Yago Travagini é economista e consultor de mercado pela Agrifatto
Caroline Matos é zootecnista e trainee pela Agrifatto

 

Resumo da semana:

 

As últimas semanas de dezembro/20 trouxeram positividade para o mercado do boi gordo brasileiro, isso por que a sequência de cinco semanas consecutivas de desvalorizações foi interrompida, e a cotação do animal na última semana fechou em média a R$ 269,98/@, o maior valor desde a primeira semana de dezembro/20. Durante os últimos dias, poucos negócios foram fechados, com poucos pecuaristas negociando animais e uma demanda efervescente vindo do consumidor final, os frigoríficos tiveram que negociar animais acima da referência, e, desta forma, o preço do boi gordo vem em alta nas últimas duas semanas.
O milho seguiu caminho parecido, acelerando sua valorização e rompendo a casa dos R$ 78,00/sc na última semana. A junção de valorização do dólar, demanda chinesa e consequentemente alta dos preços em Chicago. Nos EUA, o contrato para março/21 obteve uma valorização que superou os 8%, chegando a ser cotado a US$ 4,86/bu, o maior valor desde julho/19. Com tamanha pressão se formando sobre o preço do cereal no ambiente externo, as cotações internas devem continuar se elevando nas próximas semanas.
O ano de 2020 finalizou com bons indicativos para a soja brasileira, isso por que mesmo com a eminente chegada da nova safra nas próximas semanas, o preço da oleaginosa deve sofrer pouquíssima desvalorização frente as cotações atuais. A referência em Paranaguá/PR que continua acima dos R$ 150,00/sc, deve sofrer com desvalorização a medida em que a soja começar a ser colhida e entregue nas tradings do país, no entanto, com o apetite chinês “engolindo” praticamente qualquer oleaginosa no mundo, esse processo de queda deve ser menos intenso do que o normal.
Além das commodities, o mercado atacadista de proteínas animais finalizou o ano com uma forte recuperação. A demanda dos consumidores na ponta final, pressionou o varejo que foi as pressas recorrer a um maior volume de proteínas animais. A carcaça casada do boi gordo voltou a romper os R$ 18,00/kg e a carcaça suína especial valorizou-se 7,26%. Apesar desta forte valorização, a chegada do mês de janeiro/21 pode começar a travar a comercialização dessas proteínas animais.

 

1. Na tela da B3

 

A movimentação de alta continuou a ocorrer para o boi gordo na B3 nas últimas semanas, o contrato mais negociado (janeiro/21) encerrou a última semana cotado à R$ 275,00/@, valorizando-se 2,12% frente a cotação da semana passada. O otimismo com a demanda pujante de fim de ano e a escassez de animais pressionou as cotações no físico e reverberou sobre os contratos futuros.
Ainda assim, não há muito interesse dos participantes em adentrar o mercado. O volume de contratos futuros em aberto recuou 31,47% na última semana, com a finalização do contrato dezembro/20 e pouquíssima rolagem sendo realizada. Com isso, o total de contratos em aberto (futuros + opções) chegou a 41,75 mil, o menor de 2020.
Com essa inércia contínua, os participantes do mercado pouco alteraram suas posições, as PFs (Pessoas Físicas) e as PJs não financeiras continuam a sustentar uma posição comprada, no entanto, de maneira bem mais comedida do que a 50 dias atrás. Enquanto que as PJs financeiras sustentam uma posição vendida de 2,43 mil contratos, mantendo-se praticamente estável neste número a cinco semanas consecutivas.

 

 

1.1 O que o mercado futuro proporciona?

 

