Yago Travagini é economista e consultor de mercado pela Agrifatto
Caroline Matos é zootecnista e trainee pela Agrifatto

 

Resumo da semana:

 

E pela nona semana consecutiva o preço médio semanal do boi gordo avança em São Paulo, atingindo a marca dos R$ 245,00/@ segundo o indicador Cepea. A valorização do animal nas últimas duas semanas rompeu os 5%, imprimindo uma alta que assustou os frigoríficos compradores do mercado físico. Apesar do susto, a oferta restrita tem dificultado qualquer “barganha” ou pressão para baixo que seja testada. A última semana foi marcada pela maior calmaria no varejo, onde as altas da carne bovina não foram bem recebidas, o restante do mês deve trazer um movimento mais calmo para o boi gordo.
O peso dos alimentos mais caros está impulsionando um indicador que já preocupou muito os brasileiros, a inflação. Apesar de ainda estar relativamente controlada, a inflação para o consumidor fechou no maior valor dos últimos quatros anos para um mês de agosto, em 0,24%. O grande rebuliço causado pela forte alta do arroz causou preocupações no governo e esse logo atuou para retirar impostos de importação para a compra de 400 mil toneladas de países de fora do Mercosul. Visualizamos que a inflação deve chegar ao consumidor cada vez mais forte, isso por que a inflação medida para o atacado (IGP-M) já está acima dos 13%, e, com a normalização da demanda, essa alta deve ser repassada ao consumidor.
O milho dos EUA que já vinha surfando em uma forte valorização nas últimas semanas, baseado na percepção de que a produção norte-americana de milho iria recuar devido aos problemas climáticos, arrancou de vez com as notícias de que um tufão na China provocou alagamentos em áreas de plantio de cereal. A quebra da safra chinesa poderia representar um forte aumento no volume importado de milho do país, em um momento em que eles buscam recuperar o plantel de suínos. O vencimento para setembro/20 do milho na CBOT imprimiu uma valorização de mais de 5% na semana.
Por fim, a notícia que abalou a suinocultura mundial foi a descoberta de um javali com Peste Suína Africana (PSA) na Alemanha. O país que é o maior produtor europeu de suínos e um dos maiores exportadores de proteína suína para o mercado chinês, já enfrenta com proibições da própria China, Coreia do Sul, Argentina e Japão. Com a expectativa de maior demanda pelo porco norte-americano, os preços do suíno em Chicago bateram o limite alta diário (centavos de US$ 3) na quinta-feira, buscando as máximas de 2020. Os reflexos ainda são iniciais, mas para a produção de suínos no Brasil essa notícia deve ser muito boa.

 

1. Na tela da B3

 

Explorando mais um rally de alta do boi gordo no mercado físico e sustentado pelo preço da carcaça bovina no atacado interno, a cotação do vencimento outubro/20 na B3 fechou a semana com alta de 1,32%, atingindo a máxima dos R$ 245,15/@. A correção da semana retrasada abriu “espaço” para novas compras.
Os indicativos para 2021 ainda circulam a base dos R$ 235,00-240,00/@, com o vencimento maio/21 sendo negociado à R$ 236,60/@, o deságio frente aos preços atuais é de 4%. Ainda assim, realizar a venda nesses patamares significa vender em média 18% a mais do que em maio/20.
Após o movimento de correção da semana retrasada, já vemos uma volta dos participantes para o mercado, o número de contratos futuros em aberto cresceu 3%, com pouco mais de 21,43 mil contratos em aberto. O maior volume de contratos futuros negociados se deu basicamente devido ao aumento substancial das compras das PFs (Pessoas Físicas) e por maiores vendas das PJs não financeiras. Apesar disso, o nível de exposição para os dois ainda não está a patamares recordes.

 

 

1.1 O que o mercado futuro proporciona?

 

