Yago Travagini é economista e consultor de mercado pela Agrifatto
Caroline Matos é zootecnista e trainee pela Agrifatto

 

Resumo da semana:

 

Mesmo em volta de um ambiente instável e especulativo, o boi gordo atravessou mais uma semana com forte valorização, saindo do patamar dos R$ 280,59/@ na semana retrasada para um valor médio de R$ 290,09/@, uma alta de 3,39%, sendo esta a maior variação positiva semanal das últimas 50 semanas. A forte agitação pela qual o mercado passou nos últimos dias, começou na quarta-feira com os grandes frigoríficos saindo das compras em grande parte do país, em uma tentativa de frear o movimento de valorização pelo qual o boi gordo vem passando. O número de negócios se reduziu fortemente, e, na volta as compras que ocorreu parcialmente na sexta-feira, os preços ofertados no balcão apresentaram uma grande redução. No entanto, como podemos visualizar pelos indicadores de negócios realizados, o preço se manteve firme na sua alta e buscou os R$ 290,00/@ em São Paulo.
A escassez de oferta tem penalizado o consumidor brasileiro, isso por que as proteínas animais no atacado continuaram o movimento de valorização. Nesta semana, quem capitaneou as altas foi o frango resfriado, que variou positivamente 4,30% no comparativo semanal, ultrapassando os R$ 6,00/kg, ficando cotado nos R$ 6,15/kg. Após ficar para “trás” em relação as outras proteínas, o frango resfriado se sustenta na forte valorização das outras proteínas para conseguir melhores cotações. Além disso, o período atual favorece o aquecimento do consumo de proteínas (preparativos dos atacadistas para o fim do ano), com isso, as cotações das proteínas seguem sustentadas.
Outro fato a ser destacado nesta semana foi a movimentação da soja e do milho nos EUA nesta semana. Isso por que após a divulgação do novo relatório de oferta e demanda do USDA, as cotações dessas registraram uma forte alta, já que os números de produção e estoques finais das duas culturas vieram abaixo do esperado pelo mercado, colocando os estoques finais nas mínimas das últimas sete safras. Com isso, o preço da soja em Chicago registrou uma valorização de 4,20% na semana, batendo os US$ 11,48/bu no vencimento para mar/21, o maior valor dos últimos quatro anos. Tal movimentação teve pouco efeito nos negócios físicos no Brasil, já que quase não há oleaginosa disponível no país e com isso os preços continuaram rondando a casa dos R$ 170,00/sc em todo o país.

 

1. Na tela da B3

 

Se o físico aguentou o movimento especulativo e instável nos negócios, o mesmo não pode ser dito do mercado futuro. Após os frigoríficos saírem das compras na quarta-feira, o vencimento para dezembro/20 chegou a cair R$ 17,00/@,
saindo dos R$ 287,00 e batendo nos R$ 270,00/@. E, apesar da recuperação, os vencimentos futuros fecharam em queda no comparativo semanal. O contrato para dezembro/20 registrou queda de 2,13%, encerrando a sexta-feira cotado à R$ 285,40/@. Já o vencimento para maio/21, terminou a semana cotado à R$ 263,10/@, desvalorizando 4,33% no comparativo semanal.
Apesar da intensa volatilidade do mercado futuro, o número de contratos em abertos registrou um aumento de 13% no comparativo semanal, saindo de 70,00 mil na semana retrasada para 79,43 mil na última semana. Tal aumento veio exclusivamente das opções, que registraram um aumento de 9,68 mil no total de contratos em aberto, atingindo os 61,50 mil contratos. Sendo que as PUTs respondem por 100% desse aumento. Ou seja, mesmo com a alta precificação por conta da volatilidade, os players do mercado decidiram fechar 10,85 mil opções de venda.

