Yago Travagini é economista e consultor de mercado pela Agrifatto
Caroline Matos é zootecnista e trainee pela Agrifatto
Resumo da semana:
Semana positiva para o mercado de boi gordo, as cotações da arroba se aproximam cada vez mais próximo aos R$ 280,00/@ nas praças paulistas, com a média no estado beirando os R$ 275,00. O indicador Cepea/Esalq encerrou o mês com mais um recorde, as cotações chegaram aos R$ 278,40/@ na última sexta-feira, representando um avanço de 8,45 p.p. conta o fechamento de setembro, alta de R$ 21,70 por arroba.
A dificuldade das indústrias em preencher as programações de abate continua ditando o ritmo e patamares das negociações em todo o Brasil. Além disso, o cenário que não deve sofrer grandes mudanças com a chegada dos animais do segundo giro de confinamento. A carne bovina no atacado também segue fortalecida, ocasionado pelos baixos estoques, a carcaça casada bovina encerrou o mês de outubro em R$ 17,80/kg, alta de aproximadamente 10% na comparação mensal.
Com a segunda onda de contaminação de covid-19 que começa a desenhar no mundo, a moeda norte-americana oscilou em campo positivo na última semana, porém, encerrou a sexta-feira com baixa de 0,49% na comparação diária, cotada a R$ 5,74. Apesar disso, durante o mês de outubro, o dólar acumulou alta de 2,13%.
A eleições presidenciais norte-americanas balança também as cotações das principais commodities agrícolas, criando um ambiente especulativo e instável. A soja brasileira, fechou o mês com leve queda, retornando a faixa dos R$ 164,00/sc nos portos.
1. Na tela da B3
O receio e a volatilidade que tomou conta do mercado na semana retrasada deram o tom dos negócios na B3 durante a última semana. O contrato para outubro/20, mais liquido da B3, se encerrou na sexta-feira com pouca migração e nenhum posicionamento realizado para outubro/21, o que nunca aconteceu no século XXI para tal contrato. Para se ter uma ideia, ao fim do contrato de outubro/19 já haviam 982 contratos em aberto com vencimento para outubro/20.
O vencimento mais negociado (novembro/20) conseguiu fechar a semana com alta de 2,28% frente a sexta-feira passada negociado à R$ 285,05/@, acompanhando a alta de 2,64% do mercado físico. Já o contrato para maio/21 obteve uma valorização mais tímida, de apenas 0,84%, fechando a semana cotado à R$ 268,75/@, demonstrando que o mercado está evitando tomar novas posições para 2021.
Com o encerramento do contrato para outubro/20, o número de futuros reduziu 21% no comparativo semanal, com pouco mais de 18,79 mil contratos em aberto. O posicionamento líquido (futuros + opções) dos participantes do mercado do boi gordo tem demonstrado uma constante que está cada vez mais força. Do lado comprador, as Pessoas Físicas na dianteira com o maior volume de contratos em aberto, mas agora com a companhia mais robusta das PJ não financeiras e dos investidores não residentes. E do lado vendedor, as PJs financeiras e os investidores institucionais. Inclusive, na última semana os IIs assumiram a maior posição vendida do ano, com pouco mais de 5,88 mil contratos vendidos (futuros + opções). A pergunta que fica é por que os grandes fundos, após quatro meses sem se posicionar, resolveram partir para a venda?
1.1 O que o mercado futuro proporciona?
Com uma grande volatilidade ainda presente no mercado e estabilidade nas cotações na B3, poucas alterações foram vistas para quem deixou para negociar na última semana.
A volatilidade elevada está dificultando o fechamento de opções, devido ao alto custo, no entanto, continuamos a pontuar que as PUTs para proteção de animais que serão entregues em dezembro/20 e janeiro/21 estão dentro de uma janela boa de preço, e, com um varejo que está cambaleando (destrinchamos no nosso destaque) ressaltamos nossa preocupação com a cotação do boi gordo a partir de janeiro/21. Desta forma, a compra de PUTs nos parece uma ótima opção para quem tem animais a serem entregues a partir de dezembro/20 – janeiro/21. Para uma janela mais longa de entrega (maio/21), ainda não vemos uma boa atratividade na compra de PUTs.
A opção que se mostra mais atrativa para quem quer se proteger nessa janela mais longa é a venda de futuros. A venda parcelada de futuros com vencimento para maio/21, buscando fazer média para cima, começando no atual patamar de R$ 270,00/@ pode ser um bom negócio para aqueles que já detêm uma margem de lucro satisfatória com a venda nesse patamar. No entanto, ressaltamos o cuidado com os ajustes diários que podem ocorrer devido ao grande intervalo de tempo até o fim do contrato.
