Yago Travagini é economista e consultor de mercado pela Agrifatto
Stefan Podsclan é engenheiro agrícola e consultor de mercado pela Agrifatto
Jéssica Huescar é médica veterinária e trainee pela Agrifatto
Antônio Costa é estagiário pela Agrifatto
Laura Rezende é médica veterinária e consultora pela Agrifatto
Resumo da semana:
Ainda sem respostas da China, o boi gordo continua a perder valor nas negociações do mercado físico, acumulando uma queda de aproximadamente 4,15% no mês de setembro/21 em comparação ao mês anterior e atingindo o menor valor mensal dos últimos sete meses. No estado de São Paulo, o animal fechou a semana passada com o valor médio de R$ 295,56/@, retraindo 1,44% no comparativo semanal e chegando a menor média semanal desde a terceira semana de janeiro/21. Com o mercado interno dando sinais de que não irá conseguir absorver plenamente a proteína que seria destinada a China, a tendência é que os preços do boi gordo continuem sofrendo pressão.
Em um momento de pouca pastagem disponível em grande parte do país e o mercado do boi gordo fragilizado, o preço do bezerro recuou e atingiu na última quinta-feira a mínima dos últimos 57 dias em Mato Grosso do Sul (R$ 2.774,58/cab). O animal foi encerrou a última semana cotado a R$ 2.785,93/cab, com uma desvalorização de 3,53% ante a sexta-feira retrasada. Cabe a ressalva de que os sinais de que o ciclo pecuário está “virando” estão cada vez mais intensos.
Após algumas semanas consecutivas de valorização, o preço da soja brasileira fechou a semana em queda. A movimentação negativa veio principalmente de Chicago, onde a oleaginosa recuou 2,92% no comparativo semanal, com a confirmação do USDA que números de estoques trimestrais dos EUA estão mais “confortáveis” do que o previsto inicialmente. Desta forma, a soja brasileira fechou a semana com desvalorização de 1,60% em relação a sexta-feira retrasada, cotada a R$ 170,95/sc.
Marcada por mais uma semana de alta volatilidade, o dólar encerrou a sexta-feira com alta de 0,37% no comparativo semanal, cotado a R$ 5,36. Durante a semana a divisa norte-americana chegou a ser negociada próximo dos R$ 5,50, no entanto, com a movimentação do DXY para baixo na sexta-feira e a possibilidade crescente de maiores intervenções do Banco Central fez os fundos e operadores aumentarem a posição vendida, trazendo o dólar para o patamar abaixo dos R$ 5,40.
1. Na tela da B3
Como se fosse um disco “arranhado”, mais uma semana se encerrou com os preços do boi gordo sofrendo pressão na B3 por conta da indefinição da China sobre a volta (ou não) as compras de carne bovina brasileira.
Desta forma, o contrato com maior liquidez na B3 (outubro/21) fechou a semana recuando 5,61% no comparativo semanal, cotado a R$ 283,50/@, o menor valor desde janeiro/21.
Grande parte desta movimentação é justificada pela falta de apetite dos frigoríficos diante da incerteza chinesa. A apreensão dos frigoríficos é que a carne bovina que fora certificada anteriormente ao dia 04/09/2021 já foi praticamente toda embarcada durante o mês de setembro/21, não à toa tivemos o melhor resultado da história para as exportações de carne bovina in natura.
No entanto, a última semana do mês começou a demonstrar os reflexos da “saída” chinesa, a média diária que até o dia 17/09/2021 era de 10,87 mil t/dia recuou para 6,27 mil t/dia durante o intervalo de 20/09/2021 a 30/09/2021, caindo 42,3%. Demonstrando o que pode ser a “falta” de proteína com certificação para a China nos portos. Ou seja, ainda que os números de setembro/21 tenham sido excelentes, o mercado olha para o que deve acontecer agora em outubro/21 e as previsões (sem a volta da China) não são nada otimistas.
As negociações na B3 sempre ocorrem com a visão para “frente”, logo, mesmo com a confirmação de que tivemos um excelente mês de setembro/21 para as exportações, o mercado nem se movimentou em busca da alta. Pois a percepção é de que sem a China, estamos falando em escoar de 60 a 90 mil toneladas para um mercado interno que já não aguenta o volume atual que está sendo escoado.
Desta forma, vemos que não há aumento de exposição significativa por parte de nenhum dos players operadores de futuros de boi gordo na B3 neste momento, justificado justamente por esta falta de clareza sobre quando a China pretende retomar as compras da proteína bovina brasileira.
Fonte: Agrifatto; B3;
1.1 O que o mercado futuro proporciona?
Conforme fora ressaltado na última semana, sem um posicionamento chinês o mercado iria sofrer com alta volatilidade diante de uma possibilidade crescente de excesso de oferta de proteína bovina no mercado interno.
A dificuldade do mercado interno em repassar a atual quantidade de proteína bovina disponibilizada pelos frigoríficos é tão grande, que o preço pago pela carcaça casada atingiu o menor patamar dos último quatro meses.
