Yago Travagini é economista e consultor de mercado pela Agrifatto
Caroline Matos é zootecnista e trainee pela Agrifatto

 

Resumo da semana:

 

Semana destoante entre os mercados físicos e futuros de boi gordo. Isso porque, enquanto no mercado físico o boi gordo fechou mais uma semana (já é a 15ª consecutiva) com valorização, subindo 1,92% no comparativo semanal e fechando cotado à R$ 267,64/@. Na B3, o vencimento para novembro/20, registrou queda de 0,59%, sendo negociado à R$ 278,15/@. A escassez de animais aptos para o abate continua a justificar as altas no mercado físico. No caso do mercado futuro, visualizamos um movimento de stress após bater a máxima (R$ 293,00/@), e, com isso houve uma grande realização de lucro por parte dos participantes do mercado. Apesar deste movimento na B3, vemos um mercado físico ainda firme e com espaço para avançar ainda mais.
Com uma alta de 11,45% na semana, o milho faz questão de não sair da nossa coluna de destaques da semana. Há em curso uma queda de braço firme entre vendedores e compradores, na qual os vendedores estão conseguindo levar a melhor e vender o cereal a preços cada vez maiores. Apesar de grande parte das altas ser explicada por esse movimento do mercado interno, a pressão do ambiente externo segue grande, o prêmio pago pelo milho nos portos brasileiros já chegou aos US$ 1,90/bu, subindo 11,11% durante a última semana. Além disso, na CBOT as altas diárias são tímidas, mas consistentes, o que levou o cereal em Chicago subir 3,58% na última semana, atingindo a máxima dos últimos 14 meses, US$ 4,19/bu.
A volta a “normalidade” na maioria do Brasil começa a trazer mais preocupações que tem atacado a inflação em pontos que antes encontravam-se estagnados. A cotação do etanol hidratado em São Paulo avançou 1,50% na última semana, completando assim cinco semanas consecutivas de valorizações em seus preços. A chegada ao valor de R$ 2,04/l aproxima o combustível das máximas pré-pandemia (R$ 2,13/l), e se até agora, o transporte que era um dos indicadores que segurava o IPCA (inflação oficial), deve começar a pressionar para que a inflação avance a passos mais largos nos próximos meses.

 

1. Na tela da B3

 

Semana agitada na B3. O mercado continuou marcado pela grande volatilidade, no entanto, sinais de um possível teto de preço foi dado esta semana. Isso por que o contrato mais negociado na bolsa, novembro/20, começou a semana próximo dos R$ 280,00/@ e até chegar na quarta-feira foi evoluindo com força, fechando o dia à R$ 289,05/@. Na quinta-feira, a máxima foi atingida (R$ 293,00/@), e um forte movimento de correção iniciou-se, com o maior volume de contratos do novembro/20 negociados na sexta-feira. Desta forma, a semana se encerrou com tal vencimento cotado à R$ 278,15/@, praticamente estagnada frente os preços da semana passada.
Apesar da queda nas cotações, o volume de contratos negociados (futuros + opções) aumentou 0,29% no comparativo semanal, com um total de 106,86 mil contratos em aberto até a última quinta-feira. Os posicionamentos dos players também sofreram poucas alterações estruturais, as alterações mais sensíveis vieram das Pessoas Físicas (PFs) que aumentaram sua posição comprada em mais 1.085 contratos, e dos Investidores Institucionais (IIs) que aumentaram sua posição vendida em 1.980 contratos. Enquanto as PFs optaram pela compra de futuros para aumentar sua posição, os Investidores Institucionais aumentaram a posição vendida através da compra de mais de 2.225 PUTs.

 

 

Outro movimento interessante na B3, foi o aumento no volume de PUTs negociadas em conjunto com a queda das CALLs. Enquanto as opções de venda (PUTs) cresceram 10,06% no comparativo semanal, as opções de compra (CALLs) reduziram 11,41%. Na última quinta-feira existiam 37,64 mil PUTs em aberto, o maior volume de PUTs em aberto neste ano de 2020. Além disso, a última semana também marcou a menor diferença entre CALLs e PUTs dos últimos 6 meses, com apenas 4,63 mil CALLs a mais que PUTs.