Com a redução contínua da liquidez dos futuros de boi gordo na B3, a volatilidade para a realização de negócios continua elevada.
Ainda assim, as PUTs continuaram no radar de quem necessita travar posições para o atual trimestre (janeiro, fevereiro e março/21)), com um custo médio de R$ 3,03/@ é possível comprar PUTs para tal período e que proteja o valor de R$ 260,00/@. Com isso as PUTs secas voltaram a se tornar mais atrativas.
Com a valorização do mercado, quem voltou ao radar também foram as PUTs sintética, especialmente se realizada em ajuste com a venda de animais a termo, visto que pode melhorar o preço mínimo se comparada à PUT simples sem incorrer na incidência de ajustes até que o mercado bata o strike da CALL.
Os futuros de boi gordo se apresentam como uma opção plausível, no entanto, vale a ressalva que a demanda financeira para este tipo de operação é elevada. Para aqueles que querem se proteger de um 2021 com grandes pendências a serem resolvidas, a venda de contratos futuros (algo em torno de 10 a 20% do total) de boi gordo na B3 para maio/21 no patamar atual de R$ 270,00/@ pode ser uma boa opção para a mitigação de riscos. A perspectiva de uma chegada maior de oferta a partir deste ano, pode começar a pesar sobre as cotações do animal.
No mercado a termo poucos negócios são vistos, no entanto, o apetite dos frigoríficos em fechar animais para os próximos meses aumentou nos últimos dias, a atenção do pecuarista deve ficar sobre o diferencial de base que o frigorífico irá trabalhar.

 

2. Enquanto isso, no atacado…

 

A última semana de 2020, como esperado, foi positiva para o mercado de proteína animal. A maior movimentação do varejo deu espaço para os avanços dos preços.
Para a carcaça casada bovina, o avanço foi de 10,26%, com as cotações na casa dos R$ 18,00/kg, algumas negociações em valores acima desse patamar já são registradas. Com isso, os preços começam a se aproximar dos vistos no final de novembro.
O frango resfriado encerrou a semana cotado a R$ 5,47/kg, alta semanal de 3,21%. Ainda assim, na comparação mensal houve uma queda de 10,54%.
A carcaça especial suína voltou a se aproximar da casa dos R$ 12,00/kg, sendo negociada a R$ 11,74/kg, o que representa uma alta de semanal de 7,26%. Assim como no frango, a alta ainda não foi suficiente para voltar a campo positivo ante o mesmo período do mês anterior, que demonstra queda de 6,86%.
A chegada de janeiro deve esfriar o mercado de carnes, principalmente pelo menor apetite do consumidor. Vale atenção a movimentação nos próximos dias.

 

3. No mercado externo 

 

Com mais de 1,22 milhão de toneladas enviadas para fora do país na terceira semana de novembro/20, as exportações de milho chegaram ao total de 3,49 milhões de toneladas nos 14 primeiros dias úteis de novembro/20. A média diária estabeleceu-se em 249,70 mil toneladas, 21,50% a mais do que fora registrado em novembro/19. Desta forma, a tendência é que o mês de novembro/20 seja o melhor da história para um mês de novembro em volume embarcado, com mais de 4,8 milhões de toneladas exportadas.
A evolução dos preços internacionais tem proporcionado uma melhora nos negócios para as empresas exportadoras. Isso por que o preço médio do milho exportado já subiu 7,29% no comparativo anual, chegando ao valor de US$ 182,2/t. Diante disso, a receita obtida com a venda de cereal brasileiro chegou aos US$ 636 milhões, com uma média diária de US$ 45,49 milhões, 30% a mais do que foi registrado em novembro/19.
Após duas semanas inicias frenéticas, os embarques de carne bovina brasileira apresentaram uma desaceleração forte na terceira semana de novembro/20. Foram 32,10 mil toneladas enviadas para fora do país na última semana, 29% a menos do que fora registrado na segunda semana de novembro/20. Com tal desempenho, a média diária embarcada do mês de novembro/20 reduziu 12% em relação a semana retrasada, se posicionando em 8,50 mil toneladas/dia. Ainda assim, se mantido esse desempenho até o fim do mês, romperíamos um recorde nos embarques diários de proteína bovina.
Com a manutenção do preço médio de venda na casa dos US$ 4,39 mil/t, a receita diária obtida também reduziu 12%, ficando em US$ 37,32 milhões/dia. Apesar do recuo, tal resultado ainda é 8% superior ao de outubro/20, quando a receita diária obtida rondava a casa dos US$ 34,52 milhões/dia.
Com um volume ínfimo de soja disponível, as exportações da oleaginosa continuam a recuar semana após semana. Desta vez, foram apenas 307,36 mil toneladas enviadas para o exterior durante toda a última semana, com isso, a média diária exportada de soja recuou para 88,75 mil toneladas, 14% menor que a média da semana anterior. A manutenção deste desempenho deve levar as exportações de soja a menos de 2,00 milhões de toneladas embarcadas em novembro/20, pior desempenho para um mês de novembro desde 2016.
A receita obtida com as vendas da oleaginosa atingiu os US$ 456,27 milhões no acumulado até a terceira semana de 2020, com os preços de exportações estabilizado próximo dos US$ 365/t, a receita média diária também recuou 14% no comparativo semanal, chegando a um valor de US$ 32,59 milhões/dia, 64% menor do que foi em novembro/19.