Caso a China não volte, teríamos duas opções: os frigoríficos continuarem abatendo e redirecionarem algo entre 50 a 100 mil toneladas para o mercado interno (que já está depressivo) ou então o que já está ocorrendo por agora, frigoríficos dando férias coletivas ou saindo das compras pois não há necessidade de continuar abatendo grandes volumes visto que a demanda pela proteína bovina brasileira foi cortada em torno de 15%.
Diante disso, encaramos o cenário de maneira conservadora de curto prazo. Para aqueles que tem animais para entregar dentro dos próximos 60 dias, a trava deve ser estabelecida para evitar uma maior “sangria” da já espremida margem.
As opções de venda (PUTs) continuam como uma alternativa, no entanto, com a atual precificação desses contratos strikes com valores atrativos de compras só são vistos a partir dos R$ 275,00/@ para outubro e novembro/21, com um custo médio de R$ 2,97/@. Uma PUT SPREAD pode ser lançada no mesmo patamar de proteção em conjunto com a venda de uma PUT de R$ 260,00/@, tal operação imprimiria um custo de R$ 2,43/@, e, considerando o custo da PUT simples não faz tanto sentido optar pela PUT SPREAD neste cenário.
Outra operação que tem o mesmo sentido de proteger a margem é a venda de futuros para outubro/21 e novembro/21 no patamar atual de R$ 281,30/@ e R$ 285,80/@. Ainda que visualizamos que a B3 possa estar “exagerando” nesta movimentação negativa, a ausência chinesa do mercado por mais 30 dias pode ser catastrófica aos preços do boi gordo neste curto prazo. Logo, como já reafirmado anteriormente: “cautela e canja de galinha nunca fizeram mal a ninguém”, desta forma a venda de futuros para esses meses se justifica no sentido de proteger seus animais contra uma desvalorização ainda maior.
2. Enquanto isso, no atacado…
No mercado atacadista de São Paulo, independente da chegada do recebimento da massa salarial na primeira semana de outubro/21, o mercado continua demonstrando não possuir força para absorver o volume de carcaça bovina disponibilizado pelos frigoríficos. A contínua desvalorização da arroba resultou em reajustes nos preços da maioria dos cortes bovinos comercializados, cedendo então à pressão dos varejistas. Com isso, a carcaça casada bovina encerrou a sexta-feira cotada em média de R$ 19,11/kg, desvalorizando -1,16% no comparativo semanal.
No mercado de frango resfriado em São Paulo, o movimento registrado foi considerado baixo na última semana de setembro/21, mostrando dificuldade de escoamento e com sobra de mercadorias. Com a oferta maior que a demanda, os atacadistas e varejistas mantiveram-se cautelosos. Neste cenário, as cotações de frango resfriado fecharam a semana em R$ 8,11/kg, com desvalorização de -1,99% no comparativo semanal.
Já no mercado da proteína suína, as vendas no atacado e varejo de São Paulo foram consideradas normais e estáveis durante o decorrer da semana. As ofertas ainda seguem ajustadas com a demanda do mercado consumidor interno e com o escoamento de mercadorias nas prateleiras considerado bom. Com isso, a carcaça especial suína fechou a sexta-feira cotada em R$ 10,45/kg, com valorização de 0,96% no comparativo semanal.
De modo geral, os olhos estão voltados para a retomada de comercialização da proteína bovina para o gigante asiático. Sem a China, a entrada de outubro/21 não traz grandes expectativas para melhora no preço da proteína bovina, mesmo com o recebimento dos salários e retomada dos serviços de bares e restaurantes, afinal são cerca de 70 a 100 mil toneladas destinadas ao mercado chinês que não conseguiriam ser absorvidas no mesmo preço pelo mercado interno brasileiro.
3. No mercado externo
Apesar do recuo no volume dos embarques nos últimos nove dias úteis do mês, setembro/21 se encerrou com mais um volume recorde nas exportações de carne bovina in natura. Os envios aos portos do período final de setembro/21 ficaram em 6,28 mil t/dia, uma queda de 42,29% frente a média diária que estava se consolidando até o dia 17/09. Ainda assim, foram 187,02 mil toneladas embarcadas para fora do país no último mês, 31,38% a mais do que no mesmo período de 2020.
Com o preço médio da carne bovina também estabelecendo um novo recorde, vendida em média à US$ 5,79 mil/t, a receita obtida com a venda de proteína bovina atingiu novo recorde. Foram mais de US$ 1,08 bilhão no mês passado, com o preço 41,37% maior que no mesmo período do ano passado, o avanço da receita sobre setembro/20 foi de 85,73%, quase dobrando o resultado.
Cabe a ressalva de que exportamos um grande volume de carne bovina in natura mesmo diante da interrupção das certificações para a China desde o dia 04/09. O que ocorreu foi uma celeridade em envio de proteína que estava certificada anteriormente a essa data. A desaceleração das exportações deve aparecer nos números de outubro/21, já que como vimos nos últimos nove dias de setembro/21, a média diária embarcada recuou 40% frente os dias iniciais do mês.
