Yago Travagini é economista e consultor de mercado pela Agrifatto
Caroline Matos é zootecnista e trainee pela Agrifatto
 
Resumo da semana:

 

O mercado de boi gordo continua com os preços em ascensão, com as indicações da arroba nas principais praças do país aquecidas. Apesar da demanda doméstica esfriando, dado ao período sazonal de menor procura por carne bovina – pelo menor poder aquisitivo da população na segunda quinzena do mês –, as cotações continuam firmes. O preço médio pouco se alterou, mas negociações, ainda que tímidas, em R$ 217,00/@ para “boi china” começam aparecem. O Indicador Cepea/Esalq encerrou a semana em R$ 210,40, com a média semanal em R$ 209,54/@.
Em contrapartida, o atacado de carne com ossos caminha em passos lentos. Apesar da baixa disponibilidade, acarretando em estoques enxutos, o volume negociado é fraco. Dado o cenário, a indústria começa a traçar a estratégia de desossar os produtos.
O dólar retomou a escalada de alta, subindo 5,40% na última semana, relacionado aos ruídos da política interna e o aumento dos casos de coronavírus na China e Estados Unidos. A moeda norte-americana encerrou a sexta-feira (19/06) em R$ 5,32, e ainda com a baixa 0,98% ante a véspera, já acumula um aumento de 32,50% no ano. A volatilidade da moeda continua segurando os preços da soja, que fechou a semana em US$ 113,00/sc.
Com relação a economia interna, o Comitê de Política Monetária (Copom), do Banco Central, cortou novamente em 0,75 p.p. a taxa de juros básicos, saindo de 3,00% para os inéditos 2,25% ao ano. O novo corte da Selic era mais do esperado, colocando os juros reais do Brasil em 0,40% a.a., sendo mais baixos que países como Suíça e Canadá. Na esteira, o Plano Safra 2020/2021 também cortou os juros agrícolas, mas ainda comedidos quando comparados ao corte da Selic.
1. Na tela da B3

 

A pressão do mercado físico continua a refletir nas cotações dos contratos futuros na B3, o vencimento para julho/20 avançou 2% nesta semana, ficando cotado à R$ 214,50/@ na sexta-feira. É o maior valor registrado para tal vencimento e também o maior do contrato corrente do BGI.
O mercado continua a desconsiderar qualquer possível ágio que o vencimento outubro/20 possa a ter sobre o vencimento atual (junho), desta forma, o “poder” sazonal da entressafra é basicamente desconsiderado. A cotação do BGIV20 bateu os R$ 213,75/@, valorizando 2,57% na semana.

 

1.1 A batalha no boi da B3
 
Na última semana, destacamos uma “briga” boa que estava acontecendo entre as Pessoas Jurídicas Não Financeiras e as Pessoas Físicas. Em um movimento na qual uma estava se posicionando cada vez mais vendida (PJs Não Financeiras) e a outra se posicionando cada vez mais comprada (PFs).
Resolvemos analisar essa “briga” desde o início de março/20, quando a pandemia do coronavírus começou a afetar seriamente o mundo, trazendo consigo volatilidade e incertezas ao mercado mundial, e não foi diferente no mercado de boi gordo na B3.
O gráfico acima demonstra o posicionamento destes dois players nos últimos meses, em um período no qual o contrato corrente do boi gordo iniciou uma perna de baixa que durou até 12/03/2020, mas que deste então vem se recuperando, batendo a máxima de R$ 214,50/@ na última semana. As PJ não financeiras (frigoríficos), que vinham se posicionando cada vez mais compradas até o dia 14/05/2020, começaram a desfazer sua posição deste esta data, possivelmente buscando se beneficiar de uma possível desvalorização, no entanto, com o contrato corrente variando mais de R$ 20,00/@ desde então, os desembolsos tem sido elevados, algo em torno de R$ 19 milhões, e que, basicamente zerou os ganhos que eles tiveram desde o início do março/20.
Por outro lado, as Pessoas Físicas, aumentaram vertiginosamente suas posições compradas, e somente em junho/20, já embolsam valores que passam dos R$ 26 milhões. Ou seja, nas últimas semanas, as Pessoas Físicas tem desempenhado um papel impressionante no contrato de boi gordo na B3.
Fonte: B3; Agrifatto;

 

1.2 O que o mercado futuro proporciona?

 

Sem grandes alterações nos níveis de volatilidade vistos anteriormente, mas com as cotações evoluindo em todos os contratos, os travamentos de preços já podem garantir uma margem operacional satisfatória.
No mercado de opções, as PUTs com strike acima de R$ 200,00/@ para os vencimentos mais curtos já são realidade a um custo relativamente baixo (menos de R$ 1,50/@). Nos vencimentos mais longos, como outubro/20, há fechamento de PUTs que já cobrem a cotação de R$ 200,00/@ a preços mais realistas (R$ 3,50-4,00/@).
A compra de uma PUT sintética segue no radar sendo a estratégia mais atraente, especialmente se realizada em ajuste com a venda de animais a termo, visto que pode melhorar o preço mínimo se comparada à PUT simples sem incorrer na incidência de ajustes até que o mercado bata o strike da CALL.
Os futuros de boi gordo se apresentam como uma opção plausível, no entanto, vale a ressalva de que é necessário ter o fluxo de caixa preparado para esse tipo de operação. A venda de futuros de boi gordo pode ser uma estratégia interessante para o vencimento outubro/20, com o IFR rompendo os 70. Com a melhora da demanda se solidificando em apenas um comprador externo forte, o risco mercadológico é grande, desta forma, a operação vendida pode ser justificada.
Os frigoríficos continuaram ativos no mercado a termo nesta semana.
2. Enquanto isso, no atacado…