 

4. A compra do pecuarista

 

A aceleração do milho nas últimas semanas voltou a ligar o sinal de alerta do pecuarista para a relação de troca boi gordo/milho. Isso porque, o mês de dezembro/20 encerrou com o pior indicador desde março/20, sendo possível comprar apenas 3,53 sacas de milho com a venda de uma arroba de boi gordo.
Essa perda de poder de compra do pecuarista dá sinais que pode continuar durante quase todo o primeiro semestre de 2021, já que a cotação do milho na B3 ultrapassou os R$ 85,00/sc para março/21, impondo uma possível valorização de 13% no intervalo de dois meses, e, mesmo que o boi gordo bata os R$ 280,00/@ (contrato para fevereiro/21 chegando aos R$ 278,00/@), a relação de troca pode ficar abaixo das 3,30 sacas/@.
Diante disso, apesar da valorização em ambos, a escassez de milho é intensificada pelas compras externas que continuam a acontecer de maneira intensa, inclusive nos EUA. O preço do milho norte-americano que foi um dos últimos a se recuperar após o “fundo do poço” criado pela pandemia (em comparação a outras commodities), agora evolui de maneira mais intensa, encostando nos US$ 5,00/bu. Com isso, a cotação do cereal no mercado brasileiro deve seguir firme e podendo buscar romper novas máximas nos próximos seis meses.

 

 

5. E o que está no radar para 2021?
O “boom” das commodities visto no ano de 2020, desta vez, não deixou de fora o boi gordo. Entre
janeiro e novembro deste ano, o preço do animal chegou a valorizar 47%, saindo do patamar de R$
193/@ e batendo na casa dos R$ 285/@. Essa alta observada aconteceu mesmo com um mercado interno
combalido, e só foi possível graças a escassez de oferta de bovinos aptos para o abate e pela China.
A primeira justificativa para a valorização do boi gordo, a escassez de oferta, está sendo causada
sobretudo pelo intenso abate de fêmeas durante os anos de 2017 e 2018. Esse processo de abate de
fêmeas nesses anos, está causando agora uma escassez de bezerros e também de boi gordo disponível
no mercado. Como o ciclo pecuário é soberano e de longo prazo, essa escassez de oferta deve perdurar
durante o próximo ano, principalmente sobre o boi gordo. Como o processo de retenção se iniciou em
meados de 2019, a reposição pode começar a sentir uma melhora de oferta, e consequente estagnação
dos preços em 2021.
Do outro lado da ponta, o consumidor brasileiro teve um ano difícil. A crise econômica causada
pela pandemia resultou em recuo de mais de 4% no PIB brasileiro, a população descapitalizada optou por
proteínas de menor valor agregado. No entanto, a pecuária brasileira não sentiu tanto esse recuo, isso por
que as exportações (principalmente para a China) ganharam uma importância muito grande. Foram 1,58
milhão de toneladas de proteína bovina enviadas para fora do país até novembro/20, sendo que a China
levou 0,78 milhão de toneladas (57% a mais do que em todo o 2019).
Diante desse apetite chinês, a participação das exportações no consumo total de carne bovina
brasileira bateu recorde, chegando a 28% do total. Para 2021, as perspectivas para as exportações de
proteína bovina do Brasil se mantêm otimistas, com a manutenção dos atuais níveis embarcados, visto
que a China ainda não se recuperou totalmente da Peste Suína Africana, e deve continuar necessitada de
importar proteínas animais.