 

 

1.1 O que o mercado futuro proporciona?

 

Após semanas consecutivas de firmeza e preços em franca ascensão, o mercado de boi gordo na B3 teve uma semana de atenção e aprendizado. As cotações futuras chegaram a recuar R$ 13,00/@ frente a máxima atingida na quinta-feira.
Apesar deste cenário de retração ocorrido durante a semana, o mercado físico continua a apontar os mesmos fundamentos de um mercado firme e valorizado até o fim de 2020. Como havíamos pontuado em relatórios anteriores, visualizamos que a negociações de PUTs para 2020 devam buscar uma proteção contra “cisnes negros”, desta forma a compra de PUTs com strike de R$ 270,00/@ para o restante do ano se mostrariam a opção mais barata e conservadora, com custos menores que R$ 1,60/@. Além disso, a compra de PUTs visando a entrega de animais em 2021 (maio) já traz valores atrativos com strikes de R$ 230,00/@, podendo ser uma boa opção se feita de maneira porcionada.
Assim como nos contratos mais curtos, os vencimentos para 2021 sofreram com grande volatilidade durante a semana. O contrato para maio/21 chegou a ser negociado nos R$ 278,80/@, no entanto sofreu forte recuo, fechando a sexta-feira à R$ 266,50/@. Para aqueles que deverão fazer compras neste período de 2021, a compra de futuros deve voltar a ser interessante com os novos testes que o contrato fizer nos próximos dias. Ainda assim, nossa recomendação é de uma montagem de posição comedida e aos poucos, buscando fazer média para baixo na compra desses contratos.
O mercado a termo teve mais uma semana sem muitas negociações, apesar de vendas relatadas para dezembro/20 em São Paulo a valores superiores à R$ 290,00/@. Ainda assim, poucos negócios são firmados.

 

2. Enquanto isso, no atacado…

 

No atacado paulista de carne bovina, os preços avançaram na última semana. As cotações da carcaça bovina se consolidaram em R$ 17,30/kg, ultrapassando a faixa dos R$ 17,00/kg, alta de 2,98% na comparação semanal.
A oferta restrita tem ditado o ritmo das negociações, e aliado aos estoques enxutos, não deixam brechas para pressão negativa da ponta compradora. O que se observa é há uma cautela da indústria em não permitir o acúmulo de matéria-prima no mercado interno, com isso, as indicações ficam restritas entre altas e estabilidade.
Além disso, carnes de segunda, como dianteiros e pontas, ainda sobram no atacado, relacionado ao menor apetite da classe de menor poder aquisitivo durante essa última quinzena do mês. O traseiro, predileto da classe média/alta, continua com alta procura e os preços avançam além dos R$ 20,00/kg.
Dentre as principais proteínas analisadas, a carne suína é a que mais avança no atacado paulista. As cotações da carcaça casada suína chegaram aos R$ 13,12/kg na última semana, com uma valorização semanal de 6,93% e 14,44% ante o mesmo período do mês anterior. Assim como no caso dos bovinos, a indústrias tem demandado animais para abate, mas a oferta ainda é limitada. Consequências do ajuste produtivo entre o 1°T e 2°T e alta dos insumos agrícolas para alimentação animal.
O frango resfriado desacelerou nos últimos sete dias, com os preços orbitando a faixa dos R$ 5,76/kg, baixa de 1,12% na comparação semanal. Já na comparação mensal, a alta observada foi de 0,61%. As cotações da carne de frango, por ser a proteína mais barata, tem se distanciado cada vez mais dos preços das carnes de suínos e bovinos, o que tem deixado os produtos avícolas mais competitivos e aumentado a preferência do consumidor por essa proteína.
Para o mercado de ovos, a semana se encerrou com estabilidade de preços, com a caixa com 30 dúzias estável em R$ 103,00. Apesar disso, os criadores de galinhas poeiras ainda se encontram pressionados pelo aumento dos custos produtivos, em decorrência dos avanços das cotações do milho e do farelo de soja, e a falta de repasses ao varejo, que ainda resiste em pagar valores mais altos.

