Yago Travagini é economista e consultor de mercado pela Agrifatto
Stefan Podsclan é engenheiro agrícola e consultor de mercado pela Agrifatto
Jéssica Huescar é médica veterinária e trainee pela Agrifatto
Antônio Costa é estagiário pela Agrifatto
Laura Rezende é médica veterinária e consultora pela Agrifatto
Resumo da semana:
Em um mercado volátil e sem respostas sobre a volta das vendas de carne bovina para a China, a semana se encerra com as escalas de abate estáveis em 7 dias úteis. A produção da proteína vermelha se concentra atualmente no mercado doméstico com demanda retraída e dificuldade no escoamento, o que pressiona as cotações da carcaça casada no atacado e mercado físico do boi gordo, onde o animal foi vendido na média de R$ 270,03/@, recuando 3,86% no comparativo semanal
A desvalorização no preço pago pela caraça casada bovina chegou as proteínas substitutas e fez com que a cotação do suíno vivo recuasse. No estado de São Paulo, o animal fechou a última semana valendo R$ 7,34/kg, queda de 3,55% ante a sexta-feira retrasada. A tendência é que o mercado de suíno continue a sofrer pressão diante do aumento de oferta de carne bovina destinada ao mercado interno.
No mercado físico do milho os negócios ocorreram em ritmo lento durante a última semana, com a oferta se sobressaindo sobre a demanda. Em Campinas/SP, o cereal fechou o período a um preço médio de R$ 90,43/sc, recuando de 1,36% no comparativo semanal. A junção de desvalorização do dólar e dos preços pagos pelo milho nos EUA também colaborou para que a cotação do cereal no Brasil recuasse ao menor nível desde a última semana de junho/21.
A expectativa de déficit de oferta de petróleo nos próximos meses continua a pressionar as cotações do petróleo para cima. Com isso, o petróleo WTI encerrou a semana cotado a US$ 81,42/barril, valorizando 3,32% no comparativo semanal. O setor agrícola acompanha de perto as movimentações do petróleo e do gás natural, produtos com correlação e que afetam diretamente na precificação não só de combustíveis, mas também em diversos insumos utilizados para o plantio e desenvolvimento das lavouras/pastagens.
1. Na tela da B3
Chegamos ao fundo do poço?
Bem, começamos o texto assim pois o preço do boi gordo no mercado físico paulista deu sinais de que pode estar flertando com um valor que demonstra ser atrativo a comercialização de carne bovina no mercado interno.
A última sexta-feira se encerrou com o animal sendo negociado no mercado físico de São Paulo em média a R$ 266,80/@, recuando 1,64% em comparação a sexta-feira da semana retrasada. Apesar de continuar se desvalorizando, nota-se que a intensidade desta queda começou a diminuir, não à toa essa foi a menor desvalorização das últimas três semanas.
Mergulhada em volatilidade, as cotações dos vencimentos futuros de boi gordo na B3 continuaram oscilando fortemente durante a semana, com o out/21 chegando as mínimas de R$ 265,65/@ na sexta-feira. No entanto, com o físico dando sinais de que o mercado interno “aguentaria” o patamar de R$ 270,00/@, a sequência de três dias consecutivos de desvalorização foi interrompida e o vencimento out/21 fechou a sexta-feira com alta, cotado a R$ 270,70/@.
O mercado ainda aguarda algum posicionamento dos chineses, que ainda não definiram se irão aceitar ou não as cargas que estão chegando nos portos da China durante os últimos dias. A tendência é que obtenhamos uma resposta até o fim desta semana, seja ela positiva ou negativa. Considerando que poderemos ter uma pontuação negativa dos chineses, os preços dos vencimentos mais longos na B3 (novembro/21, dezembro/21 e janeiro/22) poderiam sofrer mais uma pressão negativa, já o outubro/21 não tanto, pois o atacado interno parece sustentar o atual patamar de R$ 270,00/@
Dois players seguem como destaque nas movimentações de contratos futuros de boi gordo na B3 nesta semana. Os Investidores Institucionais (Fundos) aumentaram sua posição comprada em 81%, assumindo o maior saldo comprado desde 19/03/2020 de 2,18 mil contratos, ao mesmo tempo em que as Pessoas Físicas inverteram a mão e estão com um saldo vendido de 1,05 mil contratos, o maior posicionamento vendido das PFs desde 14/05/2020.
