Lygia Pimentel é médica veterinária e consultora pela Agrifatto
Já em 2016 era sabido que este seria um ano difícil, com grandes desafios. Redução da proporção de fêmeas abatidas completando 4 anos, complicações relativas ao cenário macroeconômico, exportação nas mínimas dos últimos 3 anos… mas tenho certeza que, assim como ocorrido com a crise político-econômica, nem mesmo os melhores analistas de mercado previram o que estava por vir.
A variação de preços tem sido tão intensa, especialmente após a deflagração da Operação carne Fraca, que se assemelha aos tempos de instabilidade econômica brasileira, vividos ainda na década de 1980: 12,7% de queda nominal de preços em 10 meses e 15,0% em termos reais.
Em 2005, quando ocorreram os casos de febre aftosa no Mato Grosso do Sul e Paraná, a variação de preços marcou uma queda nominal de 14,0% em 8 meses, tendo iniciado sua recuperação logo em seguida, para jamais voltar àqueles patamares.
Na sequência, o ciclo pecuário falou mais alto. Ele sempre fala mais alto. Observe o gráfico 1.
Gráfico 1.
Evolução dos preços do boi gordo (R$/@) em São Paulo corrigidos pelo IGP-DI.
Fonte: IEA/Cepea/FGV/Agrifatto
Fora a Operação, tivemos o retorno da cobrança do Funrural, que abocanha mais uma parte da linha final de resultados na atividade pecuária.
A derrocada formada pela ponta da evolução dos preços no gráfico chama a atenção. Há tempos não víamos uma volatilidade tão acentuada no mercado pecuário. E considerando-se a correção de preços pelo IGP-DI, voltamos aos valores apurados em novembro de 2013.
Você está chocado com isso? Talvez não devesse estar. Observe que o gráfico 1 é dividido em duas cores que se repetem e que de maneira intercalada representam os diferentes ciclos pecuários registrados através da história dos preços do boi gordo. E o que estamos vendo hoje já aconteceu no passado.
A pergunta que se faz é “até onde os preços podem ir?”. E eu respondo: NINGUÉM SABE. Apenas uma dica que o gráfico nos dá: o próximo suporte a ser atingido são os R$ 130,00/@ em São Paulo.
Parece horrível, mas se você conseguir enxergar através dos preços, verá que há uma grande oportunidade oculta aqui.
Primeiramente, é imprescindível saber que o mundo não vai acabar e que o consumo de carne deve retomar seu ritmo de crescimento conforme a economia se recupera. Com preços mais baixos, o abate de fêmeas deve voltar a tomar corpo e futuramente enxugar a oferta de bezerros e, mais tarde, consequentemente, de animais terminados. Então, enxugue essa lágrima do seu olho esquerdo, pois o que temos aqui é um mercado em transformação com uma gigantesca oportunidade se formando.
Em um par de anos, quando a economia estiver melhor e as fêmeas tiverem sido abatidas de maneira mais representativa, os preços voltarão a se valorizar acima da inflação (e dos custos de produção), remunerando novamente quem conseguiu surfar essa onda.
Mas para diluir o resultado dos tempos difíceis, você terá que produzir um volume razoável de arrobas por hectare. Portanto, desacelerar de maneira brusca neste momento pode te levar a não conseguir realizar essa diluição. O que estou querendo dizer com isso?
Que neste momento a reposição está derretendo junto com o boi gordo e a oportunidade de fazer estoque de animais com 50% de desconto está aí, batendo em sua porta!
Ao entregar esses animais comprados hoje e terminados em um futuro não muito distante, você conseguirá remunerar melhor cada arroba produzida a um custo mais baixo com a aquisição da reposição, o que te coloca à frente da roda do ciclo pecuário.
E o ciclo pecuário é implacável. Ele coloca para fora os ineficientes e exige cada vez mais dos eficientes. Para ilustrar isso, novamente usarei o gráfico 1, que nos mostra a perda de valor real da arroba ao longo dos anos. Isso significa que para sobreviver na atividade, temos que produzir cada vez mais por área, diluindo custos fixos, aumentando a eficiência e trabalhando a produção de arrobas por área, não de cabeças.
O ciclo pecuário envolve períodos difíceis que duram mais do que os períodos de bonança. Em outras palavras, as fases de baixa dos ciclos duram mais tempo do que as fases de alta, o que confirma a afirmação feita no parágrafo anterior. Podemos dizer que o ciclo pecuário se comporta em formato de elipse, e não de círculo. Elipse porque os períodos ruins estão localizados no maior diâmetro da elipse, enquanto os períodos bons se localizam no diâmetro mais curto. Observe a figura 1.
Figura 1.
A trajetória elíptica dos resultados na pecuária.
Fonte: Agrifatto
E o grande desafio de levar a vida como pecuarista está em conseguir manter o ritmo em períodos ruins para potencializar os ganhos através da maior produtividade em tempos bons.
Então mais do que lamentar o momento atual, temos que enxergar a monumental oportunidade que ele nos traz considerando a visão de longo-prazo da atividade. E em pecuária, a gente já sabe: só serve pra quem quer de fato viver dela.
Um abraço e até a próxima!