O mercado a termo continua frio, com poucos negócios sendo realizados em todo o país.
2. Enquanto isso, no atacado…
A última semana de outubro foi marcada pela firmeza dos preços no mercado atacadista de carne bovina, a carcaça casada encerrou o mês cotada a R$ 17,80/kg, avanço de 2,89% na comparação semanal e 9,88% ante o mês o anterior. Além disso, cortes de primeiro, principalmente os da roda, estão em falta, o que pressionada positivamente os preços destes produtos.
Enquanto isso, produtos de segunda, como pontas e dianteiro, ainda sobram e tem dificuldade em escoar. Os preparativos para este mês, novembro, já iniciaram, o que pode trazer novidades quanto ao âmbito dos preços. A tendência segue de mercado firme, relacionado ao menor número de abates causado pela baixa disponibilidade de boiada pronta.
Já a carne de frango, perdeu força e os preços recuaram na última semana. A menor liquidez de negociações provocou ajustes negativos dos preços da proteína de aves. O frango resfriado encerrou a semana cotado a R$ 5,72/kg, baixa de 0,61% na comparação semanal e queda de 0,95% ante o mesmo período do ano passado.
Em contrapartida, as cotações da carcaça especial suína se aproximam dos R$ 18,00/kg, encerrando a sexta-feira em R$ 13,74/kg, alta de 4,69% quando comparado a semana anterior e avanço surpreendente de 20% ante o mesmo período de setembro/20.
No mercado de ovos, as cotações também sofreram redução pontual de 0,97%, com as indicações da bandeja com 30 dúzias em R$ 102,00. A demanda do produto começa a demonstrar melhora, o que pode aquecer as cotações neste início de mês.
3. No mercado externo
Com dois dias a menos que outubro/19, a exportação de carne bovina pelo Brasil em outubro/20 acabou tendo um resultado final levemente pior que o mesmo mês do ano passado. Foram 162,68 mil toneladas enviadas para fora do país no último mês, contra 170,55 mil toneladas em outubro/19, a redução de 5% pode até parecer relevante, no entanto, quando comparamos a média diária de proteína bovina exportada, vemos que o mês de outubro/20 deteve o melhor desempenho da história, com 8,13 mil toneladas/dia.
Como houve uma forte renegociação desde o início de 2020, o preço da carne bovina brasileira exportada caiu 5% no comparativo anual, fechando o mês de outubro/20 a US$ 4.244/t. Dessa forma, a média diária da receita com vendas externas de proteína bovina recuou 0,30%, ficando em US$ 34,52 milhões/dia. O total obtido com as exportações de carne bovina fechou o mês em US$ 690,51 milhões.
As exportações de milho brasileira fecharam o mês de outubro/20 com pouco mais de 5,15 milhões de toneladas embarcadas, volume 22% menor que o de setembro/20 e 14% abaixo no comparativo anual. Ainda assim, apesar da diminuição dos embarques, o total de cereal exportado pelo Brasil desde julho/20 já atingiu 22,01 milhões de toneladas. E, apesar de ser 14% a menos que no mesmo período do ano passado, é 75% maior que a média dos últimos dez anos.
A receita obtida com a venda de milho chegou aos US$ 861,30 milhões, 21% menor que no mês de setembro/20,
quando foram arrecadadas mais de US$ 1 bilhão com a exportação de cereal. O desempenho levemente melhor da receita veio graças a melhora do preço médio, que aumentou 1,48% no comparativo mensal, fechando outubro/20 cotado à US$ 167,00/t.
Com uma melhora de desempenho na última semana, as exportações de soja brasileira fecharam o mês de outubro/20 com um total de 2,49 milhões de toneladas enviadas para fora do país. Apesar de ser 51% menor que a exportação de outubro/19, o total exportado pelo país até agora já chega a 81,67 milhões de toneladas, o maior volume da história.
A receita com a venda de soja continua a ser o item da agropecuária que mais contribui positivamente para a balança comercial brasileira, foram US$ 913,54 milhões, 44% menor que em setembro/20. O preço por tonelada se manteve alinhado nos US$ 366/t, mesmo nível do mês passado.
4. A compra do pecuarista
Após 30 dias consecutivos de alta no indicador Cepea e de cinco semanas de valorização na B3, o preço do milho em São Paulo perdeu força. No mercado físico, o cereal atingiu a máxima de R$ 82,67/sc na quarta-feira (28/10/2020) e registrou duas quedas consecutivas nos últimos dias da semana. Na B3, as variações semanais que apontavam altas sempre maiores que 6% nas últimas cinco semanas deram lugar a um desempenho negativo de 0,67% no vencimento novembro/20, fechando a semana cotado à R$ 79,44/sc.
