mercado pela Agrifatto
Caroline Matos é zootecnista e trainee pela Agrifatto
Resumo da semana:
O mês de setembro/20 iniciou com o boi gordo emplacando mais uma semana de valorização, esta já é a oitava semana consecutiva em que o animal registra alta nas cotações médias semanais. O indicador fechou a semana com média de R$ 238,89/@, rompendo pela segunda semana consecutiva o recorde do preço médio semanal do boi gordo. A pressão sobre a oferta segue forte, principalmente nos estados de MT e GO, onde a dificuldade para originar animais está grande. O respaldo para que os preços do boi gordo aumentem vem do atacado, onde a cotação do boi casado estabeleceu-se nos R$ 16,00/kg, próximo as máximas históricas.
O avanço no atacado não se resume apenas a proteína bovina, a cotação da carcaça suína especial em São Paulo avançou 3% na média semanal, estabelecendo-se acima dos R$ 11,00/kg, mais uma vez, máxima histórica. O frango resfriado chegou a subir 2% nesta semana, encerrando a última semana próximo dos R$ 5,00/kg. A consolidação dos preços das proteínas substitutas a carne bovina abre espaço para que a cotação dos R$ 16,00/kg da proteína bovina se sustente e avance ainda mais.
Após subir fortemente nas últimas semanas, com apoio do dólar e da cotação em Chicago, o milho brasileiro teve uma semana de desvalorização no físico e realização de lucros na B3. O enfraquecimento do dólar foi o principal driver que resultou nas consecutivas quedas do cereal nos últimos dias, fechando a semana abaixo dos R$ 60,00/sc. Na B3, os indicativos para novembro/20 apontam cotações abaixo dos R$ 57,00/sc. Fato é que com o dólar abaixo dos R$ 5,40 o milho brasileiro encontra dificuldade para ficar competitivo no mercado externo, e operações de washout se tornam cada vez mais comum.
Por fim, no ambiente externo mundial, vimos a forte desvalorização do petróleo WTI, caindo 8,18% no comparativo semanal, fechando a sexta-feira abaixo dos US$ 40,00/barril, fato que não acontecia desde 13/07/2020. Os preços do betuminoso despencaram após a divulgação dos dados de demanda por gasolina, que apresentaram queda no consumo nos EUA, principalmente por conta dos furacões que atingiram o sul do país nos últimos dias.
1. Na tela da B3
Após ignorar praticamente qualquer reajuste no intervalo de R$ 230,00-240,00/@ nas últimas semanas, o preço do vencimento para outubro/20 na B3 fechou a sexta-feira em R$ 241,15/@. Cotação cerca de 2% menor frente a máxima que foi atingida na quarta-feira (R$ 247,40/@), demonstrando que o mercado realizou lucros na quarta e quinta-feira, “limpando” um pouco a base dos antigos compradores.
Além disso, vale ressaltar que os indicativos de preço para outubro/21 já estão aparecendo na B3, dando valor de R$ 241,65/@. Para maio/21, a cotação do contrato chegou a ser negociada à R$ 240,00/@.
A operação de realização de lucros (ao invés de perda de força do mercado) parece ficar mais clara quando se analisa o número de contratos em aberto (futuros + opções), que reduziu 9% no comparativo semanal, com pouco mais de 101 mil contratos em aberto. A maior redução foi nos futuros, que teve seu volume diminuído em 15%, para 20,80 mil contratos.
O movimento de correção movimentou também os participantes do mercado, com as Pessoas Físicas diminuindo a exposição comprada, enquanto que, as PJs não financeiras reduziram a posição vendida. Ainda assim, o posicionamento final pouco se alterou, com as Pessoas Físicas ainda posicionado com um saldo de mais de 4 mil contratos comprados, “apostando” assim em uma possível valorização.
1.1 O que o mercado futuro proporciona?
A desvalorização recente abordada anteriormente trouxe grande receio ao mercado, mas como ressaltamos anteriormente, acreditamos em um movimento de correção e não em uma queda generalizada e fundamentada, isso por que o físico segue sustentado e valorizado, com oferta restrita e demanda externa latente.
O cenário de precificação de futuros e opções teve poucas alterações em relação a semana passada, neste momento, acreditamos que o pensamento para quem busca o hedge deve começar a ser atentar para o cenário 2021.