Ainda que não haja “bola de cristal” no mercado, a movimentação dos fundos para uma posição comprada levanta indagações sobre o caminho do boi gordo na B3 nos próximos meses, afinal, esses mesmos fundos sustentaram uma posição vendida desde o dia 24/06/2021 e auferiram um lucro considerável com essa operação até inverterem a mão na semana retrasada. Vale ficar atento aos fundos!
Fonte: Agrifatto; B3;
1.1. O que o mercado futuro proporciona?
Diante da chegada a um patamar que nos parece “sustentável” para a comercialização de carne no mercado interno e que está promovendo a volta dos pequenos e médios frigoríficos as compras de carne bovina, visualizamos que há pouco espaço para que o boi gordo caia além dos R$ 270,00-265,00/@ atuais no vencimento outubro/21. Ou seja, a tais preços não há grande necessidade em travar os animais que vão morrer nos próximos 12 dias.
No entanto, a situação para os próximos dois meses continua em aberto e com a precificação na B3 indicando uma recuperação, acreditando na volta da China ao mercado ou até mesmo de que o mercado interno conseguiria absorver essa oferta que chegaria, melhorando assim as cotações.
O contrato para novembro/21 é negociado a R$ 280,10/@ enquanto que o dezembro/21 é comercializado próximo aos R$ 295,05/@, com um ágio de 3,47% e 9,00% frente os valores atuais de outubro/21.
Diante disso, o foco da comercialização e estancamento da “sangria” para aqueles que detêm animais em confinamento e ainda não os comercializaram deve ser nesses dois próximos meses, sendo feita através de compra de PUTs ou venda de futuros.
Considerando a possibilidade de que a China permaneça ausente do mercado até jan/22 (e não há posicionamento claro até o momento sobre o que irá acontecer, por isso consideramos essa possibilidade), a tendência é que as cotações para nov/21 e dez/21 sintam uma maior pressão negativa e recuem frente os patamares atuais.
Diante disto, uma estratégia interessante é basicamente a compra de PUT simples que protejam o valor mínimo de R$ 270,00/@, com um custo médio de R$ 3,25/@. Esse tipo de proteção se mostra interessante, pois com ela será possível surfar em uma possível valorização do boi gordo nos próximos meses, considerando a possibilidade da volta chinesa, ainda assim, caso a resposta da China seja negativa um mínimo estaria garantido.
Além disso, a venda de futuros para nov/21 e dez/21 é outra opção em que se estabelece o preço de comercialização dos animais a serem entregues nesses meses a R$ 280,10/@ e R$ 295,05/@, bem acima dos R$ 270,00/@ propostos na PUT simples. No entanto, essa operação não permitiria “surfar” em uma alta do boi gordo, caso a China retome as compras de carne bovina do Brasil nas próximas semanas. Cabe a ressalva de que essa operação poderia ser feita de forma “casada” com a compra de uma CALL (opção de compra), no entanto, com o atual nível de volatilidade empregado pelo mercado, essas estão a preços não muito interessantes.
Desta forma, visualizamos que há a possibilidade de concretizarmos um piso de preço do boi gordo no patamar entre R$ 260,00/@ e R$ 270,00/@ em São Paulo, no entanto, sem a volta a China isso poderia perdurar por meses, e as cotações para os próximos meses sentiriam essa saída.
2. Enquanto isso, no atacado…
No mercado atacadista de carne bovina, os principais produtos comercializados cederam às pressões e as cotações de todos os produtos com ossos passaram por reajustes negativos. A continua desvalorização do boi gordo derrubou os preços da carne bovina no atacado para baixo em questão de dias. As grandes indústrias ainda aguardam a retomada dos chineses às compras e, por causa disso, mantêm a estratégia de maior cautela na aquisição da matéria-prima. Com isso, a carcaça casada bovina encerrou a sexta-feira cotada em média a R$ 18,41/kg, desvalorizando -2,57% no comparativo semanal.