A alta do boi gordo no futuro, buscando os R$ 250,00/@ durante os últimos dias, abriu ainda mais margem para a proteção. O preço do boi gordo vai se esticando, mas o atacado não aparentar ter a mesma força. Estaríamos chegando próximo ao topo do preço do boi gordo?
Com o “pulo” dos R$ 240,00/@ para os R$ 250,00/@ o mercado demonstrou mais uma vez que a dificuldade para originar animais segue grande, com as pedidas dos produtores aumentando. Continuamos a bater na tecla da proteção contra “cisnes negros” em 2020, problemas políticos/sanitários e qualquer outro podem bater com força no preço do boi gordo. E, para quem busca mitigação de riscos, as PUTs com strikes de R$ 230,00/@ já estão custando menos de R$ 1,00/@, podendo ser uma ótima opção para aqueles que não realizaram ainda nenhuma proteção.
Para maio/21, acreditamos que a PUT sintética segue no radar sendo uma estratégia atraente, especialmente se realizada em ajuste com a venda de animais a termo, visto que pode melhorar o preço mínimo se comparada à PUT simples sem incorrer na incidência de ajustes até que o mercado bata o strike da CALL.
Os futuros de boi gordo se apresentam como uma opção plausível, no entanto, vale a ressalva que a demanda financeira para este tipo de operação é elevada. Para aqueles que querem se proteger de um 2021 ainda incerto, a venda de uma porcentagem pequena dos bovinos via contratos futuros para maio/21 pode ser uma boa opção de mitigação de riscos.
O mercado a termo continua calmo, há interesse dos frigoríficos, no entanto, a atenção para este tipo de contrato segue com o diferencial de base oferecido pelo frigorífico da sua região, que no atual momento praticamente inexiste.

 

2. Enquanto isso, no atacado…
O mercado atacadista de carne enc
errou a segunda semana de setembro com os preços estáveis. Após as altas registradas no início da semana, os preços se acalmaram, mantendo o patamar de R$ 16,00/kg na carcaça casada do bovino. Houve um grande burburinho apontando para registros de sobras no varejo, o que pode pressionar negativamente os preços do atacado nesta semana que se inicia. Além disso, a segunda quinzena, período em que o escoamento de carne bovina enfraquece, também bate na porta, o que dificulta ainda mais uma valorização da proteína.
O preço da carcaça especial suína continua firme, registrou 1,69% de alta na última semana, sendo cotada a R$ 11,45/kg. Comparativamente ao mesmo período do mês passado, o avanço é de 11,28%. As exportações da proteína suína continuam “bombando”, com a China como principal cliente, e, com a notícia da PSA na Alemanha, a demanda externa pela proteína suína brasileira pode crescer ainda mais.
O frango resfriado vai buscando uma maior valorização, nesta semana o preço médio ficou em R$ 5,07/kg, o que representa uma alta de 2% frente aos números da semana retrasada. Ainda assim, enquanto os avanços das outras proteínas são feitos à passos largos, a carne de frango encontra muita dificuldade para avançar, em parte explicada pelo fato de que as exportações desta proteína não têm ido tão bem quanto às outras.

 

3. No mercado externo 

 

Semana de consolidação para as exportações de carne bovina no Brasil, a média diária variou apenas 0,23% para baixo, estabelecendo-se em 8,20 mil toneladas/dia contra 8,22 mil toneladas/dia da semana anterior. Com isso, a expectativa de avanço frente a setembro/19 é de 24%, com uma estimativa de que atinjamos as 170 mil toneladas no mês de setembro/20.
A receita diária obtida com a venda de proteína bovina variou na mesma proporção, estabelecendo-se em US$ 33,49 milhões/dia. Esse número é capaz de levar a receita total adquirida no mês com a venda de carne bovina ao patamar de US$ 700 milhões de dólares em setembro/20, o maior número da história para um mês de setembro.
Seguindo a baixa das programações dos line-ups dos navios no Brasil, as exportações semanais demonstraram uma redução no volume diário de milho exportado pelo país. A média diária saiu de 472,69 mil toneladas na 1ª semana de setembro/20 para 384,25 mil toneladas na 2ª semana de setembro/20, queda de 19%. Ainda assim, frente aos números de setembro/19, o avanço nos embarques é de 25%.
A receita obtida recuou ainda mais, visto que o preço médio reduziu em 2%, a média diária da receita ficou em US$ 63,88 milhões, 20% menor do que a média da 1ª semana do mês. Os números vão em linha com a expectativa de que esse ano realmente a exportação deve ficar bem abaixo do que foi na safra 19/20.
Voltou a aparecer soja nos portos brasileiros, com a alta dos preços em Chicago, a oleaginosa do Brasil aumentou sua competitividade e também suas cotações, com isso, a média diária embarcada para fora do país cresceu 4%, com pouco mais de 197,16 mil toneladas. O número é 10% menor que em setembro/19, mas no acumulado da safra, as exportações serão recordes.
A receita obtida com a venda de soja voltou a ser a mais importante para a agropecuária, ultrapassando o milho, com pouco mais de US$ 573 milhões acumulados até a segunda semana do mês. A média diária avançou 4%, estabelecendo-se em US$ 71 milhões.