A consolidação do boi gordo acima dos R$ 240,00/@ ante o período de maior demanda no país (fim de ano), abre espaço para visualizarmos que há espaço para que as cotações avancem mais. Acreditamos que a prevenção para 2020 é agora para os “cisnes negros”, as PUTs com strikes R$ 225,00/@ até novembro/20, são cotadas abaixo dos R$ 1,00/@. Para quem busca a mitigação de risco total para o restante da operação 2020, a compra dessas PUTs se apresenta bem atrativa.
Para maio/21, acreditamos que a PUT sintética segue no radar sendo uma estratégia atraente, especialmente se realizada em ajuste com a venda de animais a termo, visto que pode melhorar o preço mínimo se comparada à PUT simples sem incorrer na incidência de ajustes até que o mercado bata o strike da CALL. Uma boa operação a se analisar no atual momento.
Com as correções realizadas durante os últimos dias, novos suportes e resistências foram criadas, os futuros de boi gordo para outubro/20 teriam como alvo no canal de “alta” próximo dos R$ 243,50/@, o desempenho do animal no mercado físico nos próximos dias é o que dará o aval para o rompimento dessa resistência, e assim buscar alvos que chegariam aos R$ 254,00/@. Os fundamentos do mercado físico nos apontam que há espaço para que o boi gordo avance ainda mais nos próximos meses, dentre eles, oferta restrita, demanda chinesa forte e mercado interno aceitando valores maiores pela proteína bovina.
O mercado a termo continua calmo, com poucas ofertas por parte dos frigoríficos aparecendo no radar dos produtores, a escala é preenchida da “mão para boca”.
2. Enquanto isso, no atacado…
A última semana foi de bons frutos para o mercado atacadista de carne bovina, que continua favorecido pela competitividade com as outras proteínas, com os preços alcançando a casa dos R$ 16,00/kg na carcaça casada bovina.
Neste ambiente, os preços passaram por um reajuste positivo de 3,90% na última semana e alta de 8,84% ante o mesmo período do mês anterior. Com isso, mais recorde foi rompido e mais um patamar foi alcançado.
Com relação as outras proteínas, o ambiente também é favorável, principalmente para a carne suína. Assim como na carne bovina, os embarques aquecidos e a menor oferta de animais, tem pressionado positivamente os preços da proteína suína. A carcaça especial suína passou a casa dos R$ 11,00 e, fechou a semana cotada a R$ 11,26%, alta de 3,26% na comparação semanal e 17,30% ante o mesmo período de agosto/20.
No caso do frango resfriado, as cotações encerram a primeira semana de setembro em R$ 5,03/kg, registrando alta de 4,15% ante a última semana de agosto/20. Já se comparado ao mesmo período do mês anterior, a alta é de 9,00%.
3. No mercado externo
A primeira semana de setembro/20 demonstrou que os embarques de carne bovina continuam aquecidos nos portos brasileiros, a média diária ultrapassou as 8,22 mil toneladas, representando um avanço de 25% frente aos números de setembro/19 e 6% maiores do que a média diária de agosto/20. Mantido esse ritmo, provavelmente teremos o melhor mês de setembro da história para a exportação de carne bovina brasileira.
Com um preço médio de US$ 4,07 mil por tonelada (2% melhor do que a média de agosto/20), as vendas de proteína bovina brasileira geraram US$ 133,94 milhões nos quatro primeiros dias úteis do mês de setembro/20, imprimindo uma média diária de US$ 33,48 milhões, 7% maior que os números do mês de agosto/20.
Com a escassez de soja nos portos brasileiros, o milho ganhou de vez a dianteira nos embarques de grãos no Brasil. O volume diário de cereal embarcado pelo Brasil na primeira semana de setembro/20 ficou em 472,69 mil toneladas, 53% a mais do que a média diária do mês de agosto/20, com tais números a expectativa é de que o total exportado ultrapasse as 8,5 milhões de toneladas.
A receita obtida com as vendas de milho ultrapassou a da soja nos 4 primeiros dias úteis do mês de setembro/20, com um total de US$ 321,07 milhões, representando uma média diária de US$ 80,27 milhões, 61% a mais do que o mês de agosto/20. Seguindo esse ritmo, o milho poderá gerar mais de US$ 1,5 bilhão de divisas para o Brasil durante o mês de setembro/20.