 

 

Na participação dos players, duas movimentações se destacaram nesta semana. Primeiramente, as PJ não-financeiras voltaram a se posicionar do lado “comprado”, com um saldo de 3,15 mil contratos “comprados” em aberto. Tal movimentação foi feita através de uma diminuição de exposição em venda de futuros e também com uma venda de pouco mais de 8 mil PUTs. Desta forma, as PJs não financeiras (frigoríficos), voltaram a apostar suas fichas em uma possível alta.
Do outro lado da ponta, a movimentação dos Investidores Institucionais continua a nos intrigar, isso por que eles aumentaram sua posição vendida em mais de 3,78 mil contratos, chegando a um saldo de 9,95 mil contratos vendidos. Este é o maior posicionamento vendido de um player em 2020. Como grande parte dessa posição foi feita com opções, a pergunta que fica é: Os grandes fundos estão enxergando uma queda de preço mais profunda do que o mercado enxerga para o próximo ano?

 

 

1.1 O que o mercado futuro proporciona?

 

A instabilidade que ressaltamos também cobrou seu preço sobre a volatidade e precificação das opções. Com o preço chegando a variar R$ 17,00/@ em um dia, aqueles que buscaram PUTs nos últimos dias se depararam com altos custos de proteção.
Se há uma semana atrás falávamos de PUTs para dezembro/20 que protegiam os R$ 280,00/@ custando em torno de R$ 3,60/@ (1,30% do valor protegido), nessa semana com o aumento da volatidade e a queda nas cotações, para se proteger o mesmo valor, o custo é de R$ 5,21/@ (1,86% do valor protegido). O mercado encareceu, no entanto, ainda acreditamos ser interessante a proteção de curto prazo via opções. Já é possível proteger o valor de R$ 250,00/@ para janeiro/21 com o custo de R$ 1,96/@. No entanto, para vencimentos mais longos, visualizamos as opções “puras” com um custo muito elevado.
A PUT sintética volta ao radar sendo uma estratégia atraente, especialmente se realizada em ajuste com a venda de animais a termo, visto que pode melhorar o preço mínimo se comparada à PUT simples sem incorrer na incidência de ajustes até que o mercado bata o strike da CALL. Uma boa operação a se analisar no atual momento.
Os futuros se mostram como uma opção atrativa para quem buscar travar preços para o segundo trimestre de 2021. Visualizamos que ainda há espaço nas próximas semanas para que os preços para os contratos mais longos (maio/21) registrem altas e abram janelas de comercialização para aqueles que necessitam fazer vendas, obviamente que se deve ficar atento se os valores que forem atingidos nesse intervalo de tempo atendem a margem de lucro esperada do negócio. Além disso, ressaltamos o cuidado com os ajustes diários que podem ocorrer devido ao grande intervalo de tempo até o fim do contrato.
O mercado a termo continua frio, com poucos negócios sendo realizados em todo o país.

 

2. Enquanto isso, no atacado…

 

Apesar das oscilações positivas durante a semana, a carcaça casada bovina fechou a sexta-feira cotada a R$ 18,30/kg, alta pontual de R$ 0,10/@, ou seja, 0,55% na comparação semanal. A menor comercialização e cautela dos compradores barraram altas mais expressivas. A atenção voltada pela entrada da segunda quinzena reflete na movimentação do mercado atacadista, visto que as margens apertadas e a menor comercialização durante esse período deixam a ponta compradora com o “pé no freio”.
Enquanto isso, o dianteiro e a ponta de agulha demonstraram bom desempenho e chegaram a receber reajuste positivo de R$ 0,50, ficando ambas cotadas em R$ 16,50/kg. Já o traseiro, depois de semanas avançando, recuou 3,57% na comparação semanal, sendo negociado a R$ 20,25/kg.
Para o frango, o cenário é positivo e segue com os preços valorizados. As indicações do frango resfriado ultrapassaram os R$ 6,00/kg, encerrando a semana cotado a R$ 6,21/kg, alta semanal de 5,25%. Na comparação a valorização ainda é maior, ficando em torno de 8,38%.
As altas da carcaça especial suína foram mais tímidas, com avanço pontual de 0,65%, sendo negociada a R$ 13,90/kg. Já ante o mesmo período do mês anterior, os avanços chegam a 15,84%. Apesar de uma semana um pouco mais fria, a tendência continua de alta com as exportações demandando e oferta limitada.
No mercado de ovos, a sexta-feira encerrou com estabilidade dos preços, balizados em R$ 104,00 a caixa com 30 dúzias. Sem grandes novidades, os produtos lidam com as margens apertadas e procuram aumentar a produção para compensar no volume comercializado.

