A crise econômica na Turquia – destino de cerca de 75% dos embarques de gado vivo do Brasil – acendeu um alerta no mercado. Os contratos com os turcos estão sendo renegociados e os valores pagos pelos bovinos devem recuar 10% em relação aos acordos firmados há 30 dias.
O envio previsto para este mês foi adiado até que os novos patamares de preços sejam firmados. O Brasil embarcou 400 mil animais no ano passado, o equivalente a menos de 1% da produção de bezerros do País, com receita de US$ 268 milhões. Para este ano, a perspectiva da Associação Brasileira de Exportadores de Animais Vivos (Abreav) é de que sejam embarcados 750 mil animais, com receita de US$ 800 milhões. Se essa previsão se concretizar, as exportações vão superar o recorde registrado em 2013, de 651 mil cabeças. De janeiro a julho deste ano, foram embarcadas 468 mil cabeças.
Barbosa não descarta que a perspectiva seja revisada assim que a situação turca se estabilizar. “Acredito que a expectativa deve se cumprir. A valorização do dólar frente ao real deve fazer com que os exportadores tentem retomar os embarques a mercados que foram deixados de lado, como Líbano, Jordânia e Iraque”, afirma o presidente da associação, Ricardo Barbosa. Segundo ele, esses países foram negligenciados uma vez que a Turquia passou a oferecer valores mais atrativos pelos animais desde o ano passado, ganhando gradativamente mais espaço entre os embarques.
Com a desvalorização da lira turca, estimada em mais de 40%, a capacidade do país de oferecer um preço atrativo pelos animais encolheu. Por outro lado, a escalada do dólar frente ao real ampliou as margens para os exportadores brasileiros em 15%, o que fez com que os compradores buscassem novos patamares de preços. “Eles [turcos] estão propondo valores 25% menores, ao passo que os animais foram comprados considerando contratos anteriores”, relata.
Esta não é a primeira vez que o Brasil enfrenta esse tipo de problema. A Venezuela já foi o principal destino dos embarques brasileiros de bovinos vivos. Este mercado movimentou 3 milhões de cabeças no ano passado.
A renegociação deixou os gaúchos em alerta, já que o Rio Grande do Sul tem na Turquia seu único mercado comprador de animais vivos. “O país não está fora do jogo, mas com intensa dificuldade. Acho que não vamos embarcar mais nada até o final do ano”, diz o economista da Federação da Agricultura do Estado do Rio Grande do Sul (Farsul), Antônio da Luz. O assunto foi um dos temas de intenso debate na Feira de Animais, Máquinas, Implementos e Produtos Agropecuários (Expointer).
Embora a Abreav fale em adiamento de negócios, pecuaristas gaúchos afirmam que há cancelamento de contratos. Luz explica que, ainda que este seja um mercado de nicho, é importante como ferramenta de barganha nas negociações entre pecuarista e frigoríficos. “Pode acontecer que esse excesso de oferta pressione os preços [dos bezerros] no segundo semestre”, pondera. O valor do quilo vivo pago pelo gado em pé para exportação chega a ser 60% superior ao dos animais negociados no mercado interno.
Castração
Outro fator de pressão sobre os preços é que o Rio Grande do Sul tem a cultura de castrar os animais enviados para abate nos frigoríficos, ao passo que para exportação o padrão é de animais inteiros. “Isso significa que esse animal vai ser vendido no mercado interno por um valor menor que o custo de produção”, avalia Luz.
De janeiro a julho, os pecuaristas gaúchos embarcaram 79,9 mil bovinos vivos, avanço de 234% sobre igual período do ano passado. Já em receita, os embarques somaram cerca de US$ 56,3 milhões, valor três vezes superior ao mesmo intervalo de 2017. Segundo a Farsul, esse resultado já é 58% superior ao desempenho do ano passado inteiro, em receita, e 50% maior, em volumes, na mesma base de comparação. “Nosso desempenho seria ainda maior não fosse essa crise na Turquia, entretanto, o crescimento em 2018 já está garantido”, destaca. /*A repórter viajou a convite do Pool de Imprensa Expointer 2018.