Jéssica Huescar é médica veterinária e trainee pela Agrifatto
Stefan Podsclan é engenheiro agrícola e consultor de mercado pela Agrifatto
Yago Travagini é economista e consultor de mercado pela Agrifatto

 

Resumo da semana:
Semana estável no mercado físico do boi gordo, os valores da arroba se mantiveram próximos a R$ 310,00 nesses últimos dias, com premiações a depender da padronização e qualidade do lote. Os frigoríficos de São Paulo não encontram dificuldades na compra dos bovinos, a média da escala de abates está na casa dos 10 dias, 30% a mais do que a média nacional. Com a safra do boi chegando próxima ao clímax era esperado uma queda mais intensa dos preços, o que não parece ser a plena realidade.
Em um processo de readequação após sofrer fortes altas durante o mês de abril, as cotações dos elos da suinocultura continuaram a registrar quedas. Mesmo com as exportações de carne suína in natura e processada rompendo recordes nos últimos meses, o preço do suíno vivo em São Paulo recuou 11,68% na última semana, recuando para o patamar de R$ 6,96/kg. Enquanto isso, a carcaça suína especial desvalorizou 8,41% no mesmo período, voltando ao patamar dos R$ 10,50/kg. O mercado de proteína suína ainda busca uma padronização para seus preços, visto que os resquícios da pandemia continuam a ser sentidos.
O milho continua escasso no mercado, a falta de chuva em parte das regiões produtoras do país deixa cada vez mais real as expectativas de queda de produção do cereal de 2ª safra no Brasil. Em Campinas a saca fechou a semana sendo negociada a R$ 101,34/sc, recuando 0,22% no comparativo semanal, no entanto, o destaque veio das cotações internacionais. Após uma forte valorização com a divulgação do relatório de oferta e demanda do USDA, os preços do milho em Chicago recuaram fortemente nos últimos dias da semana passada, caindo 11,80% no vencimento para julho/21, ficando cotado a US$ 6,45/bu.
Por fim, abordamos o etanol hidratado que engatou a segunda valorização consecutiva semanal, chegando ao maior patamar nominal da série histórica do Cepea em São Paulo, cotado a R$ 3,05/l. A escassez de chuvas também tem prejudicado a produção de cana-de-açúcar e com a perspectiva de menor volume produzido, os preços já começam a sofrer reajustes para cima. A expectativa de regularização pelo mercado é somente a partir do mês de julho.

 

1. Na tela da B3
Após duas semanas de indecisão e calmaria, o boi gordo resolveu reagir na B3 nos últimos dias da semana passada. Com o vencimento para maio/21 chegando próximo ao seu encerramento, os operadores vão migrando para o outubro/21, e, desta forma, a referência de negociações passa a ser o contrato mais longínquo.
E mesmo com o preço do boi gordo no mercado físico estagnado na casa dos R$ 310,00/@, o contrato para outubro/21 rompeu sua antiga máxima e fechou a sexta-feira a R$ 336,00/@, valorizando 2,13% no comparativo semanal.
O que a B3 nos mostra neste momento é que há ainda uma grande indecisão por parte dos players nas posições que estão tomando. Apesar da recuperação da última semana, desde o fim de abril/21, as cotações futuras do boi gordo na B3 se mantêm no mesmo patamar, para qualquer contrato que se olha. A nossa visão é que o mercado ainda continua operando com um “olho no retrovisor”, sem estar realmente focado no que iremos vivenciar nos próximos meses.
O valor de R$ 336,00/@ para outubro/21 corresponde a um ágio de 8% frente a média real de preços observados até agora no mês de maio/21, acima da média dos últimos 16 anos. Ainda que esteja abaixo do observado nos melhores anos e de 2020, em um cenário de mercado interno sufocado, a garantia deste ágio pode ser interessante. Vale a ressalva de que ainda enfrentaremos altos índices de inflação nos próximos meses, e, para garantir ganhos, a arroba terá que acompanhar esses aumentos da inflação, no entanto, teremos fôlego para isso?
*Considerou-se o preço de R$ 336,00/@ como preço em outubro/21;
Fonte: Agrifatto;

