(Reuters) – Depois de uma reunião de sete horas, governo e representantes de caminhoneiros chegaram a um acordo nesta quinta-feira para suspender por pelo menos 15 dias a greve que atingiu o país na última semana, com o governo garantindo a subvenção do preço do diesel e reajustes a serem realizados apenas a cada 30 dias.
A proposta final, que levou pelo menos a maior parte da categoria a ceder a uma trégua de 15 dias, fará com que o governo garanta, até o final deste ano, que os reajustes do diesel sejam feitos apenas a cada 30 dias na refinaria e o governo compense as possíveis perdas da Petrobras (PETR4.SA), além de zerar a incidência da Cide sobre o diesel.
“Vai ter um preço fixo ao longo do mês. Vai haver uma diferença entre esse preço e o preço médio que a Petrobras usaria. Vamos calcular quanto a empresa deixou de faturar e vamos pagar essa diferença”, explicou o ministro da Fazenda, Eduardo Guardia. “Nos momentos em que o preço cai e fica abaixo do preço fixado para o diesel na refinaria, a Petrobras passa a ter um crédito que vai reduzir o custo do Tesouro.”
Guardia, como os demais ministros que apresentaram o acordo final, fizeram questão de afirmar que não estava havendo interferência na política de preços da Petrobras -o risco de ingerência política, pressentido pelo mercado depois da decisão de quarta-feira da empresa de reduzir o diesel em 10 por cento por 15 dias levou a uma queda de mais de 14 por cento nas ações da empresa nesta quinta-feira.
“A política de preços da Petrobras continua intacta e preservada até a refinaria. Da refinaria para frente o governo disponibiliza recursos para dar previsibilidade aos preços. Dali para frente o governo intervém. Até a porta da refinaria fica preservado”, disse o ministro da Secretaria de Governo, Carlos Marun.
O ministro da Fazenda calcula em 700 milhões de reais por mês a compensação que terá de ser feita pelo Tesouro à Petrobras, uma conta feita em cima do valor estimado pelo presidente da empresa, Pedro Parente, para os primeiros 15 dias de congelamento, bancados pela própria estatal.
Segundo Guardia, a Fazenda prevê um crédito extraordinário – que ainda precisa ser aprovado pelo Congresso- de 4,9 bilhões até o final do ano. O valor poderá ser maior ou menor a depender da oscilação do preço do petróleo e da variação do dólar no período em que o valor do diesel ficar fixo.
O ministro explica que o crédito extraordinário não afeta o teto de gastos, que prevê a criação de despesas extraordinárias, mas afeta o Orçamento.
“Vamos ter que cancelar alguma despesa para abrir margem orçamentária, vamos ter que compensar o crédito com cortes de despesas”, disse.
O acordo com os caminhoneiros foi além da redução da Cide e do congelamento dos reajustes por 30 dias. O governo ainda se comprometeu garantir que 30 por cento da contratação dos transportes de carga pela Conab será feita com caminhoneiros autônomos, obrigar os Estados a cumprir a lei federal que proíbe a cobrança de pedágio sobre o terceiro eixo em caminhões vazios e não reonerar a folha de pagamento do setor pelo menos até 2020, além de suspender as ações judiciais contra as entidades.
No entanto, um dos pontos centrais do pedido inicial dos caminhoneiros, a isenção do PIS/Cofins, terminou ficando de fora do acordo. A confusão causada pela Câmara, aprovando uma proposta com uma compensação muito menor do que a necessária, foi usada pelo governo para convencer as entidades a deixar a negociação mais para frente, no Senado.
De acordo com uma fonte que participou da negociação, a intenção do governo é usar o PIS/Cofins como um “colchão” para garantir a compensação à Petrobras para manter os reajustes apenas a cada 30 dias e evitar cortes maiores no Orçamento.
“Cálculos feitos pela Câmara foram equivocados e contaminaram o projeto. Há disposição de discutir o PIS/Cofins, mas em outro momento. Com um erro tão grosseiro tem dificuldade de prosperar”, afirmou Marun.
A discussão, coordenada pelo ministro da Casa Civil, Eliseu Padilha, começou às 14h, terminou depois das 21h e foi dura e cheia de idas e vindas. Uma fonte ouvida pela Reuters explica que as entidades chegaram pedindo 90 dias de congelamento nas tarifas e que 100 por cento das contratações de transporte da Conab fossem feitas para caminhoneiros autônomos, por exemplo. Ao longo da tarde, as exigências foram diminuindo.
O governo, no entanto, saiu do encontro com uma promessa de trégua, mas não a certeza de uma desmobilização. Três das entidades não assinaram o acordo -a Associação Brasileira de Caminhoneiros Autônomos (Abcam), a União Nacional dos Caminhoneiros (Unicam) e do sindicato dos caminhoneiros de Ijuí (RS).
“Assumimos o compromisso e vamos repassar ainda hoje a íntegra para toda a categoria. Mais é a categoria que vai decidir se foi suficiente ou não”, disse Diumar Bueno, presidente da Confederação Nacional dos Transportadores Autônomos.
A greve dos caminhoneiros, iniciada na segunda-feira com o bloqueios de rodovias por todo o país, paralisou diversos setores da economia, atingiu serviços e provocou o desabastecimento de postos de combustíveis em diversas cidades.
A fonte com quem a Reuters conversou, no entanto, minimizou a representatividade das três entidades e avaliou que o governo colocou os caminhoneiros “contra a parede”. “Espero que desmobilize nos próximos dias. Se não, o que acordamos também não tem que ser cumprido”, disse.
Nesta sexta-feira, o governo reúne ainda o Conselho Nacional de Política Fazendária (Confaz) para tratar do ICMS dos combustíveis. De acordo com o ministro da Fazenda, a intenção é que os Estados passem a usar um valor fixo para os combustíveis, como é feito com a Cide, e não um percentual.
“Vamos conversar com governos estaduais para tentar colocar uma base fixa na cobrança do ICMS. O ICMS é componente importante do diesel, representa 14 por cento”, disse Guardia.