Yago Travagini é economista e consultor de mercado pela Agrifatto
Caroline Matos é zootecnista e trainee pela Agrifatto
Resumo da semana:
Sem “oferta”, o mercado do boi gordo registrou alta pela terceira semana consecutiva, fechando a semana com um valor médio de R$ 215,99/@, alta de 3% frente a semana passada e o maior valor desde a primeira semana de dezembro/19. Cabe ressaltar, que, alguns dias antes desta semana de dezembro/19, os frigoríficos se depararam com um “vácuo” na oferta de animais, fazendo com que tivessem que aumentar os indicativos em até R$ 20,00/@ no intervalo de um dia. Desta vez, a valorização do boi gordo tem sido constante e sustentada, o que demonstra que os atuais devem se consolidar.
No atacado da carne bovina, onde a disputa era forte entre compradores e vendedores, a semana encerrou com notícias boas para os vendedores que venceram a queda de braço e conseguiram imprimir uma valorização na carcaça casada. Com o patamar de R$ 14,00/kg estabelecido e resistente a desvalorizações nas semanas vindouras, graças a oferta restrita.
A volatilidade do mercado de câmbio não deu trégua no Brasil, com mais uma semana de valorização do dólar, que fechou a sexta-feira próximo dos R$ 5,49, variando positivamente mais de 3% na semana. A tensão com a 2ª onda da COVID-19 nos EUA cresceu na última semana, já que o número de casos voltou a crescer e bateu o recorde anterior, com mais de 40 mil casos registrados apenas na quinta-feira. O pessimismo voltou a rondar o mercado financeiro mundial com esse aumento vertiginoso no número de casos.
Quem não lidou bem com isso foi o milho nos EUA, que despencou mais de 5% no comparativo semanal, puxado pela desvalorização do etanol (- 6,45%). A reabertura mais lenta da economia norte-americana e o padrão climático que mantem as previsões de uma grande safra de milho, estão puxando a cotação do cereal norte-americano. No entanto, no Brasil, mesmo com a colheita ganhando força e caminhando para mais de 15% do total colhido, as cotações do cereal seguem firmes.
1. Na tela da B3
Acompanhando o mercado físico, os contratos futuros seguiram em valorização nesta semana, o vencimento junho/20, que encerra nesta terça-feira fechou a semana cotado à R$ 217,70/@, em um alta de 1,56% frente a cotação da sexta-feira da semana passada.
O movimento interessante e que se destaca nos contratos para vencimento no 2ª semestre é a desvalorização. O contrato para outubro/20 encerrou a sexta-feira cotado à R$ 215,50/@, valor que está 1,31% abaixo das negociações médias do mercado físico atual. As possibilidades que justificam tal queda poderiam ser três: um aumento forte na oferta de animais, a desaceleração das compras chinesas e um mercado interno se deteriorando ainda mais.
No entanto, os fundamentos não apontam com “total certeza” para tais cenários, já que, historicamente as compras da China aceleram no 2º semestre (com uma média de volume embarcado 87% maior do que o 1º semestre, considerando os últimos 10 anos), o mercado interno brasileiro dá sinais de reabertura e recuperação (grandes metrópoles reabrindo comércios), e, em um visão de médio prazo (outubro – dezembro) esse sinal pode se mostrar mais intenso que o atual. E por fim, uma possível melhora na oferta de bovinos, que nós visualizamos que poderia vir apenas de um 2º giro de confinamento mais fortificado, no entanto, a oferta de bois magros não se mostra abundante a ponto de justificar um forte aumento no montante de bovinos aptos para abate.
Ou seja, o mercado futuro está se “segurando” em fatores que ainda não mostram tanta força a ponto de justificar desvalorizações do boi gordo, ainda assim, nós ressaltamos que estamos com uma dependência chinesa muito grande, e, caso os chineses resolvam aprontar alguma, indicando um possível embargo, a cotação do boi gordo não terá força para se sustentar nos R$ 220,00/@. Desta forma, proteção de preço pode ser o caminho para quem sabe seus custos e busca eliminar um risco grande como esta dependência.