 

3. No mercado externo 

 

Após uma primeira semana excepcional, com uma média diária de exportação de carne bovina que rompia as 10,5 mil toneladas, os embarques de proteína bovina sentiram levemente um recuo durante a última semana. A média diária recuou 8%, saindo das 10,50 mil toneladas/dia para 9,66 mil toneladas/dia. Ainda assim, a possibilidade de que o recorde histórico das exportações de carne bovina (170,55 mil toneladas) seja batido é cada vez maior, com a média diária podendo recuar mais de 5% e ainda assim rompermos tal número.
A receita com os envios de proteína bovina seguiu um caminho parecido com o volume, já que praticamente não houve alterações do preço médio comercializado, com a tonelada saindo em média por US$ 4.391. Desta forma, o total obtido com as vendas de carne bovina atingiram US$ 382,00 milhões, com uma média diária de US$ 42,44 milhões, 23% a frente do que fora registrado em todo o mês de outubro/20.
Com pouco mais de 1,11 milhão de toneladas exportadas durante a última semana, o total embarcado de milho chegou a 2,27 milhões no acumulado até o dia 13/11/2020. Com isso a média diária estabeleceu-se em 252,34 mil toneladas, 13% pior do que era a média da 1ª semana do mês e 2% abaixo da média do mês de outubro/20. Com o fluxo de exportação de milho ainda intensificado, a expectativa é de que 5 milhões de toneladas de cereal sejam exportadas em novembro/20.
A receita obtida com a venda de milho segue acima do que foi em outubro/20 graças aos preços internacionais. Isso por que a receita média diária obtida ainda está 6% acima do que foi em outubro/20, chegando aos US$ 45,81 milhões, o resultado levemente melhor que no mês passado se dá graças a melhora dos preços de venda do cereal, que avançaram 9% nesses 15 primeiros dias de novembro/20 e chegaram ao valor médio de US$ 181,5/t.
Com a intensa migração de demanda para os EUA, graças a colheita finalizada no país norte-americano, as exportações de soja sofreram uma forte queda na 2ª semana de novembro/20. A média diária embarcada para fora do país caiu 48% no comparativo semanal, saindo de 201,47 mil toneladas/dia na semana retrasada para 103,89 mil toneladas/dia na última semana. Com isso, a possibilidade de que não se rompa o patamar de 2 milhões de toneladas exportadas em novembro/20 cresce vertiginosamente.
O desempenho da receita com a exportação de soja também seguiu caminho parelho ao volume, reduzindo 49% no comparativo semanal. A média diária recuou de US$ 74,20 milhões para US$ 37,88 milhões, com somente US$ 44,18 milhões obtidos durante a 2ª semana do mês de novembro/20 (na primeira semana foram US$ 296,81 milhões).
4. A compra do pecuarista

 