 

1.1 O que o mercado futuro proporciona?
Já estamos nos encaminhando para enfrentar a segunda quinzena do mês de maio/21, a tão esperada oferta de pasto que estaria chegando ao mercado e estremecendo os preços do boi gordo parece não ter tido o efeito que os frigoríficos aguardavam. A cotação no físico bambeou mas não consegue “furar” a barreira dos R$ 300,00/@ em São Paulo.
Com isso, o pensamento agora seria só “surfar” na crista da onda da oferta cada vez mais fraca, afinal, estamos ultrapassando a safra e estamos entrando na entressafra. No entanto, não acreditamos que a história é por aí. A pecuária que concentrava o seu abate de descarte ou de alivio de pastagens nos meses de março, abril e maio está ficando cada vez mais para trás, e os números de animais abatidos no país comprovam isso. A intensificação das pastagens em conjunto com a suplementação (via ração) está dando a opção para o pecuarista de entregar seus animais em um prazo cada vez mais alongado.
Fonte: Agrifatto;
Os meses de julho e agosto figuraram oito vezes entre os TOP 3 meses com maior volume abatido dos últimos dez anos, o que corresponde a uma recorrência de 80%. Desta forma, solidificamos nossa preocupação de que ainda não veremos um vácuo de oferta para os próximos três meses que será suficiente para alavancar a arroba do boi gordo a um novo patamar.
E com isso, as estratégias de proteção continuam em linha com as que vínhamos relatando nas últimas semanas. Para aqueles mais conservadores, a compra de opções de venda continua a ser a operação mais interessante, garantindo assim um preço mínimo para os próximos três meses. Ou seja, a compra de PUTs secas com valores protegendo os R$ 305,00/@ para junho/21 e julho/21, pode ser interessante, se livrando do risco pequeno que o boi gordo tem de recuar abaixo deste valor no curto prazo. Esta operação teria um custo médio de R$ 4,39/@, cerca de 1,44% do valor protegido.
Outra opção para um perfil mais intermediário é a compra de PUTs Spreads, visando dispender um valor menor e ainda assim estar protegido dentro de uma “banda” de preços. Com o custo de R$ 2,31/@ é possível se proteger da queda dos R$ 305,00/@ até os R$ 295,00/@ ao se adquirir uma PUT Spread com esses strikes no junho/21 e julho/21.
Tanto para as PUTs secas quanto as PUTs Spreads o ideal é travar algo em torno de 50% da perspectiva de abate para esses meses, pois o mercado pode oferecer boas oportunidades ainda no futuro.
Operar futuros continua a ser a opção mais arrojada neste momento. Acreditamos que o momento de vender futuros está na tela, principalmente para o julho/21, que se põe novamente acima dos R$ 320,00/@. Buscando a redução de risco de operar somente vendido, e observando a possibilidade ainda de valorização do ativo no longo prazo, o ideal é combinar a venda do julho/21 com a compra de futuros de boi gordo no outubro/21, com um valor abaixo dos R$ 333,00/@.

 

2. Enquanto isso, no atacado…
Com dificuldade em escoar a carne bovina, os varejistas e distribuidores continuaram a pressionar a carcaça bovina no atacado. Com isso, encerramos mais uma semana com desvalorização da proteína bovina no mercado atacadista, desta vez de 0,57%, estabelecendo a média semanal de R$ 19,56/kg, o menor valor desde a última semana de março/21. De forma geral, o mercado continua “tímido”, com procura discreta e sobras recorrentes, com isso, a tendência é de que novos reajustes venham a acontecer.
Olhando para o cenário das proteínas alternativas, a situação do frango resfriado se mostra um pouco diferente da carcaça bovina. O preço passou por uma valorização de aproximadamente 2,56% no comparativo semanal, fechando a semana cotado em média a R$ 6,69/kg, mostrando uma maior procura por este produto, assim como seu derivado, o ovo, que segue com preço na casa dos R$ 125,30/cx.   Já a carcaça suína, sofreu uma desvalorização média de -7,27%, fechando o preço médio em R$ 10,53/kg.
O que o atacado nos mostra essa semana é a perda de poder de compra dos consumidores, forçando a procura por proteínas mais acessíveis para suprir sua necessidade. Como já havíamos observado em outros momentos de 2020, o grande entrave para a valorização do boi gordo continua sendo o mercado interno e seu desempenho sofrível.