 

3. No mercado externo 

 

A segunda semana de julho/20 trouxe consigo aumento nos volumes embarcados de carne bovina para fora do país, a média diária saiu de 5,90 mil toneladas na 1ª semana do mês para 7,02 mil toneladas na 2ª semana do mês, com isto a média do mês está em 6,60 mil toneladas/dia. Já são 52,80 mil toneladas de proteína bovina embarcadas no mês de julho/20, enquanto que no mesmo período do ano passado foram 46,33 mil toneladas.
A receita obtida com a venda da proteína bovina já chega à US$ 215,80 milhões, com a média diária avançando 13% frente a semana passada, estabelecendo-se em US$ 26,97 milhões/dia. Apesar destes avanços, os números de julho/20 ainda estão abaixo aos de junho/20, o que poderia indicar uma redução mensal da exportação de carne bovina, no entanto, com 15 dias úteis restantes, estimamos que julho/20 reserve uma exportação entre 130 a 150 mil toneladas de proteína bovina, dentro da linha dos últimos meses.
Apesar da aceleração e da melhora de 6% na média diária de milho exportada para fora do país, os embarques de cereal ainda seguem lentos frente ao mesmo período de 2019. Nos oito dias úteis de julho/20 foram exportadas 809,41 mil toneladas de milho, com uma média de 101,17 mil por dia. No comparativo com julho/19 a redução nos embarques chega a 60,73%.
A receita gerada pelas exportações de milho chegou a US$ 130,51 milhões nestes oito dias úteis de julho/20, mais do que o dobro de todo o mês de junho/20, no entanto, assim como o volume enviado, a receita obtida ainda está em níveis bem abaixo quando comparado a 2019. A tendência é que os embarques se intensifiquem apenas em agosto/20, com números compatíveis com os de 2019.
Justificada pela redução na oferta de oleaginosa disponível, a média diária dos embarques de soja para fora do país reduziu praticamente ¼ dentro de uma semana, saindo de 648,09 mil toneladas na primeira semana para 489,45 mil toneladas na segunda semana. Ainda assim, os números de julho/20 são mais de 50% maiores dos os que foram registrando em julho/19.
A receita obtida com a venda da soja já ultrapassou US$ 1,00 bilhão, e mesmo com a redução na oferta, deve chegar a mais de US$ 2,5 bilhões até o fim do mês. A janela de envio de soja para fora do país vai se fechando no Brasil, dando lugar aos embarques de milho, que devem começar a ocupar o lugar da oleaginosa nos navios graneleiros.

 

4. A compra do pecuarista

 

E se o boi chega nos R$ 270,00/@ e melhora a receita do pecuarista, a situação para aqueles que ainda necessitam fazer compras de insumos para 2020 ou até mesmo 2021 é nebulosa. Essa semana o maior destaque foi o milho, que na B3 atingiu por duas vezes o limite de alta (+5%), chegando a ser negociado nos R$ 88,00/sc.
No mercado físico paulista, a queda de braço entre produtores que ainda detêm milho pronto e compradores que se retraem a cada aumento de preço é grande, ainda assim, com receio de faltar milho, os demandantes estão aceitando pagar valores maiores, com isso o cereal chegou aos R$ 78,82/sc na última sexta-feira, demonstrando uma valorização semanal de 11,45%, sendo esse o maior valor da história.
A aceitação dos demandantes em pagar mais pelo cereal advém em grande parte da melhora dos preços das proteínas animais. Não só o boi gordo está em franca valorização, mas o suíno e o frango também experimentaram uma forte alta nos últimos meses. No entanto, esse cenário aparenta também estar chegando próximo a um limite. Isso por que, no caso do boi gordo, a relação de troca milho/boi gordo do mês de outubro/20 já é a pior desde mar/20 e também a pior para um mês de outubro desde 2016.
E o cenário futuro dá tons ainda mais negativos para esse indicador. Para se ter uma ideia, considerando as cotações na B3 atuais, o pecuarista paulista chegaria a janeiro/21 com uma relação de troca de 3,45 sc/@, a pior relação de troca desde maio/18. Diante disso, visualizamos que o milho deva continuar pressionado até a virada do ano, e as compras atuais devam ser feitas para atender necessidades urgentes. Para 2021, visualizamos que o momento é de espera e observação.

