No curto prazo, o dólar acima de R$ 4 ainda afeta pouco a inflação por causa da atividade econômica fraca. Mas no cenário de médio e longo prazos, a moeda americana mostra sinal firme de valorização, uma preocupação ao País.
Ontem, o dólar comercial chegou a atingir a máxima de R$ 4,1462 no mercado spot (à vista), o maior valor desde janeiro de 2016. Mas fechou os negócios com elevação de 1,38%, cotado a R$ 4,1376 .
Na avaliação de economistas e profissionais de mercado consultados pelo DCI, o atual patamar do dólar é exagerado e deve ceder logo após a conclusão das eleições presidenciais de outubro.
“O grande definidor das expectativas será o resultado da eleição. Nossa projeção desde o começo do ano é de R$ 3,50, pois trabalhamos com o cenário de um presidente reformista para 2019. Mas evidente que o plano econômico [do(a) presidente eleito(a)] terá que ficar mais claro”, diz o economista do Santander, Luciano Sobral.
Nas projeções dele, a cada 10% de alta do dólar, a transmissão para inflação é de 0,5 ponto percentual ao longo de 12 a 18 meses. “A economia está muito fraca. As empresas vão preferir reduzir suas margens a repassar preços. O núcleo da inflação está bem comportado, perto de 2% ao ano. Mesmo o aumento da gasolina não contamina toda a inflação”, afirma Sobral.
Na mesma linha de pensamento, o economista-chefe da Modalmais, Alvaro Bandeira, diz que essa elevação de curto prazo do dólar ainda não é suficiente para impactar a inflação. “A economia está desacelerada, não se vai conseguir repassar preços”, ressalta.
Por outro lado, Bandeira aponta que a tendência é de um dólar mais valorizado para o médio e longo prazos por causa do ciclo de aumento de juros nos Estados Unidos, que retira fluxo financeiro de outros países. “O dólar está se valorizando em relação a todas as moedas. Os EUA estão crescendo a 3% ao ano, talvez até 4% em 2019”, argumenta.
Para o diretor de investimentos da Mirae Asset Global Investments, André Pimentel, o aumento do dólar no curto prazo já está precificado pelo mercado. “O Brasil possui reservas [US$ 379,5 bilhões], um dólar mais justo seria mais próximo de R$ 3,80. As expectativas de inflação não se alteraram, estão próximas do centro da meta [de 4,5% ao ano] para 2018 e 2019”, diz.
De fato, segundo a Pesquisa Focus do Banco Central publicada no dia 27 de agosto, a previsão para o IPCA é de 4,17% em 2018, e de 4,12% para 2019, e de 4% para 2020, enquanto a estimativa para o câmbio está em R$ 3,75 para 2018, R$ 3,70 em 2019 e valor de R$ 3,68 para 2020.
Entre os alicerces da solidez do Brasil, Pimentel lista o tamanho das reservas, o déficit externo próximo de zero, e o baixo endividamento em dólar. “Mas, no médio e longo prazos, a política monetária dos EUA secará o fluxo de recursos para diversos países emergentes, entre eles, o Brasil”, diz.
A coordenadora do curso de administração da Universidade Presbiteriana Mackenzie de Campinas, Leila Pellegrino, completa que o dólar também está elevado por causa da guerra comercial dos Estados Unidos com outras nações.
“A volatilidade do dólar não é uma coisa desejada para o planejamento das empresas, que podem adiar planos de investimentos. E, embora o setor exportador seja beneficiado num primeiro momento, esse ganho é muito pequeno, pois temos uma dependência de insumos importados e de máquinas e equipamentos”, diz.
Para o CEO da Preço Certo, Marcelo Roque, o aumento do dólar só é considerado bom para os exportadores de produtos primários (commodities). “Mas são exportações baratas. Temos dependência de produtos importados de maior valor agregado”, lembrou.
Roque conta que alguns empresários importadores terão dificuldades de capital de giro para trazer produtos importados. “Nem sempre será possível repassar o custo para o consumidor final”, avaliou o executivo da Preço Certo, que é especialista em precificação e indicadores financeiros.
Consumo desaquecido
Roque acrescentou que a indústria brasileira poderá ser a mais prejudicada com a alta do câmbio. “O consumo está muito sensível ao preço. A tendência é de margens menores na indústria”, aponta o executivo.
Alvaro Bandeira, economista-chefe da Modalmais, diz que o repasse dos preços ocorrerá mais rápido em determinados segmentos: trigo, gasolina, querosene de aviação.