 

3. No mercado externo
 
A exportação de carne bovina in natura fechou a segunda semana do mês de maio/21 com recuos, foram enviadas 25,43 mil toneladas para fora do país na última semana, 14,70% a menos em comparação ao mesmo período da semana retrasada. Desta forma, a média diária até o momento ficou em 5,52 mil toneladas, 28,71% a menos do que em maio/20.
Com um recuo de 0,23% no preço da carne bovina exportada, a receita obtida com as vendas externas recuou de maneira mais intensa. Foram arrecadados US$ 124,06 milhões no acumulado da segunda semana do mês, levando a média diária para US$ 27,02 milhões, 7,56% menor no comparativo semanal.
Os embarques de soja registraram ligeira redução de ritmo durante a 2ª semana do mês de maio/21, com uma performance média 880 mil toneladas embarcadas diariamente, queda de 6% sobre a semana anterior mas ainda 25% superior ao maio/20. Com isso o volume total embarcado no mês até o momento é de 8,80 milhões de toneladas e corresponde a 62% das 14,1 milhões de toneladas embarcadas em no mesmo período do ano passado.
Com o preço da tonelada de soja embarcada em US$ 444/ton, a soja brasileira mais cara pode estar afetando o interesse dos compradores desacelerando o ritmo de embarque, uma vez que em maio/20 o preço era de US$ 333/ton, ou seja, 33% inferior ao preço atual. A receita obtida nas duas primeiras semanas de maio/21 é de US$ 3,91 bilhões e equivale a 83% da receita total obtida em maio/20.
Se a soja está cara, o milho está mais ainda diante da competição com mercado interno, devido a baixa disponibilidade. Menos de 1,2 mil toneladas do cereal brasileiro foram exportadas durante todo mês de maio/21 contra quase 25 mil toneladas em maio/20. O preço da tonelada embarcada chama a atenção, em maio/21 a tonelada exportada é negociada à US$ 478/t contra US$ 267/t em maio/20, diferença de 78%.
Buscando equilibrar o abastecimento no mercado, as importações do cereal estão ganhando destaque. Em maio/21 34,9 mil toneladas de milho entraram no país, esse volume é 394% superior às 8,8 mil toneladas importadas durante todo o mês de maio/20. Com os preços internacionais mais altos e dólar mais valorizado sobre o real, o preço atual da tonelada importada em US$ 213/t é 42% superior a maio/20, quando era de US$ 189/t.

 

4. A compra do pecuarista
Após o relatório do USDA projetar uma safra de 380 milhões de toneladas de milho nos EUA indicando um cenário de recuperação da oferta e dos estoques mundiais, os preços em Chicago de cereal registraram forte correção nos últimos dois dias da semana.
Essas desvalorizações de CBOT foram refletidas nas cotações do cereal na B3 que recuaram me média R$ 5,00/sc em cada contrato futuro. Na sexta-feira os contratos julho/21, setembro/21 e novembro/21 encerraram o pregão R$ 96,25/sc, R$ 94,44/sc e R$ 94,40/sc, respectivamente, o menor nível dos últimos 30 dias.
Embora esses preços não reflitam a realidade do mercado interno, eles trazem boas oportunidades para o pecuarista utilizar das estratégias do mercado financeiro com a finalidade de proteger seu custo de produção para aquisição do cereal. É o momento de aproveitar a oportunidade da melhora na relação de troca boi/milho.
A tendência é que os preços de cereal se mantenham em alta no mercado físico, e no mercado futuro devem retornar aos patamares anteriores diante dos problemas com o milho 2ª safra impactando na oferta de milho no mercado interno.
Fonte: Agrifatto;