 

 

5. O destaque da semana

 

O destaque desta semana fica para a divulgação da prévia do Índice de Preços ao Consumidor Amplo – 15 (IPCA-15), ou comumente chamado de inflação, que teve alta de 0,94% neste mês, um aumento de 0,49 p.p. ante setembro e o maior valor já registrado para um mês de outubro desde 1995, quando foi marcado em 1,34%. Durante este ano o indicador já acumulou alta de 2,31% e no acumulado anual a variação foi de 3,52%.
A alta está relacionada principalmente aos avanços do grupo de Alimentação e Bebidas, que sofreu a maior variação, de 2,24%, excepcionalmente as carnes, que aumentaram 4,83% no último mês, contribuindo com 0,13% no compilado geral. As proteínas animais registraram alta pelo 5° mês consecutivo e já acumulam avanço de 11,40% em 2020.
Apesar das altas registradas, a inflação ainda está dentro da meta para este ano, de 4%, porém, os efeitos da pandemia ainda serão sentidos no mercado e as oscilações do dólar também impactam diretamente nos preços.
A reunião do Comitê de Política Monetária (Copom) nesta semana deve avaliar o cenário fiscal atual, a grande incerteza que paira sobre o mercado é se haverá alguma definição sobre a alteração na Selic, que permanece em 2% a.a. Vale a pena ressaltar que o adiamento da decisão sobre o Renda Cidadã pelo Governo Federal e o teto de gastos para 2021 geram uma pressão extra nos fundamentos da economia brasileira, essencialmente no próximo ano.
Desta forma, caminhamos em um cenário economicamente instável, com gastos públicos em patamares recordes e a volta da inflação a níveis que começam a preocupar. Diante disso, ressaltamos que o agronegócio tem se saído bem durante essa crise, no entanto, o crescimento da inflação afeta diretamente o poder de compra, e, o crescimento da receita não deve ser acompanhado na mesma proporção pela margem de lucro. Controle orçamentário nunca foi tão importante!

 

6. E o que está no radar?

 

O radar continua apontando para preços firmes no mercado de boi gordo, relacionado à oferta restrita de animais prontos para abate, os aumentos dos insumos e, consequentemente, alta dos custos pecuários, excepcionalmente com os de alimentação animal. O que se tornou um dilema para os criadores das principais espécies como bovinos, suínos e aves.
A oferta de animais não deve dar um salto, pois as chuvas estão atrasadas, o que impacta diretamente na produção de animais criados a pasto, colocando uma carga a menos sobre o somatório conjunto a quantidade de animais que devem chegar do segundo giro de confinamento.
No atacado, pouco a pouco começa a se observar um estresse quanto as altas registradas, em decorrência ao baixo apetite da população ao consumo de carne bovina. O que se agrava com a proporções que a inflação pode chegar.
Além disso, apesar do consumo interno andando de lado, as exportações dão suporte aos preços com o favorecimento do câmbio. A Alemanha continua a tentar controlar os casos de PSA (Peste suína africana), que só crescem a cada semana, e continua com as exportações suspensas. Fator que favorece as exportações brasileiras, principalmente com a China, um grande consumidor do mercado alemão. Porém, como dito anteriormente neste relatório, após o Ano Novo Chinês, as exportações tendem a esfriar.
Desta forma, apesar do stress verificado nas cotações do boi gordo na B3 durante a última semana, ainda visualizamos um ambiente de firmeza para as cotações do animal no mercado físico. Justificado principalmente pela oferta restrita de gado pronto.