No mercado de frango em São Paulo, o volume dos negócios foi considerado normal. Apesar da expectativa de mercado aquecido, os preços se mantiveram estáveis, ainda com esperança de melhores movimentações de vendas. Portanto, as cotações de frango resfriado fecharam a semana em R$ 8,15/kg, sem modificações significativas no comparativo semanal.
O mercado da proteína suína segue na mesma toada. O volume de vendas foi considerado normal, com o mercado operando de modo estável, em equilíbrio entre oferta e demanda. Com isso, a carcaça especial suína fechou a sexta-feira cotada em R$ 10,34/kg, desvalorizando apenas -0,84% no comparativo semanal.
Com a movimentação de vendas do feriado prolongado no meio da semana e com as cotações dos principais cortes bovinos no atacado chegando aos patamares similares ao início do ano, o escoamento da proteína vermelha no mercado doméstico se mostrou favorável. Até que se escute novidades chinesas, a produção da proteína bovina se concentra basicamente para atender o mercado interno. E com as demais proteínas em patamares elevados, a tendência é que a carne bovina encontre sustentação próximo dos níveis atuais.
3. No mercado externo
As exportações de carne bovina, que já dava sinais de lentidão no início do mês, continuaram a perder forças. Durante os quatro dias úteis da semana passada 15,25 mil toneladas de proteína bovina foram embarcadas para fora do país, com isso a média diária parcial do mês de out/21 consolidou-se em 4,56 t/dia, 43,83% abaixo do mesmo período no ano passado e, caso finalize neste patamar, será o pior resultado desde maio/18.
O preço pago pela proteína bovina nos dias da última semana ficou em US$ 5,14 mil/t, recuando 3,71% frente os números da primeira semana e puxando a média mensal para baixo em 1,24%, estabelecendo-se em US$ 5,27 mil/t. Com isso, as vendas externas no período geraram uma receita de US$ 78,46 milhões, fazendo com que a média diária atingisse US$ 24,10 milhões, 11% inferior a semana retrasada.
Durante a última semana o volume de 213,54 mil toneladas de milho deixou os portos brasileiros, uma queda de 55,77% no comparativo semanal. Com o preço da tonelada avançando 4,27%, valendo US$ 210,10/ton, a receita obtida com as exportações do cereal no período foi de US$ 49,03 milhões e totaliza US$ 146,33 milhões até o momento do mês corrente, 17,53% de todo o montante arrecadado em outubro/20, quando o valor da tonelada era de US$166,80/ton.
Já as importações do cereal registraram 73,05 mil toneladas na 2ª semana de outubro/21, volume 64,74% inferior no comparativo semanal. Com valor de US$221,90/ton, o cereal importado no período teve um custo US$ 17,26 milhões, totalizando US$ 66,81 milhões na primeira quinzena de outubro/21, valor 267,10% superior ao registrado no total de out/2020.
Com uma média de 206,79 mil toneladas embarcadas diariamente, o volume de 626,70 mil ton de soja deixou os portos brasileiros na última semana, queda de de 56,52% no comparativo semanal. Durante a primeira quinzena de outubro/21, a quantidade de 2,06 milhões de toneladas foi para os países clientes do Brasil, tal quantidade equivalente a 85,37% de toda soja exportada em out/2020.
O preço médio da tonelada ficou em US$ 529,70, avanço semanal de 0,27%. Nos últimos 4 dias úteis, o faturamento obtido com as exportações da oleaginosa foi de US$ 334,0 milhões e com isso o mês já supera uma receita de US$ 1,0 bilhão com as vendas externas do produto.
4. A compra do pecuarista
O efeito China nas exportações de carne bovina vem afetando significativamente as relações de troca do boi gordo com ingredientes de nutrição animal. O valor médio da arroba do boi gordo para o mês corrente em São Paulo é de R$ 277,68/@ com desvalorização de 8,08% sobre o preço médio registrado no mês de setembro.
Para o milho, a saca em Campinas/SP se sustenta no patamar acima de R$ 90,00/sc no mercado físico, com preço médio no mês em R$ 91,30/sc e 1,24% abaixo do preço médio no mês anterior. Na B3 as indicações até março/22 estão no patamar de R$ 89,00/sc alinhado à paridade de importação e, a partir de maio/22 voltam a se alinhar ao mercado internacional. No curto prazo com a chegada de maiores volumes de milho importado, os preços devem indicar ligeiros recuos.