 

4. A compra do pecuarista

 

A semana foi de relativa estabilidade para o milho no Brasil, os preços do cereal em São Paulo fecharam a sexta-feira próximo do patamar da semana retrasada, em torno dos R$ 59,00/sc. Na B3, o vencimento para mar/21 variou positivamente 6%, ficando cotado nos R$ 59,38/sc. Com os problemas climáticos na China e EUA, que reduzirão a produção desses países, o pecuarista deve ficar de olho na relação de troca boi gordo/milho, caso essa esteja favorável, a compra do milho no atual patamar deve ser considerada, isso por que não há muito espaço para que o cereal se desvalorize nos próximos meses.
Já o bezerro parece ter encontrado um “teto”, isso por que romper a barreira de referência dos R$ 2.200/cabeça está cada vez mais difícil, com os negócios no MS se estabelecendo na média dos R$ 2.150/cabeça. Apesar da oferta restrita, o menor apetite momentâneo dos compradores não abre espaço para que as cotações do animal avancem muito.
Por fim, visualizamos a “arrancada” da soja nos EUA nos últimos dias com atenção. Isso porque desde o início do ano, a oleaginosa na CBOT caminhava de lado, próxima dos US$ 9,00/bu, e segurando uma maior valorização da soja no Brasil. Para se ter uma ideia, desde o primeiro dia de 2020 até a última sexta-feira a soja nos EUA variou 9% para cima, enquanto a oleaginosa brasileira subiu 56%, câmbio e prêmio explicam essa alta da soja no Brasil.
No entanto, a história tem se alterado nos EUA, desde o dia 11/08/2020 o preço da soja norte-americana vem realizando um forte rally, subindo mais de 18% no comparativo mensal, atingindo o maior valor de um contrato corrente na CBOT desde dezembro/18, fechando a última sexta-feira à US$ 10,25/bu. No mesmo período no Brasil, a soja brasileira variou “apenas” 11%, devido à desvalorização do dólar, no entanto, a moeda brasileira deve continuar apresentando fortes oscilações e com as cotações em Chicago rompendo as máximas, devemos ver os preços da soja brasileira acima dos R$ 140,00/sc em breve.
Diante disso, como já antecipávamos anteriormente, não víamos muito espaço para desvalorização do farelo de soja, e, com essa alta em Chicago, a compra do farelo em 2020 deve ficar ainda mais pesada para o bolso do pecuarista.

 

 

5. O destaque da semana
O destaque desta semana fica para os dados divulgados pelo IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) referentes aos abates do 2°TRI/2020. O levantamento aponta para uma redução no número de bovinos e frangos abatidos, e crescimento nos suínos.
De abril a julho deste ano houve uma redução de 8% no número de cabeças de bovinos abatidas quando comparado ao mesmo período do ano passado, contabilizando 7,30 milhões de cabeças. Além disso, ante o 1°TRI/2020 a redução foi de 0,3%. Segundo o IBGE, foi o resultado mais baixo registrado para um 2°TRI desde 2011, quando se observa a série histórica iniciada em 1997.
Com relação ao abate de fêmeas, houve uma redução de 8,39% no abate de vacas (fêmeas acima de 24 meses) em comparação ao 1°TRI/2020. Se olharmos para o mesmo período do ano passado a queda foi ainda mais acelerada, registrando uma baixa de aproximadamente 19% da participação das vacas nos abates totais, quase 500 mil animais a menos que no mesmo período do ano passado.
Para os frangos, foram 1,41 bilhão de cabeças abatidas, queda de 1,0% ante o mesmo período ao ano passado e baixa de 6,8% quando comparado ao 1°TRI/2020. Enquanto frango e bovino caem, o abate de suínos registrou alta de 1,8% ante o 1°TRI/2020 e um aumento de 6,2% comparativamente ao 2°TRI/2019, com 12,10 milhões de cabeças abatidas.

 

6. E o que está no radar?

 

Com a chegada eminente da segunda quinzena do mês, os compradores da carcaça bovina no atacado devem testar patamares mais baixos, visualizando um fraco desempenho do varejo, entretanto, os estoques de proteína reduzidos barram uma perda de sustentação muito grande. Neste ambiente, é esperado um ar de estabilidade e especulação.
Além disso, no mercado spot de boi gordo, a arroba segue quebrando recordes e só são realizados negócios quando o valor ofertado é extremamente satisfatório ao pecuarista. A dificuldade em preencher escalas segue grande, por conta disso, as indústrias seguem disputando os bovinos, não à toa vemos o diferencial de base praticamente zerado em estados como MS e MG.
Para o mercado externo, as expectativas continuam apontando para exportações em alta. E, após a Alemanha registrar o primeiro caso de PSA (Peste suína africana) em javalis, os olhos se voltam para a suspensão dos embarques do país à China. O mercado fica de olhos abertos, já que pode favorecer as exportações brasileiras, visto que a Alemanha é um forte fornecedor de carne suína para o mercado chinês.