Perdendo força devido a “falta” de grão em todo o país, as exportações de soja do Brasil na primeira semana de setembro/20 atingiram 755,07 mil toneladas, a média diária de 188,77 mil toneladas está 36% menor do que a média diária do mês de agosto/20, destacando a escassez da oleaginosa no território brasileiro.
Dificultado pela originação escassa, os preços de exportação voltaram a subir, valorizando 3% no comparativo mensal, e atingindo US$ 363,9/t. Ainda assim, a média diária da receita obtida com a venda externa de soja ficou 35% menor que em agosto/20, chegando a US$ 68,69 milhões.
4. A compra do pecuarista
O mercado de insumos teve uma semana mais calma, abrindo um espaço para compras, principalmente para aqueles que necessitavam adquirir milho. O cereal teve uma semana pressionada para baixo por conta do dólar e pelos vendedores mais “abertos” a negociar a preços menores, não à toa, o preço em São Paulo voltou a ficar abaixo dos R$ 60,00/sc. Na B3, o vencimento setembro/20 chegou a ficar cotado abaixo dos R$ 56,00/sc, reduzindo mais de R$ 5,00 desde a máxima na segunda-feira.
As próximas três semanas serão importantíssimas para o preço do milho no Brasil no resto do ano, a definição da safra norte-americana em conjunto com a consolidação do ritmo das exportações de milho brasileira pode determinar o rumo para onde o preço do cereal vai. Como visualizamos que o dólar deve permanecer acima dos R$ 5,00 no curto prazo, não vemos muito espaço para que o milho recue abaixo dos R$ 50,00/sc em São Paulo até mar/21.
E pensando em 2021, acreditamos que a reposição está chegando próximo de um “ponto de virada”, isso por que, o ágio do bezerro sobre o boi gordo está recuando desde abril/20, demonstrando que o fôlego da valorização do animal de reposição está cada vez menor, e, mesmo batendo as máximas em São Paulo, com o bezerro sendo cotado a mais de R$ 2.250/cabeça, o espaço para maiores avanços está cada vez mais limitado, com o próximo ano desenhando um cenário de estabilidade para esse animal.
A compra do animal no atual momento significar levar um custo de aquisição do animal de mais de R$ 300,00/@ para ser entregue, no mínimo, em meados de 2021. E, sem o travamento de preço/margem, pode significar um risco elevado, ainda mais se a entrega desse bezerro for realizada em 2022, quando a percepção de descarte de fêmeas por conta do ciclo pecuário estiver mais acentuada e a China reduzir as compras por conta da recuperação do rebanho de suínos. Atenção ao levar esses custos atuais para 2022!
5. O destaque da semana
O destaque da última semana fica a divulgação dos dados de abate de bovinos, referentes ao mês de agosto no Mato Grosso pelo Indea-MT (Instituto de Defesa Agropecuária do Estado de Mato Grosso), que sinalizaram um recuo de 3% em comparação a julho/20, e alcançaram o menor número de bovino abatidos para um mês de agosto desde 2016.
Quem puxou o resultado para baixo foram as fêmeas, que reduziram o volume total abatido em 18% no comparativo mensal, com pouco mais de 163 mil animais encaminhados para a linha de abate. A proporção de fêmeas no total abatido chegou ao menor nível de 2020, com um valor de 33%.
Outro movimento perceptível e que começou a dar sinais da sua chegada advém dos animais de confinamento. Isso por que a participação dos animais com menos de 24 meses no abate total cresceu 6 p.p. em relação a julho/20, atingindo 29% do total abatido no mês de agosto/20, o maior volume da história, com 143,21 mil bovinos abatidos com menos de 24 meses.
Com esse recorde no volume de animais abatidos com menos de 24 meses, uma dúvida sobre o confinamento paira no ar. Será que poderemos ter um volume de confinamento maior que o esperado? Estabelecendo-se acima até mesmo do que foi em 2019? Veremos a resposta para essas perguntas em outubro, quando de fato o mês se caracteriza por oferta de animais exclusivamente de confinamentos, diferentemente de agosto, quando há rebarba de bovinos de pasto/suplementados à pasto.