Fonte: Cepea; B3; Agrifatto;
O farelo de soja em Rio Verde/GO vem registrando ligeiro recuo de preço refletindo a menor demanda pelo derivado, uma vez que o preço da soja tem praticamente se sustentado. O preço médio mensal está em R$ 2.090,43/t, valor 1,8% abaixo do preço médio do mês anterior. Com a boa safra nos EUA, boas expectativas para a safra brasileira e demanda mais fria, é esperado que os preços recuem durante o final de 2021 e em 2022.
Fonte: Cepea; B3; Agrifatto;
5. O destaque da semana
O preço da carcaça casada no atacado passou por forte desvalorização durante as últimas semanas e atingiu os menores patamares em 2021. Até o momento, em out/21 a carcaça casada atinge o preço médio de R$ 18,93/kg, uma queda de 2,71% no comparativo mensal. Com isso, o equivalente físico (remontagem dos cortes do animal (dianteiro + traseiro + ponta de agulha) considerando os valores de venda no atacado) acumulou o quarto mês consecutivo de queda e está no menor valor desde fev/21, chegando à R$ 284,01/@.
No mesmo período o boi gordo saiu de R$ 299,34/@ em setembro/21 para R$ 278,60/@ durante a primeira quinzena de out/21, anotando uma desvalorização de 6,93%.
Devido à desvalorização do animal ter sido a passos mais largos, o spread entre o equivalente físico e a arroba do boi gordo atingiu uma relação positiva pela primeira vez em 2021. A relação, que atingiu as mínimas em março (-5,83%), chegou a +1,94% durante a primeira quinzena de outubro, um avanço de 4,43 p.p ante a média de set/21.
Fonte: Agrifatto
Apesar da queda da carcaça casada, a melhora desse spread menor sugere que a margem dos frigoríficos melhorou significativamente nos últimos dois meses. E diante dessa evolução, já escutamos relatos de frigoríficos pequenos e médios voltando aos poucos a abater bovinos, aumentando a competição pelos animais disponibilizados.
Ou seja, a atual precificação do boi gordo em São Paulo a R$ 270,00/@ se mostra atrativa para os frigoríficos que trabalham somente com o mercado interno e comercializam a carcaça casada em torno de R$ 17,50-18,00/kg, e, desta forma, observamos que a possibilidade de estarmos chegando ao “fundo” para o preço do boi gordo está cada vez mais próxima (se já não chegou!).
6. E o que está no radar?
A máxima que segue no radar da bovinocultura de corte brasileira continua a ser a volta chinesa as compras. As cargas embarcadas em set/21 estão sendo desembarcadas por lá, no entanto, o desembaraço alfandegário não está sendo efetivado, pois há o imbróglio sobre o que realmente é válido para a carne ser recebida: a data de certificação ser antes do dia 04/09 ou a data de embarque ser antes do dia 04/09?
E como os pátios dos portos estão se enchendo com os contêineres de proteína bovina brasileira, alguma resposta deve ser pontuada pelos chineses até o fim deste mês, seja para aceitar a proteína bovina que está lá ou seja para devolver a carne para o Brasil. A tendência é que tenhamos uma resposta nos próximos dias, já que o prazo de demurrage está vencendo.
Visualizando a movimentação do mercado interno, notamos que a carcaça casada bovina continua a sofrer pressão negativa, no entanto, mesmo com o patamar de R$ 17,50 -18,00/kg o preço atual pago pelo boi gordo está “fechando” a conta positivamente para a comercialização no mercado interno, o que pode demonstrar que há a possibilidade que o atual patamar de preço de R$ 265,00 -270,00/@ seja um possível “fundo” para o boi gordo em São Paulo.
A chegada da segunda quinzena do mês de out/21 aumenta o pessimismo sobre o consumo de carne bovina no mercado interno, no entanto, com as demais proteínas perdendo competitividade frente a carne bovina, visualizamos que não há um grande espaço para a desvalorização da carcaça casada bovina nas próximas semanas.