(Reuters) – A Câmara dos Deputados aprovou nesta quarta-feira, com placar folgado, o texto principal da reforma da Previdência em primeiro turno, garantindo uma conquista ao governo, mas quem saiu mesmo vitorioso foi o presidente da Casa, Rodrigo Maia (DEM-RJ), que sob o discurso do protagonismo e da responsabilidade do Congresso e aliado ao chamado centrão, carregou a reforma nas costas e negociou sua aprovação.

Aprovada por 379 votos a 131 —placar bem superior aos três quintos exigidos para a aprovação de uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC), o equivalente a 308 votos—, a reforma cumpre mais uma etapa na tramitação, mas ainda tem um percurso a percorrer.

O texto chancelado nesta quarta ainda pode ser alterado por emendas as serem votadas separadamente. A expectativa era de que a Câmara estendesse a votação da reforma para votar todos os destaques até a madrugada e assim concluir o primeiro turno, mas Maia preferiu interromper a votação quando percebeu que, segundo ele, os deputados estavam confusos com as propostas de mudanças. A votação continua na quinta-feira.

Uma das prováveis mudanças que devem ser promovidas diz respeito às regras de aposentadoria dos policiais e de mulheres, ambas fruto de acordo entre lideranças.

Temas como a aposentadoria de professores e o pagamento da pensão por morte também são objetos de destaques, mas nesses deve haver embate.

A controversa possibilidade de inclusão de Estados e municípios no texto das novas regras previdenciárias deve ficar, segundo acordo fechado entre as principais lideranças da Casa, para quando a proposta chegar ao Senado.

Uma vez encerrada a primeira rodada de votação, a PEC precisa ser novamente avaliada pela comissão especial, para que dê o aval ao texto produzido pelo plenário.

 

Só então, a PEC volta ao plenário para o segundo turno de votação, respeitado o intervalo de 5 sessões do primeiro turno. Mas esse prazo deve ser quebrado por meio de um requerimento, já que parlamentares favoráveis à proposta alimentavam a expectativa de liquidar sua tramitação por completo na Câmara ainda nesta semana.

Para isso, no entanto, além da quebra de interstício, será necessário que o governo cumpra o compromisso assumido de liberar recursos para emendas parlamentares. A sinalização foi dada no início da semana e animou os parlamentares na terça-feira pela manhã, mas apenas até o momento em que se deram conta que os recursos empenhados referiam-se apenas à área da saúde. Restavam pendentes as emendas relacionadas a outras áreas.

Segundo uma fonte que acompanha as negociações, o governo trabalha para agilizar a liberação e há expectativa de uma resolução até a sexta-feira.

Consultadas pela Reuters, lideranças afirmam que é quase nula a possibilidade de se deixar a votação de um segundo turno para a próxima semana. Se não for possível concluir a análise da reforma nesta semana, o mais provável é que ela seja deixada para o retorno do recesso parlamentar, com início previsto para o dia 18 deste mês.

LIBERAL

Dois líderes avaliaram que o governo tem que fazer a sua parte e creditam o sucesso da votação do texto-base nesta quarta ao presidente da Câmara.

Após ríspidos atritos com o governo, defensores do presidente Jair Bolsonaro e integrantes do PSL, e irritado com ataques via redes sociais, Maia, até então o principal fiador da Nova Previdência, ameaçou pendurar a toalha e se afastar das negociações.

 

A proposta entrou, de fato, em um momento de indefinição, mas o presidente da Câmara, aliado ao chamado centrão, deu um novo gás à reforma, não sem antes frisar uma postura de protagonismo do Parlamento e de independência do governo. O discurso em voga passou a ser o da responsabilidade do Congresso com o país, que, após manifestações de rua em favor da proposta, entendia a necessidade da sua aprovação.

Durante a votação nesta quarta, o líder do PSL, Delegado Waldir (PSL-GO), aproveitou o momento de encaminhamento de voto para fazer elogios públicos à atuação de Maia pela aprovação da Previdência. O deputado, que também já teve seus atritos com o presidente da Câmara, usou o discurso para fazer um “agradecimento especial”.

“Sem o Rodrigo Maia, nós não chegaríamos a este momento”, disse, acrescentando que o presidente da Casa é um “liberal” e tratou com respeito todos os parlamentares, incluídos os da oposição.

Sob aplausos do plenário, Maia se mostrou visivelmente emocionado. Depois, pouco antes de divulgar o resultado da votação, reclamou que o Congresso era atacado de forma “exagerada”, assim como o Supremo Tribunal Federal (STF).

Apontou que são os parlamentares e líderes os responsáveis pelas mudanças no país, citando especialmente o centrão, e negou que a atuação do Legislativo tenha a intenção de tirar prerrogativas do presidente da República.

“Muitas vezes os nossos líderes são desrespeitados, às vezes na imprensa, criticados de forma equivocada, mas são esses líderes que estão fazendo as mudanças no Brasil, junto com cada um dos deputados e com cada uma das deputadas”, disse Maia.

“O centrão é essa coisa que ninguém sabe o que é, ‘mas é do mal’. Mas é o centrão que está fazendo a reforma da Previdência, esses partidos que se dizem do centrão”, acrescentou.

O governo, admitem até mesmo defensores da gestão Bolsonaro, fez muito pouco e entrou de última hora nas negociações. Atuou na liberação de emendas, apesar do discurso contra o que considera “velha política” e o “toma lá, dá cá”, e travou conversas com parlamentares. Até mesmo Bolsonaro entrou diretamente nas negociações no final, tentando abrandar as regras de aposentadoria para policiais.

 

A equipe econômica, por sua vez, aguarda a conclusão da tramitação da proposta na Câmara para calcular seu impacto e se a economia gerada com o texto se mantém próxima à meta de 1 trilhão de reais em dez anos.

Presente no plenário durante a votação, e importante negociador da PEC, o secretário especial de Previdência e Trabalho, Rogério Marinho, afirmou que vem defendendo desde o início que sejam conferidas compensações a qualquer concessão promovida no texto. Por isso mesmo, ainda atuava na tentativa de convencer parlamentares a não apoiarem as emendas da oposição.

“Todos os destaques da oposição são no sentido de alterar e de impactar fiscalmente o texto. Então estamos aqui tentando conversar com os líderes que têm compromisso com a pauta para que possamos manter íntegro o que foi aprovado aqui no Parlamento”, disse o secretário, lembrando que devem ser aprovados os destaques referentes ao acordo que possibilitou um abrandamento das regras para mulheres e para policiais.