Chegamos ao fim da primeira quinzena de novembro/20 com o boi gordo e o milho imprimindo valorizações que já superam os 7% e 11%, respectivamente. No entanto, os limites de máximas parecem cada vez mais próximos e uma possível janela de compra se abre nas próximas semanas para o pecuarista que ainda precisa adquirir cereal.
O milho iniciou uma curva de estabilização/leve queda nos últimos dias após bater a máxima de R$ 82,67/sc no dia 28/10/2020. Nas últimas duas semanas o preço médio semanal do cereal em São Paulo apresentou desvalorização, fato que não ocorria desde a primeira semana de setembro/20. A queda do dólar no início da semana e o menor interesse das indústrias em adquirir novos volumes foram os fatores que auxiliaram para essa variação negativa do cereal.
Ainda assim, a relação de troca boi/milho caminha para fechar o mês de novembro/20 em um dos piores patamares da história para um mês de novembro, com uma arroba de boi gordo sendo capaz de comprar apenas 3,53 sacas de milho. E os preços futuros na B3 não mostram um cenário de grandes melhoras para os próximos seis meses.
No entanto, na nossa visão, há no atual cenário de curto/médio prazo mais riscos altistas do que baixistas para o mercado do milho brasileiro. Em primeiro lugar, visualizamos a cotação do milho nos EUA ainda em um patamar muito baixo (apesar das recentes valorizações), o atual preço de US$ 4,18/bu está longe das máximas dos últimos cinco anos, quando o milho na CBOT chegou a romper os US$ 7,00/bu (em meados de 2016). E com a soja se valorizando, a preferência pelo plantio da oleaginosa nos EUA tende a crescer, podendo restringir ainda mais a oferta de milho no mundo. Desta forma, a combinação de um milho nos EUA de US$ 5-6-7/bu com um dólar de US$ 5,50 pode gerar no Brasil um cereal cotado acima dos R$ 100,00/sc.
Além disso, temos o risco climático crescente no Brasil, como uma segunda safra cada vez mais ameaçada pela redução da janela ideal de plantio no centro-oeste brasileiro, graças ao atraso no plantio da soja. Por isso, acreditamos que o posicionamento de compra de milho pode começar a ser feito a partir de agora, aproveitando a onda de desvalorização que está acontecendo no mercado físico, buscando fazer média para baixo na compra deste cereal.

 

 

5. O destaque da semana

 

Dentre as tensões que ocorrerem na última semana, a China afirmou que encontrou três amostras positivas para coronavírus na embalagem de um lote de carne bovina brasileira. Após praticamente um mês da acusação de detecção do vírus em carne bovina originada da Minerva Foods, desta vez a detecção foi realizada em embalagens provindas da Marfrig Global Foods na cidade Wuhan, na China. Até a finalização desta edição a empresa não se pronunciou.
Segundo a Comissão de Saúde de Wuhan comunicou em seu site, a proteína bovina congelada e desossada do Brasil entrou no país em 7 de agosto e chegou a Wuhan em 17 agosto, onde estava em um frigorífico. Na unidade, mais de 100 funcionários foram testados. A cidade Wuhan foi foco da doença e, segundo afirmam, o surto teve iniciou em um mercado local e se espalhou pelo resto do mundo.
Na mesma semana, o órgão chinês responsável pelas testagens afirma também ter encontrado o vírus em embalagens de carne bovina argentina. A intensificação nas testagens iniciou em junho e faz parte de uma campanha nacional contra um novo surto da doença.
Entretanto, vale a pena ressaltar que, segundo a OMS (Organização Mundial de Saúde), ainda não existes provas que alimentos ou as cadeias alimentares participem da transmissão do covid-19.

 

6. E o que está no radar?

 

Após semanas em plena acessão, as cotações da arroba no mercado físico arrefeceram em resposta à pressão negativa gerada pela indústria frigorífica, que se afastou das compras, com consequente redução na liquidez das negociações, aliada também a desaceleração da moeda norte-americana. Apesar do ambiente especulativo, os preços se mantiveram praticamente estáveis e, ao que tudo indica, baixas significativas não devem ocorrer no curtíssimo prazo.
Isso está relacionado principalmente à redução dos abates – pela falta de animais prontos -, menor participação das fêmeas e exportações fluindo bem. Com relação ao mercado interno, a chegada da segunda quinzena do mês pode esfriar o fluxo de saída de carne bovina, em decorrência da redução do poder aquisitivo da população. O ambiente ainda é de firmeza dos preços, mas as margens ajustadas pressionam a indústria.
Apesar disso, a tensão também começa a se voltar ao aumento dos casos de infecção por coronavírus em todo o mundo. Algumas capitais brasileiras afirmam o aumento no número de infectados, ainda assim, nenhum lockdown foi confirmado.
Cenário parecido com o que tem acontecido nos EUA e Europa, onde a segunda onda de coronavírus vem se desenhando com mais força e colocado os governantes em posição defensiva novamente.