Pecuaristas de Mato Grosso, maior produtor de gado do Brasil, querem vender boi apenas à vista ao frigorífico JBS, em um movimento de aversão a risco frente ao escândalo de corrupção envolvendo a cúpula da empresa que domina os abates bovinos no Estado, disse uma importante consultora do setor.

“O pessoal está avesso ao risco. Produtores não estão vendendo ao JBS, e o que vende está fazendo o máximo para vender à vista”, disse a diretora da Agriffato, Lygia Pimentel.

A JBS, segundo relato da Associação dos Criadores de Mato Grosso (Acrimat), informou aos pecuaristas do Estado recentemente que buscaria fazer negócios a prazo, um movimento que, por outro lado, tem sido evitado pelos produtores de gado, gerando uma lentidão dos negócios.

A entidade está aproveitando o escândalo e o que foi causado pela operação da Polícia Federal Carne Fraca para cobrar intervenção do governo para incentivo à concorrência no Mato Grosso. As demandas incluem isenção do ICMS para comercialização de gado para outros Estados. A Acrimat afirma que a isenção daria ao produtor mato-grossense oportunidade de vender seus animais à vista, “direito que vem sendo violado por imposição das indústrias frigoríficas”.

“Ouvi de cliente meu em Mato Grosso dizendo ‘a prazo não vendo'”, revelou Lygia à Reuters.

Uma alternativa oferecida pela JBS é pagar à vista, mas com um desconto de 5 por cento em relação ao valor de mercado, relatou a consultora.

“Descontando 5 por cento do valor, se o pecuarista fizer negócio à vista, é ruim para o setor, mas é o estouro de uma bolha…”, acrescentou ela.

Uma fonte da empresa nega que a empresa esteja realizando negócios à vista. A política de compras a prazo da JBS foi adotada há cerca de três semanas, antes da divulgação de uma conversa gravada entre o presidente do conselho de administração da JBS, Joesley Batista, e o presidente Michel Temer, disse a fonte, que pediu para ficar no anonimato.

Negócios de bovinos podem ser realizados à vista ou a prazo no mercado brasileiro, dependendo da relação comercial de comprador e vendedor.

Segundo dados da Acrimat, o JBS, maior empresa de carnes do mundo, é responsável por 48 por cento dos abates de bovinos no Estado, e em algumas regiões como o Araguaia a empresa é única compradora.

“Não está fácil para ninguém, tem regiões que só tem JBS, mas outras ele (pecuarista) consegue alternativas”, acrescentou a consultora.

Com pecuaristas evitando negócios com a JBS, diante da fuga de investidores –a ação da empresa acumula perdas de cerca de 30 por cento desde que explodiu o escândalo na última quinta-feira–, a empresa tem seu custo fixo mais alto, na medida em que a ociosidade das unidades aumenta, explicou Lygia.

Ela comentou que, na situação atual de mercado, é muito mais fácil para o pecuarista segurar o boi do que para o frigorífico ficar sem comprar nada.

A confusão no mercado também foi relatada em análise nesta quarta-feira pelo Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada (Cepea), da USP.

“Diante das recentes notícias envolvendo empresa do setor pecuário, o ritmo de negócios de boi gordo está bastante lento. Inseguros, operadores dos diversos segmentos, da reposição ao atacado, se posicionam com muita cautela para compra e venda, negociando apenas quando há necessidade”, disse o Cepea.

Segundo o centro de estudos da USP, frigoríficos que têm escalas um pouco mais alongadas recuaram, acreditando que os preços podem ceder nos próximos dias. “Pecuaristas, por sua vez, confirmam o menor interesse por parte da indústria”, acrescentou.

Apesar de esse cenário resultar em pressão sobre as cotações, pontualmente, disse o Cepea, os frigoríficos com escalas mais curtas pagaram preços maiores para compra de novos lotes, fazendo com que as médias diárias se mantivessem ou mesmo aumentassem em alguns dias.

Entre 16 e 23 de maio, o indicador do boi gordo do Cepea cedeu 0,47 por cento, passando de 137,02 reais para 136,38 reais a arroba na terça-feira. No acumulado de maio, a queda é de 1,96 por cento.

(Reuters)