 

O mercado atacadista de carne bovina foi caracterizado pelo arrefecimento das vendas na última semana, nem a quinta-feira – dia tipicamente de maior movimento -, foi capaz de dar fôlego para as indicações. O volume de negociações foi baixo, mas, em compensação, os estoques enxutos seguraram os preços que permaneceram firmes. A carcaça casada bovina encerrou as indicações em R$ 13,80/@.
As próximas semana não indicam melhoram, visto que a segunda quinzena do mês não é “amigável” para a venda de carne bovina, dado ao menor poder aquisitivo da população. As expectativas giram em torno de uma possível estabilização dos preços nos patamares atuais.
Enquanto a carne bovina anda a passos lentos, o frango resfriado manteve sua trajetória de recuperação dos preços, encerrando a sexta-feira em R$ 4,50/kg, com uma alta semanal de 9,10%. Foi a maior cotação registrada desde o dia 22/01, quando foi cotado a R$ 4,60/kg. A melhora nas indicações pode estar atrelada a menor produção.
Para a carcaça especial suína, o cenário também se mantém otimista, com os preços fechando a semana em R$ 7,18/kg, acumulando alta de 2,50% na semana, retornando aos mesmos patamares do mês anterior. A oferta é controlada e suficiente para atender a demanda existente, o que tem dado sustentação aos preços.
O mercado de ovos continua estável, com as cotações balizas em R$ 105,00/cx com 30 dúzias. Entretanto, o cenário ainda é nebuloso, com a chegada da segunda quinzena, ainda existe a possibilidade de uma melhora na demanda, visto que há uma migração maior para a proteína neste período.

 

3. No mercado externo

 

Mais uma semana de fortalecimento nos embarques de carne bovina brasileira, a média diária avançou 7% na comparação com a semana anterior, atingindo um total de 7,66 mil toneladas embarcadas por dia. A receita gerada com esses embarques atingiu uma média de US$ 33 milhões por dia, com o total arrecadado já ultrapassando o valor registrado no mesmo período do ano passado, atingindo US$ 466,76 milhões.
Com os números avançando mais de 43% em receita e 27% em volume, a previsão é que tenhamos o maior volume e receita com a exportação de carne bovina em um mês de junho. Estimamos que o volume embarcado deva ficar entre 150 e 170 mil toneladas ao fim do mês de junho/20.
Mesmo com a colheita de milho se intensificando e superando a barreira dos 10% no Brasil, as exportações
continuam lentas, a média diária embarcada até a 3ª semana de junho caiu 34% em comparação a média até a 2ª semana, estabelecendo-se em 2,93 mil toneladas/dia. A diminuição frente os números de jun/19 são na ordem de 95%. E demonstram que a colheita mais atrasada desse ano tem afetado as exportações.
Em receita, a queda no comparativo semanal foi de 30%, com uma média diária de US$ 546,2 mil na 3ª semana do mês de junho. Até o momento foram gerados US$ 7,65 milhões com os envios de milho para fora do país, no mesmo período do ano passado, já haviam sido gerados US$ 152,26 milhões com o cereal.
Apesar da diminuição de oferta em comparação a maio/20, os embarques de soja seguem fortes no mês de junho/20, foram 669 mil toneladas embarcas por dia até a 3ª semana deste mês. São números 49% maiores que os registrados no mesmo período do ano passado. A expectativa é que mais de 13 milhões de toneladas
da oleaginosa sejam embarcadas neste mês.
A receita gerada com esses envios já supera os US$ 3 bilhões, e com uma média de US$ 224,53 milhões por dia a tendência é que a soja gere mais de US$ 4 bilhões somente no mês de junho/20 para a balança comercial brasileira. Ainda assim, os envios da oleaginosa devem se arrefecer ainda mais em julho/20.

