O Brasil está correndo para lançar alternativas de alta tecnologia para fertilizantes, em meio aos aumentos de preços globais exacerbados pela guerra entre Rússia e Ucrânia.
Drones equipados com câmeras pairam sobre fazendas centenárias, permitindo que os agricultores usem fertilizantes apenas onde é realmente necessário, enquanto laboratórios próximos usam os mesmos lasers empregados pela Nasa em Marte para realizar análises de solo em segundos. Géis brancos especiais mantêm os nutrientes perto das raízes das plantas com precisão minuciosa, evitando desperdícios, e cientistas da Embrapa ajudam agricultores mais carentes a transformar suas próprias fezes em adubo usando micróbios de intestinos de vaca.
Mesmo antes de a Rússia invadir a Ucrânia em fevereiro, o Brasil estava testando uma variedade de soluções de alta tecnologia para aumentar a produtividade e reduzir a dependência crônica do país de fertilizantes importados. Com a oferta global agora escassa, essas soluções estão atraindo bastante interesse, tanto dentro quanto fora do Brasil.
“Todas as grandes multinacionais do agronegócio estão agora entrando no Brasil por causa da inovação que vem ocorrendo”, disse Bob Morris, agrônomo americano e presidente da consultoria AndMore Associates, com sede em Washington. As tecnologias que estão sendo desenvolvidas no Brasil têm o potencial de “afetar significativamente a eficiência de fertilizantes globalmente”, acrescentou.
No mês passado, a fabricante de fertilizantes Mosaic, dos Estados Unidos, investiu na Gênica, empresa paulista que usa micróbios para impulsionar o crescimento de plantas. A norueguesa Yara firmou recentemente parceria com a Drop Agricultura, empresa brasileira que desenvolve uma alternativa ao nitrogênio. Em março, a Yamaha Motor investiu na Arpac, fornecedora brasileira de tecnologia de drones agrícolas.
O Brasil, que produz 10% dos alimentos do mundo, atraiu US$ 1,3 bilhão em investimentos em tecnologia agrícola no ano passado, ocupando o sexto lugar no mundo, de acordo com a AgFunder, uma empresa de investimento e pesquisa.
O pai da química Carime Rodrigues não ficou impressionado quando ela lhe disse que não tinha intenção de trabalhar na fazenda da família e foi estudar química na faculdade. Em parceria com seu professor, Carime passou os anos seguintes dentro de um laboratório desenvolvendo nanopartículas para acelerar a fotossíntese e a absorção de nutrientes, permitindo que os agricultores aumentem a produção sem a necessidade de fertilizantes extras. “Eles pensavam que estávamos loucos”, disse Carime, de 26 anos, sobre sua família. Agora, o líquido de nanopartículas, chamado Arboline, está ganhando força rapidamente nas fazendas e nas salas de reuniões de investidores.
Idealizado pelo professor da Universidade de Brasília Marcelo Oliveira Rodrigues e desenvolvido em parceria com a Embrapa, o Arboline chegou ao mercado em 2021 e está espalhado por mais de 60 mil hectares de terras agrícolas brasileiras.
A Krilltech, empresa que produz Arboline e da qual Rodrigues é um dos fundadores, disse que até este ano a maioria dos agricultores usava o produto para aumentar a produção enquanto aplicava as quantidades habituais de fertilizante. Os dados da empresa até agora mostram que a produção aumentou 21% para lavouras de soja e até 50% para algumas hortaliças.
Mas o produto também pode ajudar agricultores a manter a produção mesmo com a redução do uso de fertilizantes. Segundo a Embrapa, dados preliminares mostraram que o Arboline permitiu que a produção ficasse estável mesmo com uma redução de 10% a 30% no uso de fertilizantes. Especialistas disseram que mais dados são necessários.
Empresas brasileiras de tecnologia que trabalham para reduzir o uso de fertilizantes já se uniram a empresas nos EUA, Reino Unido e Noruega, e o Serviço Florestal dos EUA disse que testará o Arboline em projetos de reflorestamento na Califórnia ainda neste ano.
Milt McGiffen, professor de botânica da Universidade da Califórnia, em Riverside, disse que planeja testar o produto nos próximos meses e, se for eficaz, apresentá-lo às fazendas de avocado e citros da Califórnia no ano que vem. Provavelmente, também haverá demanda no Meio-Oeste, disse. Os agricultores estão há muito tempo sob pressão para reduzir o uso de fertilizantes, que acabam indo parar no rio Mississippi e no Golfo do México.
Cerca de 800 quilômetros ao sul de Brazlândia, em uma fazenda experimental da Embrapa no cinturão agrícola de São Paulo, pesquisadores esperam que a crise global de fertilizantes atraia mais produtores para a tecnologia, acelerando a modernização das fazendas brasileiras.
Em três estufas gigantes, Adriel Bortolin, químico de 34 anos, vem realizando os testes finais do Fertgel, produto que desenvolveu com a Embrapa e que estará à venda ainda este ano. Usando a nanotecnologia, ele criou um hidrogel semelhante ao usado em fraldas, mas ainda mais absorvente. Cada grama pode reter pelo menos um copo de água, que Fergel libera lentamente ao redor das raízes de uma planta, permitindo que as plantações prosperem durante as secas.
Uma receita sob medida de nitrogênio, fósforo e potássio também pode ser adicionada ao gel, mantendo os nutrientes próximos às raízes. Os fertilizantes convencionais são frequentemente perdidos quando penetram muito no solo. Os climas tropicais só aumentam o problema, com chuvas fortes que podem lavar o fertilizante e calor intenso que pode fazer com que o fertilizante de ureia evapore rapidamente como gás de amônia.
Outras soluções são mais rudimentares, explicou o pesquisador da Embrapa Wilson Lopes da Silva, mostrando uma garrafa de líquido amarelo – um “biofertilizante” que tanques subterrâneos ligados ao sistema de esgoto da Embrapa produzem a partir de dejetos de funcionários, com a ajuda de microrganismos derivados de fezes de vaca. “Houve algum preconceito no início”, disse Lopes da Silva.
A Embrapa vem testando o produto em 12 pequenos lotes de milho. Lopes da Silva disse que espera que os dados encorajem mais pequenos agricultores familiares a adotar o sistema – uma maneira barata de aumentar a produção ao mesmo tempo em que se melhora a gestão do esgoto.
Ao lado das estufas, tratores robóticos gigantes construídos pela empresa brasileira Jacto e drones ajudam os produtores a cultivar com mais precisão. Essas máquinas capturam imagens detalhadas das culturas, ajudando os agricultores a decidir onde aplicar o fertilizante.
De sua casa em São Paulo, Tamires Casagrande, 26, usa uma plataforma criada pela empresa brasileira InCeres para monitorar a fazenda de seu pai em Mato Grosso do Sul, a nove horas de carro. Agrônoma e uma das primeiras da família a cursar a universidade, ela analisa imagens de satélite das lavouras há três anos, usando-as para gerar orientações precisas para a aplicação de fertilizantes. Logo ficou claro que parte da terra poderia produzir bem com menos, deixando mais fertilizante disponível para áreas em dificuldades.
A InCeres recentemente firmou parcerias com as fabricantes de máquinas Agco e CNH Industrial.
Com os preços dos fertilizantes subindo, mais agricultores têm pedido seus serviços de consultoria nos últimos meses, disse Tamires.