FUNRURAL, PRORURAL, Contribuição Social Rural, RAT. O mesmo imposto é conhecido por diversas siglas e cada uma delas gera grandes confusões.

O Funrural teve início com o “Programa de Assistência ao Trabalhador Rural – PRORURAL” instituído por Lei Complementar nº.: 11 de 1971, à época decretada pelo congresso nacional e sancionada pelo então presidente Médici. O programa tinha a finalidade de beneficiar o trabalhador rural provendo-o de: aposentadoria, pensão, auxílio funeral e serviços voltados à saúde. Para tal, a captação dos recursos a serem usados na assistência ao trabalhador rural se daria por meio de um fundo denominado FUNRURAL, recolhido sob uma alíquota de 2% a ser cobrada sobre o valor comercial dos produtos rurais e recolhida pelos compradores, sejam eles estabelecimentos, cooperativas ou importadores.

Há época, o programa social pagava o benefício de meio salário mínimo relativo ao valor vigente. A figura-alvo do benefício era o trabalhador exclusivamente rural que mantinha a condição de chefe de família cuja a idade mínima era de 60 anos. Tal especificação deixava de fora, de forma bem clara, mulheres e jovens, pessoas que acessavam o benefício apenas em caso da morte do chefe da família. Se olharmos as condições de trabalho e expectativa de vida da população rural brasileira na década de 70, poucos eram os trabalhadores rurais que conseguiam receber este benefício de fato.

Avançando na linha do tempo, passando pelo fim do governo militar e o processo de redemocratização do país com a promulgação da constituição de 1988. A oitava constituição de nosso país modificou a estrutura do sistema previdenciário, urbano e rural, e passou a incluir o trabalhador rural, seja ele familiar ou assalariado no Regime Geral de Previdência Social – RGPS.

Somente em 1991, vejam bem, três anos após a promulgação da constituição atual, é que foi sancionada uma Lei de nº.: 8212, regulamentando a forma de contribuição do trabalhador rural para agora denominada seguridade social. Esta lei determinava a responsabilidade para as empresas, pessoas jurídicas na qualidade de empregadores a contribuir com a Previdência Social, fixando uma alíquota de 2,1% sobre a receita bruta proveniente da comercialização da produção. Desta contribuição, 2,0% iria para a Previdência Social e 0,1% para o Risco Ambiental de Trabalho – RAT. Um seguro contra acidentes de trabalho, pago pelo empregador à previdência para cobrir os custos desta com trabalhadores vítimas de acidentes de trabalho ou doenças relacionadas com o ambiente de trabalho, ou seja, doenças ocupacionais.

No entanto, a inconstitucionalidade do FUNRURAL foi dada primeiramente em 1996, quando não se permitiu a incidência da tributação sobre o contribuinte agroindustrial. Afinal de contas, segundo entendimento do Superior Tribunal Federal (STF), a constituição não discorria sobre a incidência de contribuições sociais por meio da receita bruta, muito menos do “valor estimado de produção agrícola própria”.

Em 1998, foi promulgada a emenda constitucional EC 20/98, que alterava o artigo 195 da constituição. Em resumo, ela acrescentava que a seguridade social seria financiada pela receita ou o faturamento do vendedor do produto, além dos outros meios de financiamento já contidos no artigo antes da emenda. Como? Através das contribuições por meio do empregador, da empresa e da folha de salários. Já em 2001, foi sancionada a Lei nº.: 10.256/2001. Ela alterava a lei de 1991, regulamentando a forma de contribuição do trabalhador rural, porém, desta vez obrigando a agroindústria a contribuir para o financiamento da seguridade social, cuja alíquota seria calculada sobre o valor da receita bruta proveniente da comercialização da produção.

Fique claro, portanto, que, segundo a lei, a partir daquele momento a indústria deixaria de recolher a contribuição sobre a folha de pagamento para recolher 2,5% sobre a receita bruta da comercialização da produção para a previdência, 0,1% para o RAT e 0,25% para o Serviço Nacional de Aprendizagem Rural – SENAR.

Em julgamento de 2008, o STF considerou inconstitucional a cobrança do FUNRURAL regulamentado pela lei sancionada na década de 90 (Lei 8212/91), que previa a criação de uma nova fonte de receita da Previdência Social por meio contribuição sobre a receita bruta da comercialização da produção agrícola. E este tipo de cobrança sobre a receita bruta não era previsto na constituição à época. Além disso, a lei sancionada deveria ter sido regida como uma lei complementar, pois, desta forma, teria que passar pela aprovação do Congresso Nacional. Como isso não ocorreu, a lei da década de 90 foi regida como uma lei ordinária, e não passou pelo congresso.

Com a decisão do STF, resultante de ação movida por um frigorífico, abriu-se precedentes jurídicos para os demais produtores sobre a cobrança do tributo. Muitos produtores que entraram na justiça, através de processos que se arrastaram por anos, conseguiram receber de volta aquilo que haviam tido que descontar de sua produção no passado.

Entretanto, em março deste ano, ao avaliar um recurso da União, o mesmo STF decidiu que o FUNRURAL é, sim, constitucional. O que ocorre é que o Tribunal se baseou na emenda constitucional de 1998, quando se permitiu a cobrança sobre o faturamento, e a lei de 2001 que a regulamentou.

O que observamos ao longo da história é uma constante mudança na legislação. Desta forma, concluímos que aquele FUNRURAL, criado na década de 70, era regido por uma constituição que não mais representa a atual. Assim, podemos considerá-lo fora de questão.
O “segundo” FUNRURAL, regido pela lei de 1991, foi considerado inconstitucional pelo STF, conforme já explicado.

O “terceiro e atual” FUNRURAL, que foi julgado constitucional pela corte de justiça é este a partir da lei de 2001, ou seja, aquele que recolhe do valor bruto da produção um total de 2,3%, sendo 0,2% referentes ao Senar/CNA e 2,1% o tributo em si que, com a decisão do STF, voltará a ser cobrado. O responsável pelo recolhimento é a indústria, no caso de o vendedor ser Pessoa Física, e no caso da Pessoa Jurídica, o recolhimento ocorre de maneira direta pela mesma.

Um dos problemas com esse tipo de recolhimento, especialmente na cadeia pecuária, é que o imposto pode incidir sobre o mesmo produto várias vezes: ao criador, no momento de vender o bezerro, ao recriador, no momento de comercializar o boi magro, e ao terminador, no momento de vender o animal ao frigorífico.

Outra questão que gera problemas e causa indignação é a possibilidade de o STF julgar procedente a cobrança retroativa do imposto, que colocaria em xeque a capacidade de adimplência do produtor que deixou de recolher o tributo nos últimos 5 anos.

Dada a situação atual, a incidência do imposto pode impactar entre 12 e 25% a linha final de resultado do produtor pecuário, algo que compromete a rentabilidade e prejudica o setor, especialmente neste momento: estamos em plena fase de baixa do ciclo pecuário e o setor acabou de ser acometido pelos reflexos da operação Carne Fraca. No fim das contas, a insegurança trazida pela retomada da tributação gera volatilidade e a necessidade de reavaliação de estratégias por parte dos produtores e agentes da cadeia.

Um verdadeiro retrocesso.