 

 

4. A compra do pecuarista

 

Se o boi gordo caminhou com valorização na última semana, os principais insumos alimentares também mostraram força. O destaque principal foi da soja, que escalou 8,58% na semana, fechando a sexta-feira com o indicador Cepea atingindo os R$ 114,81/sc. A maior justificativa para esse desempenho foi o dólar, que no mesmo período avançou 4,85%. A pressão também atingiu o farelo de soja, que em Rio Verde/GO, rompeu novamente a barreira dos R$ 1.600/t, valorizando próximo de 5% na semana.
Já o milho, que vem sendo pressionado pela chegada da 2ª safra, conseguiu se solidificar nos R$ 47,00/sc em Campinas/SP, o dólar deu sustentação e argumentos aos vendedores de cereal que não estão entregando seu milho. Apesar do mercado parado, com poucos negócios realmente efetivados, os compradores que necessitam de entregas imediatas estão tendo que aumentar os indicativos de preço para realizar as compras. E, como o dólar deve continuar volátil e forte, uma pressão baixista deve ser sentida somente quando a oferta de fato aumentar, o que deve acontecer somente no início de julho/20.
Outra conta que ainda preocupa o pecuarista, apesar da recente valorização do boi gordo, é a reposição, já que o bezerro ainda não deu sinais de que achou o seu “pico” nas cotações. Para se ter uma ideia, desde de jan/18, o bezerro viu seu preço evolui 64%, enquanto que o boi gordo obteve uma alta de “somente” 41%. A preocupação na recomposição de estoque continua grande pelo fato de que o ágio do bezerro ainda ronda os 50%, valor bem acima da média histórica.
Nós, particularmente visualizamos, que os anos de 2020 e 2021 reservaram custos elevados para aqueles que ainda irão comprar insumos ou reposição. A demanda chinesa por grãos continuará forte à medida em que eles estão reformulando todo o modo de produção de proteína animal deles, e, além disso, o dólar elevado não favorece a compra do mercado interno. A conta da reposição dá sinais de queda/estabilização somente no segundo semestre de 2021, conforme as fêmeas seguradas em 2019 desmamarem seus bezerros, ganhando força em 2022. O cuidado maior para 2022 é com o custo do estoque desses animais, com uma maior oferta chegando ao mercado.
Fonte: Broadcast AE / B3 / Agrifatto

 

5. O destaque da semana:

 

A semana foi marcada pela valorização do boi gordo, a cotação do animal que já vinha esquentando começou a ferver, com o indicativo Cepea rompendo a casa dos R$ 212,00/@ na quinta-feira, dia 18/06/2020. O que impressiona o mercado é a valorização rápida e constante, já que há um mês atrás, as negociações ocorriam por volta dos R$ 200,00/@, e, em um horizonte de comparação de três meses, a diferença já está em R$ 20,00/@ para mais.
O mercado aos poucos vai deixando para trás o “pico” da safra e caminhando com forte variação positiva para o período de entressafra, e, esta ainda nem demonstrou sua real magnitude, já que em algumas regiões do país como Mato Grosso, Goiás, Pará e Rondônia ainda há animais provenientes de pastos que estão sendo entregues aos frigoríficos.
A pressão que fortalece as cotações vem de dois lados. Primeiro, a oferta restrita de animais, já que estamos passando pela fase do ciclo pecuário em que as fêmeas estão sendo fortemente retidas pela justificativa de que as cotações do bezerro estão atrativas (e de fato estão), com isso o abate de fêmeas em 2020 deve experimentar quedas de mais de 13% no comparativo com 2019. Desta forma, o mercado é pressionado pela falta de bovinos para serem abatidos, mesmo diante de uma crise econômica.
A segunda justificativa vem da China, os chineses continuam a demandar a carne bovina brasileira, a quebra produtiva com a PSA coloca e irá continuar colocando os chineses “contra a parede”, visto que foram mais de 20 milhões de toneladas de proteína animal que despareceram. Desta forma, os embarques brasileiros continuaram acelerados durante o mês de junho/20.
Ainda assim, a demanda interna combalida e a dependência de um só comprador trazem consigo um risco mercadológico muito grande, a saída unilateral chinesa das compras de proteína brasileira podem causar uma forte desvalorização do boi gordo no Brasil. O mercado futuro tem oferecido boas opções de mitigação de riscos, e diante de tal cenário instável, garantir preços se torna algo essencial.
 

 

6. E o que está no radar?

 

A arroba continua em ambiente firme, a oferta restrita continua como principal fator de sustentação da commodity. O cenário se mantém favorável, com os pecuaristas mantendo a boiada nos pastos enquanto a indústria sobe as indicações. Entretanto, a ponta compradora se segue cautelosa, comprando somente o necessário para evitar uma escalada ainda mais acentuada dos preços.
Para o ambiente interno as expectativas continuam em baixa, agravados pela segunda quinzena do mês. Vale ressaltar que aqueles frigoríficos que atendem somente o mercado doméstico, tendem a demonstrar uma maior dificuldade em adquirir matéria-prima, visto que não conseguem acompanhar os preços ofertados pelas indústrias habilitadas a exportar.
Além disso, as vendas para o exterior continuam fluindo. Os nossos principais clientes, os chineses, continuam marcando presente e enxugando parte da oferta. E, até o momento, negociações estão fora do radar.
O que deve continuar no curto prazo, visto que os estoques de proteína animal do país continuam em baixa, e podem se agravar após as novas normas impostas pela China para evitar possíveis contaminações por Covid-19. Uma empresa alemã, que fornecia carne suína para o gigante asiático, já foi suspensa. Neste ambiente, o controle e cuidado das plantas frigoríficas brasileiras devem se dobrar com as novas exigências.