As exportações de milho encerraram setembro/21 com uma média diária de embarques em 135,96 ton, 31,23% de queda no comparativo mensal. As vendas externas totalizaram 2,85 milhões de toneladas, o equivalente a 65,81% do volume embarcado no mês de agosto e 44,81% do mesmo período em 2020. O preço médio pago pelo produto ficou na casa dos US$ 188,1/ton, resultando num faturamento de US$ 536,94 milhões, receita 48,30% inferior que setembro/20.
Já as importações do cereal avançaram 179,57% frente ao mês passado e registraram o recorde 407,37 mil toneladas em setembro para o ano de 2021. A média diária dos desembarques nos portos brasileiros ficou em 19,39 mil ton/dia, 176,5% de avanço quando comparado a mesma ocasião em 2020.
As exportações da soja registraram volume recorde para o mês setembro com 4,83 milhões de toneladas, volume 13,43% superior ao volume de setembro/20. Apesar do bom desempenho de 230,157 mil ton/dia, o recuo foi de 22,10% sobre o mês de agosto.
O preço médio da oleaginosa ficou em US$ 508,8/ton, 4,74% de alta no comparativo mensal. Com uma receita das vendas diárias em US$ 117,10 mil, setembro/21 consolidou um montante de US$ 2,45 milhões, 57,95% a mais que a mesma ocasião no ano passado.
4. A compra do pecuarista
Na última semana do mês o preço do cereal foi de estabilidade para o mercado do cereal que encerrou o mês com preço médio de R$ 92,67/sc em Campinas/SP, redução de 6,05% sobre o preço médio do mês anterior. A não retomada das exportações para a China trouxe redução de 4,15% ao preço médio da @ do boi gordo no comparativo mensal, valendo R$ 302,07/@ em São Paulo.
No curto prazo há uma expectativa de recuo para os preços do milho disponível que pode chegar ao patamar de R$ 85,00/sc entre os meses de outubro e novembro, a partir desse período as ofertas tendem a diminuir trazendo um tensionamento de preços e voltando ao patamar próximo de R$ 95,00/sc a partir de janeiro/22 até a entrada do milho 1ª safra a partir de março.
O fator La Niña vai ser decisivo para o comportamento dos preços no 1º quadrimestre de 2022.
Até o momento as expectativas para a produção de milho 1ª safra são positivas, mas qualquer irregularidade nas chuvas durante os próximos meses vai trazer apreensão para a oferta do cereal e trazer sustentação para os preços até a entrada do milho 2ª safra a partir de maio/22.
Fonte: Agrifatto;
O farelo de soja em Rio Verde/GO encerrou o mês de setembro com preço médio de R$ 2.127,85/t, valorizado em 1,4% sobre o mês anterior refletindo os preços da soja no mercado doméstico e combinado à desvalorização do boi gordo, a relação de troca encerrou o mês 2,84 toneladas por boi gordo de 20@. Para a temporada 21/22 são esperados preços mais baixos devido à safra de soja que se desenha no Brasil, embora tenha-se o risco climático do La Niña para a região Sul e Sudeste, não há forte apreensão do mercado internacional quanto à safra no Brasil e Argentina.
Fonte: Agrifatto;
5. O destaque da semana
Após flertar com as máximas históricas durante o primeiro semestre de 2021, o mercado de reposição vai demonstrando que está “fadigado”. Isso por que o preço do bezerro em São Paulo fechou o mês de setembro/21 no menor valor dos últimos oito meses e em uma trajetória contínua de desvalorização. E a problemática envolvendo a EEB não-transmissível não nos parece a única justificativa para essa queda.
Ao que parece a oferta de bezerros no mercado já começa a crescer (ainda de maneira tímida), já que a cotação do animal se desvalorizou mesmo em um período em que a sazonalidade anual aponta para alta. O bezerro fechou o mês de setembro/21 cotado à R$ 2.700/cabeça, recuando 5,91% no comparativo mensal. E como o boi gordo recuou “apenas” 4,15% no mesmo comparativo, o ágio do bezerro sobre o boi gordo chegou ao menor patamar desde janeiro/21.
Ainda que esteja acima da média histórica (32%), nota-se que a trajetória do ágio do bezerro aponta para baixo, o que pode ser um dos indicativos iniciais de saída de um processo de retenção para descarte de fêmeas.
Fonte: Agrifatto;
Apesar da sazonalidade anual dos preços da reposição indicar uma melhora no último trimestre do ano com a chegada das chuvas e a maior capacidade de “segurar” as negociações, ainda assim, a trajetória atual não favorece muito esta movimentação. E com os bezerros que nasceram no início da temporada 20/21, período de maior retenção de fêmeas dos últimos anos, chegando ao mercado neste início de 2022, a tendência é que visualizemos um mercado de reposição cada vez mais pressionado.
Diante disso, a tendência natural é que o ágio volte para os padrões de 30 a 32% nos próximos meses, influenciado inicialmente por uma desvalorização do bezerro. Para aqueles que necessitam recompor estoques nos próximos meses, um bom cenário de compra está surgindo no mercado.