1.1 O que o mercado futuro proporciona?
Apesar da volatilidade ainda estar acima da média histórica, a última semana trouxe mais participantes ao mercado futuro, o número de contratos em aberto (futuros + opções) no dia 26/05/2020 chegou a 55.900, alta de 19% frente a semana passada. A forte valorização dos contratos nas últimas semanas pode estar atraindo novos participantes.
No mercado de opções, as PUTs com strike de R$ 210,00/@ para julho/20 já se apresentam com preços acessíveis, uma boa opção para aquele que visualiza em tal preço uma margem de lucro aceitável. Como pontuado anteriormente, o mercado ainda apresenta seus riscos. Para outubro/20, as PUTs com strike de R$ 200,00/@ ainda se mostram um pouco mais elevadas, com prêmios acima de R$ 3,00/@.
A compra de uma PUT sintética segue no radar sendo a estratégia mais atraente, especialmente se realizada em ajuste com a venda de animais a termo, visto que pode melhorar o preço mínimo se comparada à PUT simples sem incorrer na incidência de ajustes até que o mercado bata o strike da CALL.
Os futuros de boi gordo se apresentam como uma opção plausível, no entanto, vale a ressalva de que é necessário ter o fluxo de caixa preparado para esse tipo de operação. A venda de uma pequena parte da produção através futuros de boi gordo à R$ 215,00/@ pode ser uma estratégia interessante para o vencimento outubro/20, buscando desta forma, cobrir parte dos custos de bovinos que serão entregues neste período, cabe ressaltar que, apesar de reduzido, o risco mercadológico ainda existe, principalmente advindo da demanda.
Os frigoríficos diminuíram a atividade no mercado a termo nesta semana, com os produtores elevando os valores para fechamento de negócio futuro.
2. Enquanto isso, no atacado…
Semana marcada pela lentidão no mercado atacadista paulista de carne bovina, a desaceleração das vendas persistiu, até que a sexta-feira encerrou otimista com aquecimento das indicações. A ponta vendedora se fortaleceu, e pressionando através de estoques enxutos, recebeu reajustes positivos nos preços. Neste cenário, a carcaça casada bovina fechou a sexta-feira (26) cotada a R$ 14,10/kg – alta semanal de 2,17%.
Para o frango resfriado o ambiente é de firmeza e recuperação, com a cotação marcando alta semanal de 2,11%, com as cotações registradas em R$ 4,59/kg, retornando aos patamares do final de janeiro. Na comparação mensal a alta é de 27,50%. O frango vivo também passou por valorizações após as altas observadas no atacado.
As vendas de carne suína se mantêm otimistas, com os preços estáveis em relação à semana anterior, a carcaça especial suína encerrou a semana em R$ 7,20/kg. Além do mercado interno firme, as negociações no exterior continuam em ascensão. A recuperação dessas proteínas animais dão sustentação para um fortalecimento ainda maior do boi gordo.
Após o registro de sobras, as cotações dos ovos perderam força e fecharam a semana em R$ 93,00 cx c/30 dúzias. O ambiente se mantém nebuloso, mas as expectativas giram em torno de uma recuperação da demanda nas próximas semanas, dada a chegada dos salários e uma possível retomada das atividades de bares e restaurantes em São Paulo.
3. No mercado externo
A China continental aumentou em 38% seu volume importado em maio/20, o que elevou sua participação em 2 p.p. na comparação com abril/20, chegando a representar 54% dos embarques brasileiros de proteína bovina.
Após dois meses perdendo “espaço” nos envios brasileiros, Hong Kong voltou a importar mais de 20 mil toneladas de carne bovina, aumentando sua representatividade para 15% no último registro.
Fechando o top 3 de maiores compradores da carne bovina brasileira, o Egito aumentou em 47% o seu volume de compras em maio/20, somando 10,93 mil toneladas embarcadas.
Além destes, dentre os maiores compradores no mês de maio, destaca-se a presença da Argentina, que dobrou a quantidade importada do Brasil, mas segue em último lugar entre os top 10 pagadores dentre os clientes internacionais brasileiros.