Uma mistura de ambiente externo depressivo, com a cotação do milho na CBOT recuando mais de 5% na última semana, e compradores do mercado interno retraídos devido a preocupação com a margem freou as altas do cereal no Brasil.
Ainda assim, poucos negócios foram fechados no atual ambiente, já que aqueles que detêm o milho não estão aceitando desvalorizações. O mercado paulista travou perto dos R$ 81,50/sc e deve permanecer firme até o final do ano, com uma possível boa janela de compras surgindo quando a safra de soja entrar em período pré-colheita.
Além do milho, visualizamos que o bezerro continua perder fôlego e visualizando o ágio do seu preço sobre o boi gordo atingir o menor nível desde fevereiro/20. Desde agosto/20 a velocidade de alta do boi gordo tem ultrapassado a do bezerro em São Paulo, e com isso, o ágio do bezerro sobre o boi gordo nas terras paulistas fechou o mês de outubro/20 a 42%, caindo mais de 3 p.p. no comparativo mensal.
Apesar da queda de desempenho nos últimos meses, o ágio ainda continua acima da média histórica (31%) e no maior nível para um mês de outubro dos últimos cinco anos. No entanto, ao se olhar o histórico dos últimos anos, a tendência é de uma redução desse ágio a níveis mais próximos a média histórica, e isso deve acontecer nos próximos anos através de uma desvalorização do bezerro maior que a do boi gordo em um horizonte de tempo mais curto. Desta forma, visualizamos que o ciclo pecuário deve proporcionar uma leve reversão a partir de 2021, deslocando o ágio do bezerro a níveis mais próximos ao da média histórica.
5. O destaque da semana
Chegamos ao fim de outubro/20 com o preço do boi gordo atingindo os R$ 275,00/@ em São Paulo, imprimindo uma forte valorização e abrindo o sorriso daqueles que estão realizando as entregas de seus bovinos de confinamentos neste período. O ritmo de evolução do boi gordo está impressionando desde novembro/19, e chamando a atenção para outros elos da cadeia pecuária.
Ao traçarmos uma curva de evolução dos preços dos elos da cadeia pecuária desde jan/19, observamos um desempenho descolado do boi gordo e da carcaça casada no atacado em comparação ao preço médio da carne bovina no varejo. O boi gordo tem avançado em um ritmo muito forte, e, desde jan/19 seu preço médio em São Paulo já subiu 73%. A carcaça casada no atacado também tem seguido um caminho parecido, valorizando mais de 64% no mesmo período. Quem tem ficado para trás e é o que mais preocupa os analistas e participantes do mercado é a carne bovina no varejo, que no desde janeiro/19 aumentou seu preço em apenas 36%.
São dois os principais motivos para que essa divergência entre os elos da cadeia pecuária continue a ocorrer. Por um lado, observamos a oferta de bovinos reduzindo mais de 10% no comparativo anual, dificultando o preenchimento de escalas por parte dos frigoríficos e consequentemente fazendo o preço médio pago pelo boi gordo aumentar, mas, por outro lado, vivemos uma crise econômica que fez o desemprego saltar ao maior nível desde 2012, com mais de 13,8 milhões de pessoas desempregadas, reduzindo o poder de compra da população e limitando o repasse de preços que o varejista consegue fazer ao consumidor final.
Há também o fato de que as exportações de carne bovina auxiliaram para que os preços do boi gordo continuassem firmes, isso por que o volume enviado para fora do país cresceu 6%, e com o dólar circulando acima dos R$ 5,20 na maior parte do ano, os frigoríficos aceitaram pagar mais pelos bovinos brasileiros.
No entanto, o “nó” que amarra essa evolução do boi gordo não é tão firme como aparenta ser. Não, não estamos dizendo que o preço vai cair amanhã ou nas próximas semanas, na nossa visão o mercado permanece firme em 2020. A visão é mais de médio prazo, uma crescente preocupação com o início do ano, em que, teremos que enfrentar o fim do auxílio emergencial, o encerramento do programa governamental que visa a manutenção de empregos (Lei 14.020), uma possível diminuição dos embarques à China (comum para essa época do ano) e uma leve melhora na oferta.
Tais pontos aumentam a preocupação sobre a velocidade de escoamento que o varejo brasileiro deve ter neste início de ano. E, caso esses estoques permaneçam elevados por um longo período de tempo, poderíamos ver reflexos sobre o boi gordo. Diante disto, destacamos que este é um cenário que ainda está se construindo, mas que de fato temos um varejo que está com margens achatadas e com uma grande “vontade” de reduzir os preços da matéria-prima (carcaça casada).
6. E o que está no radar?