(Reuters) – A agência de classificação de risco Standard & Poor’s rebaixou nesta quinta-feira a nota de crédito da dívida soberana do Brasil para BB-, ante BB, em função da demora na aprovação de medidas para reequilibrar as contas públicas e de incertezas devido às eleições deste ano.
“Apesar de vários avanços em políticas pela administração Temer, o Brasil fez um progresso mais lento que o esperado na implementação de legislação significativa para corrigir no tempo adequado uma deficiência fiscal estrutural e crescimento dos níveis de dívida”, diz a S&P em seu comunicado.
Ao mesmo tempo, a perspectiva para o rating brasileiro foi elevada para estável, ante negativa, informou a agência.
“Isto já estava no horizonte como uma possibilidade, em virtude do processo de votação da Previdência. Creio ser um alerta sobre as consequências econômicas e sociais que a não aprovação da Previdência trará”, disse o secretário-geral da Presidência, Moreira Franco.
A equipe econômica vai acompanhar os mercados nos próximos dias, para avaliar os impactos da decisão da S&P na economia, mas o downgrade pode ajudar o governo a obter mais votos de deputados para aprovar a reforma, avaliou uma fonte que integra o time econômico.
O rebaixamento deve ser uma decisão isolada e o governo não espera que outras agências de classificação de risco sigam o caminho, disse a mesma fonte, ressaltando que apenas a S&P condicionava mudanças no rating à aprovação da Previdência.
Uma segunda fonte da equipe econômica, por outro lado, lembrou que a investida da agência também é uma resposta ao difícil trâmite das medidas fiscais fora do Executivo, em referência às medidas para o Orçamento de 2018 que foram enviadas para o Congresso e não analisadas pelos parlamentares, além da interpretação do Judiciário que suspendeu o adiamento do reajuste dos salários de servidores.
“Talvez ajude a acelerar e a conscientizar. Mas acho que vai demorar pra cair (a ficha) para o não-Executivo. Ações como hoje sobre a MP da Eletrobras geram muita desconfiança”, disse a fonte, referindo-se à decisão da Justiça Federal de Pernambuco que vetou pontos da medida provisória que define regras para privatização da estatal.
Em nota, o Ministério da Fazenda reforçou o compromisso com a consolidadação fiscal e com aprovação de medidas, como a reforma da Previdência. E ressaltou que a própria S&P vê “cenários que podem levar a uma eventual reversão” do rebaixamento, como a retomada do crescimento econômico em função das medidas macro e microeconômicas já adotadas e aprovação das reformas. [nE6N1O401C]
Mas a S&P lembrou em seu comunicado que pequenas melhorias na economia e uma dívida externa baixa podem limitar ainda mais a pressão política para que o governo brasileiro aja sobre deficiências fiscais no curto prazo.
REFORMA DA PREVIDÊNCIA
O rebaixamento da nota brasileira era esperado desde o ano passado, depois que o governo não conseguiu votar a reforma da Previdência em primeiro turno na Câmara dos Deputados como pretendia, em dezembro. A votação foi postergada para 19 de fevereiro, levando analistas a reduzirem as apostas na aprovação do texto, diante do cenário eleitoral deste ano.
Em entrevista à Reuters, o chefe de ratings soberanos da S&P, Moritz Kraemer, disse no início de dezembro que o adiamento da votação da reforma da Previdência para fevereiro já seria suficiente para a decisão da agência. [nL1N1O615C]
Além da mudança nas regras de pagamento de aposentadorias, também pesou na avaliação da S&P o fracasso do governo em aprovar no Congresso medidas para cumprir o déficit primário de 159 bilhões de reais deste ano. As medidas somam 21,4 bilhões de reais.
O Congresso aprovou o Orçamento deixando de lado mudanças na tributação de fundos fechados, reoneração da folha de pagamento de alguns setores industriais, o adiamento do reajuste do funcionalismo e a elevação da contribuição previdenciária dos servidores públicos.
MERCADOS
A expectativa que já existia sobre o downgrade deve limitar o impacto do corte da nota nos mercados, uma vez que movimentos mais fortes nos ativos ocorrem quando o país muda de patamar, como a perda do grau de investimento em setembro de 2015, disse o economista-chefe do Banco Fator, José Francisco de Lima Gonçalves.
“O que tem para acompanhar é se isso (rebaixamento) vai funcionar como um incentivo para aprovar a Previdência ou se será um ‘agora deixa pra lá’. Acho que não é um incentivo”, afirmou Gonçalves.
“O mercado deve azedar um pouco no curto prazo, ainda tem gente que se emociona com esses rebaixamentos.”
A ênfase da S&P às incertezas relacionadas com as eleições presidenciais deste ano mostram que o país precisa de continuidade e governabilidade, avaliou Alberto Ramos, diretor de pesquisas da América Latina do Goldman Sachs.
“Temos bons formuladores de políticas no momento, mas eles não conseguiram implementar a maior parte da consolidação fiscal”, disse.
No fim do ano passado, os mercados financeiros se posicionaram para o rebaixamento da nota brasileira e nos últimos dias os investidores respiravam mais aliviados, o que levou juros futuros e dólar a caírem no início deste ano.
Ainda em 2017, depois da definição da data de votação da reforma da Previdência, o ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, fez reuniões com as agência de classificação de risco para tentar evitar o rebaixamento.