Com o persistente encarecimento dos custos de produção, em especial soja e milho, utilizados para ração animal, produtores de carne de frango têm tirado o pé do acelerador. A estratégia é reduzir o alojamento de aves para garantir às granjas um fôlego nas margens, que se encontram negativas, já que o preço pago pelo frango não compensa os gastos com alimentação. Tal conjuntura deve levar a Associação Brasileira de Proteína Animal (ABPA) a revisar para baixo a projeção de crescimento neste ano de 3,3% a 5,5% na produção de proteína avícola, informa ao Broadcast Agro o presidente da entidade, Ricardo Santin.
“O patamar de custos ficou mais alto do que a gente previa e a retomada econômica nesses primeiros meses foi abaixo da nossa expectativa. Ainda assim, não estamos falando em queda na produção ante o ano passado, mas de uma desaceleração do crescimento”, disse.
Para driblar os custos, as empresas têm tomado algumas medidas, como a redução nos alojamentos de pintinhos de corte, o abate de matrizes mais velhas e o encurtamento da idade média de frangos abatidos. “Aqui no Rio Grande do Sul temos escutado cooperativas afirmando que vão reduzir o alojamento em 30%, outras falam em 10% a 15%”, diz Santin. Segundo ele, neste momento cada uma se ajusta de acordo com o seu perfil de produto. Se a empresa tem o mercado doméstico como foco, precisa agir de forma mais assertiva, mas, se é exportadora, consegue segurar por mais tempo porque o efeito cambial ajuda a amenizar parte do aumento de custos.
Na visão de Santin, os meses mais apertados serão abril e maio, enquanto não entram no mercado os lotes do milho safrinha. Em julho, o presidente da ABPA já espera um alívio nos custos e maior retomada no consumo doméstico. “A demanda do mercado interno se desacelerou, mas continua forte, principalmente por causa do movimento de substituição no consumo de proteínas iniciado com a pandemia do coronavírus”, lembra. E é essa vantagem competitiva da carne de frango frente às concorrentes, além do fluxo de exportações, que limita quedas expressivas na produção.
Até a chegada do milho safrinha ao mercado, entretanto, uma alta nos preços da carne de frango seria bem-vinda, destaca o diretor-presidente da Fundação Apinco de Ciências Avícolas (Facta), Ariel Mendes. No Paraná, ele tem observado uma situação mais confortável, já que as cooperativas da região ainda têm milho para negociar. Em Santa Catarina e no Rio Grande do Sul, por outro lado, a oferta é limitada e há maior necessidade de ajustes de produção. “A redução varia muito de empresa para empresa, mas não pode ser muito maior do que 20% por causa dos custos fixos e da equipe ociosa”, disse Mendes. Segundo ele, algumas empresas que compram pintos de corte estão tendo prejuízo de R$ 1 por quilo de frango produzido, enquanto as que produzem o próprio pintinho registram prejuízo de R$ 0,80 por quilo.
Dados da Apinco mostram que o País saiu de 51 milhões de matrizes alojadas em 2019 para 55,3 milhões em 2020, o que equivale a uma capacidade de produção de 600 milhões de pintinhos por mês. Esse volume até chegou a ser atingido em dezembro do ano passado, quando o número de cabeças produzidas foi de 617,6 milhões, alta de 9,63% em relação a dezembro de 2019. Mas, de lá para cá, a alta se desacelerou. Em janeiro deste ano, a produção foi 2,91% maior do que em igual mês do ano passado, a 590,6 milhões de pintinhos, enquanto em fevereiro o aumento anual foi de apenas 0,61%, a 537,5 milhões de cabeças.
Mendes destaca que a melhor estratégia é a de fazer compras antecipadas, mas o setor agroindustrial enfrenta um gargalo de armazenagem, que impede compras de volumes expressivos de milho. “O governo investiu muito nisso para as fazendas, mas não englobou empresas e cooperativas, que precisam de novas linhas de crédito para essa finalidade.”
Nesse início de ano, poucas são as indústrias que ainda possuem estoques de grãos feitos a preços mais baixos, aponta o especialista da Consultoria Agro do Itaú BBA, Cesar de Castro Alves. Ele lembra que no ano passado o aumento de custos já estava começando a apertar, mas muitas plantas tinham comprado o cereal antecipadamente e conseguiram manter a atividade sem grandes problemas. Nas granjas, ele estima que o spread (diferença entre custo de produção e o preço pago pela ave) esteja negativo, próximo de 9%, e, por isso, seria necessário um ajuste de cerca de 10% nos preços da carne para deixar a operação mais saudável.
Ele afirma acreditar que há espaço para essa valorização da carne de frango porque a oferta está caindo e o frango continua atraindo mais consumo do que outras proteínas. Ao mesmo tempo as exportações estão crescendo e os custos de produção não vão arrefecer no curto prazo. “A gente acha que até pode ter um fôlego no segundo semestre, mas, se isso acontecer, será bem pequeno. Vale lembrar que o milho está caro lá fora também e que o balanço global está apertado, sem espaço para eventuais problemas climáticos”, disse. “É importante que o setor avícola reduza um pouco a produção para ajudar nessa alta necessária dos preços”, concluiu.
Efeitos alcançam grandes indústrias
Outro especialista que acompanha o setor de proteína animal e que não quis se identificar diz que empresas maiores, como BRF e a Seara, subsidiária da JBS, não ficam de fora da conjuntura. No primeiro caso, o analista comenta que os efeitos do aumento de custos ainda não devem ser notados nos resultados do primeiro trimestre. “A BRF encerrou 2020 mais estocada do que historicamente a empresa costuma estar no fim do ano. Por isso, a pressão mais relevante vai aparecer a partir do segundo trimestre, quando ela já vai ter consumido, na nossa estimativa, esse estoque mais barato de grãos e precisará repor a preços mais altos.”
Outro fator que ajuda a BRF é o mix de produtos de maior valor agregado, uma vez que menos de 20% da receita obtida pela empresa no mercado doméstico é proveniente de carne in natura, lembra ele. “Várias categorias da empresa surfaram na onda da pandemia, com o aumento no consumo de produtos industrializados.”
Por outro lado, a Seara parecia estar menos estocada em grãos do que a BRF, conforme o especialista, que prevê um impacto negativo maior no primeiro trimestre deste ano. Quando falamos de JBS, contudo, esse efeito é pequeno, dada a magnitude da empresa e o momento favorável para as operações internacionais. (AE)