Vale ressaltar que, mesmo pagando mais barato, o preço final em reais pago pela Argentina na proteína bovina brasileira é 27% maior que o praticado no mercado atacadista paulista.
Mesmo comprando mais no último mês, a China pagou mais pela carne bovina brasileiro, o preço médio em dólares ficou em US$ 4.900/t, 3% mais caro que o registrado em abril/20.
Como o dólar avançou quase 6% no último mês, o valor médio gerado com as vendas para os chineses ficou em R$ 27,47/kg. Se comparado ao preço da carcaça casada no atacado paulista, a diferença ficou em 107% no mês de maio/20, a maior dos últimos sete meses.
No acumulado de 2020, a conta já aponta para uma diferença de 86% entre o preço do mercado interno e o do mercado chinês, ainda assim, há em curso pedidos de renegociação de mercadoria, o que poderá refletir negativamente no preço médio da tonelada exportada em jun/20, reforçado pela queda do dólar.
4. A compra do pecuarista
O indicador que havia dado sossego nas últimas três semanas, voltou a assombrar aqueles que ainda não realizaram a compra de milho, farelo de soja e demais insumos que são atrelados a ele. O dólar fechou a sexta-feira à R$ 5,49, a maior cotação dos últimos 35 dias, puxado pelo ambiente externo temoroso com a COVID-19 e também pelas preocupações com o ambiente fiscal brasileiro, no entanto, a volatilidade é certa na moeda brasileira e irá continuar afetando o mercado.
Com essa forte alta da divisa norte-americana, o milho que estava em uma trajetória descendente devido ao avanço da colheita no país, recusou-se a se desvalorizar mais, e na sexta-feira embarcou em uma alta que puxou a cotação do cereal para cima dos R$ 48,00/sc em Campinas. Esta força da cotação do milho deve começar a se dissipar conforme a colheita ganhe cada vez mais corpo no país, no Mato Grosso, segundo o Imea, a colheita já rompe os 30% e deve chegar próximo dos 50% ao fim desta semana. Ou seja, existe espaço para uma desvalorização do milho, no entanto, a valorização do dólar deve dificultar essa queda.
O caso do farelo de soja é parecido, já que as indústrias esmagadoras estão repassando os aumentos que o grão tem registrado nos últimos dias, sustentados pela valorização do dólar. Cabe ressaltar que o farelo de soja ainda sofre pela oferta reduzida de grão, que é causada por uma demanda externa muito aquecida, ou seja, não há espaço para grandes reduções no preço do farelo durante este ano de 2020.
Esse cenário brasileiro é completamente diferente do que norte-americano, a cotação do milho e do farelo de soja nos EUA tem derrapado nos últimos dias, com uma previsão de safra cheia e demanda em recuperação mais lenta do que fora previsto. No radar, está o relatório do USDA que sairá na terça-feira com dados sobre área de grãos nos EUA, o mercado espera uma redução na área de milho e aumento na de soja, tendências diferentes destas podem surpreender o mercado.
Fonte: Broadcast AE / B3 / Agrifatto
5. O destaque da semana:
Após o ressurgimento de uma nova onda de coronavírus na China, o governo do país resolveu aumentar as restrições à importação de alimentos, exigindo que os importadores dessem garantia sobre o produto estar livre do vírus.
Os termos são válidos para exportadores de carne, lácteos e outros alimentos, que devem documentar que os produtos não foram contaminados, estão em conformidade com as leis da China e as diretrizes internacionais de segurança alimentar durante a pandemia de coronavírus.
As novas exigências se deram após vestígios do vírus serem encontrados em uma tábua de corte, que pertencia a um comerciante de salmão provindo do exterior. Neste cenário, a China já suspendeu os envios de uma planta de suínos da Alemanha e de aves nos EUA.
Vale ressaltar que ainda não há comprovação científica sobre a contaminação do covid-19 via alimentos. E que ainda há grande resistência dos EUA em dar essa “certificação” para a China, argumentando justamente a falta de qualquer indicativo cientifico de que a contaminação por alimentos seja possível. No Brasil, os grandes grupos já se prontificaram em assinar as declarações de que suas proteínas são livres de coronavírus.
6. E o que está no radar?