Marco Guimarães é administrador pela ESALQ/USP e trainee pela Agrifatto
Lygia Pimentel é médica veterinária e diretora-executiva da Agrifatto

Os abates de bovinos no Brasil em 2018 totalizaram 39,28 milhões de cabeças, um avanço de 2,69% ante os 38,25 milhões abatidos em 2017.

Trata-se da maior proporção desde 2014, quando foram abatidos 40,48 milhões de animais.

Entre 2001 e 2006, a principal trajetória para os abates foi de crescimento. A partir de 2007, houve o início de um novo ciclo pecuário marcado por um patamar renovado de abates totais e ajuste da ociosidade da indústria.

Observe que os abates totais recuam após os períodos com maior participação proporcional de fêmeas. E, posteriormente, a menor disponibilidade de animais para abate tende a pressionar para cima as cotações pecuárias.

Ao que tudo indica, essa é a transição que o mercado deve começar a fazer em 2019.

O número de fêmeas (vacas e novilhas) abatidas, que havia recuado entre 2013 e 2016, segue se expandindo pelo segundo ano consecutivo. Entre 2016 e 2018, o volume abatido passou de 14,14 para 16,32 milhões. E a representatividade sobre o total passou de 38,4 para 41,6%.

O gráfico 2 mostra de forma detalhada como a participação de fêmeas no total abatido passou de 31,7% (1999) para 41,6% (2018). É importante ressaltar que o IBGE considera novilhas as fêmeas com até 24 meses de idade, apenas.

A partir da variação acumulada (%) entre 1999 e 2018, evidencia-se que o crescimento da participação de fêmeas nos abates totais foi impulsionado, em grande parte, pelo abate de novilhas.

O principal motivo é a relativa perda de interesse na categoria de vacas frente ao custo-oportunidade de se vender novilhas a preço de macho, em muitos casos em que há programas de bonificação da carcaça desse animal junto aos frigoríficos.

Em 1999 e 2018, os abates de vacas representaram 26,5 e 31,4% do total, respectivamente. Já as novilhas, passaram de 5,2 para 10,1% no mesmo comparativo, reflexo do desenvolvimento do mercado consumidor no período.

Analisando os dois gráficos concomitantemente, percebe-se que entre 1999 e 2018: i) os abates totais cresceram 38,3%; ii) os abates de vacas cresceram 64,0%%; iii) os abates de novilhas cresceram 169,9%.

No caso do abate de vacas, a melhora dos índices zootécnicos ligados à atividade de cria foi essencial para a mudança de paradigma na figura da taxa de descarte de fêmeas que observamos agora.

E a análise desses números ilustra os ajustes pelos quais a pecuária tem passado nos últimos anos, com impacto sobre toda a cadeia, como os preços de reposição e índices zootécnicos. Podemos dizer que esses ajustes buscam o ganho de escala para equilibrar as tais perdas reais do valor do boi gordo ao longo das últimas três décadas.

Em outras palavras, a pecuária, principalmente impulsionada pela concorrência com a agricultura e pela diminuição dos valores reais do preço das commodities, precisou aumentar a produtividade de todas as fases (cria, recria e engorda) nas últimas décadas.

O motor propulsor desse movimento foi a valorização da arroba (ou ágio) do bezerro frente ao preço do boi gordo, ou seja, a redução da relação de troca no momento de repor.

O ciclo pecuário impacta diretamente a conjuntura do mercado pecuário e, consequentemente, a formação de preços de longo-prazo.

Sabemos que, ciclicamente, a participação de fêmeas nos abates cresce quando os preços do bezerro (e posteriormente do boi gordo) variam abaixo da inflação (fase atual) e, em um segundo momento, a redução da capacidade produtiva de bezerros ocasionada pelo descarte de fêmeas pressiona positivamente os preços.

Além do ciclo pecuário, a extensa seca entre abril e outubro/18 e a estiagem em dezembro e janeiro no Brasil Central, força o pecuarista a diminuir sua lotação, impactando negativamente as taxas de prenhez.

Portanto, nos primeiros meses de 2019, a participação de fêmeas ainda tende a continuar em patamares elevados, diminuindo ainda mais a oferta das categorias de reposição nos próximos períodos.

De acordo com essa dinâmica, o ciclo pecuário deve forçar um ganho real de valor para a arroba do boi gordo com reflexos mais marcantes a partir de 2020, precedido pela valorização do bezerro acima da inflação e, especialmente, acima da variação dos custos de produção, algo que já começou a acontecer desde a segunda metade de 2018.