 

5. O destaque da semana
 
E mais uma semana os dados divulgados pelas entidades governamentais vão confirmando as previsões divulgadas nos relatórios da Agrifatto. Desta vez, o IBGE divulgou a prévia da pesquisa trimestral do abate de animais no 1º trimestre de 2021 na última semana e trouxe consigo os números alarmantes para a produção pecuária brasileira.
Segundo o instituto, foram 6,54 milhões de bovinos abatidos no 1º trimestre deste ano, 10,53% a menos do que no mesmo período de 2020 e o pior resultado dos últimos 12 anos. Confirmando assim, que a pecuária brasileira passa por um dos períodos de maior retenção de fêmeas da última década, afinal, ainda que os números estratificados não tenham sido divulgados, a estimativa é de que a maior parte deste recuo de abate tenha vindo das fêmeas.
Fonte: IBGE; Agrifatto;
Do ponto de vista da oferta de proteína bovina, a situação só não é pior pois o pecuarista continua a intensificar sua produção, abatendo os seus animais com um peso cada vez maior. Com isso, a queda no total produzido de carne bovina no país foi de “apenas” 6,82%, estabelecendo-se em 1,72 milhão de toneladas e um peso médio de carcaça de 17,52 @/cabeça, 3,90% superior ao mesmo período do ano passado.
Fonte: IBGE; Agrifatto;
Esses números fazem crescer a expectativa e a preocupação com o tamanho do rebanho de bezerros que irá chegar nos pastos brasileiros nos próximos anos. A atividade da cria nunca esteve em um momento tão bom, a margem do criador está em níveis recordes, mas o mercado já demonstra alguns nuances de saturação.
Após se valorizar por três meses consecutivos, o preço do bezerro começa a demonstrar uma maior fraqueza e deve fechar maio/21 em queda no comparativo mensal. A queda do boi gordo e a falta de perspectiva de uma forte valorização para os próximos meses tem deixado os recriadores e confinadores reticentes em realizar novas compras de animais, travando as negociações de reposição. Sem um boi gordo valorizado, não haverá compra de um bezerro “caro”.
Fonte: Agrifatto;
Diante disto, chegamos à conclusão que os números e a história da pecuária apontam para um só lado. Estamos vivendo o ápice da retenção de fêmeas no Brasil. No entanto, como dissemos na semana passada, o ciclo é soberano e os números apontam para um só caminho, um “mar” de bezerros vem por aí. Não sabemos precisar o exato mês que eles irão chegar, mas se prepare, o radar aponta para algo entre os próximos 12 e 24 meses.
 
6. E o que está no radar?
O radar de curto prazo continua a apontar para uma estabilidade de preços do boi gordo. Apesar das pressões baixistas de algumas unidades frigoríficas, a dificuldade em originar gado apto para o abate no país continua elevada e com isso os preços operam em relativa estabilidade em São Paulo, na casa dos R$ 310,00/@.
O grande entrave continua a ser a demanda interna. A população brasileira continua a rechaçar novos aumentos da carne bovina. Com isso, os cortes da proteína apresentam grande dificuldade em sair das gôndolas do supermercado. Com o estoque cheio, os varejistas continuam a reduzir o preço pago pela carcaça bovina no mercado atacadista, chegando ao patamar de R$ 18,90/kg, o menor valor dos últimos dois meses.
E com a chegada da segunda quinzena do mês, período em que a demanda tende a se reduzir ainda mais, o cenário que se desenha para os próximos dias é de estabilidade no mercado físico. O mercado apresenta-se travado nas duas pontas, a falta de animais não permite a queda do boi gordo enquanto que a demanda interna fraca dificulta a valorização do animal.