“Sob um aspecto de problemática, iniciamos uma importante transformação que deve desenhar uma rota de inversão de tendência para o cenário catastrófico observado no ano passado.”
Não dá pra ficar com saudade de 2016, definitivamente. Uma montanha de escândalos de corrupção, impeachment, déficit público, desemprego recorde, PIB em queda, inflação persistente, cenário externo de incertezas, baixo crescimento econômico…
Entretanto, é interessante pensar no copo meio cheio. Sob um aspecto de problemática, iniciamos uma importante transformação que deve desenhar uma rota de inversão de tendência para o cenário catastrófico observado no ano passado.
Em primeiro lugar, mudanças substanciais na política econômica como resultado do forte movimento de combate à corrupção. Pela primeira vez em muito tempo conseguimos estabelecer uma agenda econômica mínima com a aprovação da PEC 241, que traz um fundamento de confiança à economia brasileira.
Quase que imediatamente após o impeachment, os indicadores de confiança de consumidores e empresários começaram a reagir, fazendo com que o Brasil timidamente desse sinais de que o país voltaria a ser um bom porto para se investir.
Com isso, o Real voltou a se valorizar contra o Dólar, barateando produtos importados e dando alívio à inflação corrente. Não só o Dólar aliviou o cenário inflacionário, mas também a radical queda do poder de compra do brasileiro, que o levou a consumir muito menos.
Com a queda da inflação, o Banco Central reiniciou uma política de redução da taxa de juros, que deve continuar ao longo de 2017 e 2018, caso não haja interferências externas negativas que demandem aumento da SELIC.
A redução da taxa de juros renova o acesso ao crédito, que por sua vez renova o consumo, o investimento e, consequentemente, o nível de emprego e crescimento econômico.
Lindo, não? Na teoria, sim. Mas isso ainda não fará de 2017 um bom ano.
O crescimento deve ocorrer em ritmo bastante lento. Há dois principais motivos para tanta cautela: possíveis fatores externos que podem impactar negativamente a nossa economia, como ocorreu em 2009, e um agravamento da crise política brasileira, uma vez que o número de escândalos e complicações (a morte do ministro Teori Zavascki, por exemplo) não para de subir.
Ainda contamos com grande dificuldade de se ajustar as contas públicas (apesar da aprovação da PEC 241, isso deve ser efetivado na prática). Como tudo muda no Brasil da noite para o dia, ainda temos muito serviço para mostrar através da reforma da previdência e provas de que uma possível insolvência brasileira não está rumando nossa história recente.
Ainda assim, acredito que o mais difícil já foi feito: inverter uma longa e forte tendência de auto-destruição econômica na qual o Brasil se meteu nos últimos 10 anos.
O reflexo disso sobre as carnes acontecerá como resposta à mudança das condições de renda do brasileiro.
Ele, que realizou uma substituição maciça da carne bovina pelo frango e suíno, voltará a focar suas atenções sobre a proteína vermelha, obviamente acompanhando a lentidão da recuperação econômica, que deve se confirmar ao longo do ano.
Portanto, mesmo que de maneira muito tímida, devemos observar o início da retomada do gosto do brasileiro pela carne bovina, com possibilidade de recuperação do consumo per capita ainda em 2017. Uma boa notícia que leva consigo todas as ressalvas feitas nas linhas anteriores do presente artigo.
É necessário considerar, entretanto, que essa recuperação leve não deverá ser suficiente para compensar o aumento de oferta esperado como resposta à retenção de fêmeas e ao maior estoque brasileiro de bovinos ocasionado pela queda dos abates nos últimos 3 anos.
Lygia Pimentel