Rodrigo Maia: Considerado fiador da reforma da Previdência, presidente da Câmara afasta-se do governo depois de embates com Moro e filho de Bolsonaro
A relação entre a Câmara dos Deputados e o governo, que já não era das melhores, azedou de vez.

O projeto de reforma na previdência dos militares, visto como muito suave, e a queda na popularidade do presidente Jair Bolsonaro agravaram a já problemática articulação política.

Responsável por pautar os projetos em plenário e decidir sobre pedidos de impeachment, o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), vive o momento de maior afastamento do governo. Bateu boca com o ministro da Justiça, Sergio Moro, foi atacado pela rede bolsonarista e por um dos filhos do presidente, o vereador Carlos (PSC-RJ), na internet e avisou ontem aliados que adotará “papel institucional” na negociação da reforma da Previdência.

Moro, cúpula da PF e ministros do Supremo evitam comentar prisão
Maia está irritado desde o fim de semana, segundo aliados. Ele marcou um almoço com Bolsonaro e o presidente do Supremo Tribunal Federal, ministro Dias Toffoli. Bolsonaro levou 20 ministros e assessores para evitar uma conversa particular. Saiu de lá e escreveu nas redes sociais atacando a “velha política” e a pressão por cargos.

O desconforto escalou nos dias seguintes com o aumento dos ataques por perfis ligados à campanha de Bolsonaro. Depois que Maia suspendeu a tramitação dos projetos de Moro para privilegiar a reforma da Previdência, e o ministro cobrou a votação de seus projetos, a hashtag “#RodrigoRespeitoSergioMoro” ganhou as redes junto, com menções a inquéritos a que o presidente da Câmara responde.

O presidente da Câmara se queixou do bombardeio nas redes sociais com o ministro-chefe da Casa Civil, Onyx Lorenzoni. Não adiantou. Ontem, Carlos postou no Instagram fotos de Maia e de Moro acompanhadas de uma pergunta: “por que o Presidente da Câmara anda tão nervoso?”. Maia se revoltou. Entendeu como prova de que Carlos estava por trás dos ataques.

Em longa reunião, Maia disse a aliados que era o único negociando de fato para aprovar a reforma, mas que a partir de agora torcerá para que dê certo e terá postura mais institucional, deixando que os líderes indicados pelo governo resolvam os problemas da base.

O presidente da Câmara tem servido como porta-voz da reclamação dos deputados por espaço no governo, cargos e emendas. Virou alvo de Bolsonaro, que faz o discurso de que não aceitará o “toma-lá-dá-cá” e tenta governar com a pressão da sociedade sobre o Congresso. É cedo para dizer o impacto nas votações, mas, com a popularidade de Bolsonaro em queda, ganha força a articulação para que a relatoria da reforma da Previdência fique com alguém do PSL. A responsabilidade pela derrota, portanto, cairia sobre o governo.

Ontem, Maia não deu andamento à tramitação do projeto dos militares. O texto chegou na quarta-feira, mas ainda aguarda despacho dele – o mais provável é criar uma comissão especial.

A proposta foi a gota d’água com os deputados. Há quase um consenso de que o discurso da justiça social da reforma caiu por terra, já que os militares terão uma reestruturação da carreira como contrapartida a que paguem alíquota previdenciária maior. O clima ficou tão ruim que a escolha do relator da reforma na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), controlada pelo PSL, foi adiada mais uma semana.

O governo também está alheio à pauta de plenário, que só avançou em acordos dos líderes, enquanto os projetos do Executivo estão parados. Há 22 MPs, algumas com o prazo quase estourado, esperando a criação de comissões. Para contrapor a liderança do governo, Maia criou ontem o cargo de líder da maioria na Câmara, que terá a frente Aguinaldo Ribeiro (PP-PB).

Já o embate com Moro reduziu as chances do pacote prosperar, dizem deputados, e aumentou a possibilidade de que outros projetos passem na frente, como o do ministro do Supremo Tribunal Federal Alexandre de Moraes e o novo Código de Processo Penal – a comissão para discuti-lo foi reinstalada ontem por decisão do presidente da Câmara.

Até aliados do governo veem o cenário como caótico. O deputado Paulo Martins (PSC-PR), relator da MP do combate a fraudes no INSS, disse que, até semana passada, achava que a distribuição de cargos resolveria o problema, mas que a deterioração foi rápida. “O ambiente na Câmara não é bom. Dizem que animais conseguem perceber quando uma catástrofe está para acontecer. Talvez o animal político também”, afirmou. A MP, um dos pilares da reforma da Previdência, sequer tem comissão instalada até agora, quase dois meses depois do início da legislatura.

A prisão do ex-presidente Michel Temer ontem, junto com o ex-ministro Moreira Franco – que é padrasto da esposa de Maia – alimentou comentários de perseguição. A decisão ocorreu pelas mãos do juiz Marcelo Bretas, próximo da família Bolsonaro. Embora Maia tenha desconversado a aliados, era constante a lembrança no plenário de como o presidente fritou rapidamente um aliado muito mais próximo, o ex-ministro Gustavo Bebianno, de quem era amigo. (AE)