Yago Travagini é economista e consultor de mercado pela Agrifatto
Caroline Matos é zootecnista e trainee pela Agrifatto

Resumo da semana:

 

O mês de agosto/20 chega ao fim com o maior preço médio mensal do boi gordo da história, com o valor de R$ 228,02/@, o avanço frente ao já recorde mês de julho/20 foi de 3,01%, demonstrando que a dificuldade em comprar bovinos continua elevada, e com isso, os frigoríficos estão tendo que pagar cada vez mais pelos animais. O mês de setembro/20 se inicia com as cotações rondando os R$ 236,00/@ em São Paulo no mercado físico, e na B3 apontando para R$ 240,00/@, indicando que há espaço para que as cotações avancem ainda mais.
O respaldo para esse aumento do boi gordo, vem da carne bovina, que também tem visto seus preços evoluírem. E não é somente a proteína bovina, a carne suína bateu novo recorde nominal de preço, com a carcaça suína especial chegando próximo dos R$ 11,00/kg em São Paulo. O forte fluxo de exportação, com a expectativa de mais de 85 mil toneladas embarcadas no mês de agosto/20 dá sustentação aos preços internos, com as indústrias tendo que pagar mais pelo animal vivo.
Saindo um pouco do espectro brasileiro, vimos durante esta semana uma forte valorização dos preços de soja e milho nos EUA. Isso aconteceu principalmente devido ao clima e a demanda chinesa pelas commodities norte-americanas. O USDA demonstrou em seu relatório uma severa piora nas condições das lavouras de milho, graças aos ventos em Iowa e ao tempo seco no resto do país, reduzindo a previsão de produção do país. E aliado a isso, grandes vendas externas à China foram reportadas durante a semana, com isso, a soja e o milho avançaram 5,61% e 5,73% na CBOT, respectivamente.
Por fim, o dólar voltou a ser destaque, não só no Brasil como em todo o mundo, graças as declarações do presidente do banco central dos EUA sobre ser mais permissivo com a inflação do país. Desta forma, vimos a divisa norte-americana recuar 4,10% no comparativo semanal, atingindo a mínima dos últimos 15 dias.

 

1. Na tela da B3

 

Mais uma semana positiva no mercado futuro, o vencimento do boi gordo para outubro/20 na B3 fechou a semana com uma alta de 3,12% no comparativo semanal, cotado à R$ 237,95/@, com um ágio de 0,55% sobre o preço físico.
Com esse rompimento dos R$ 235,00/@ já não há resistências antigas a serem rompidas, os contratos para novembro/dezembro já são negociados acima dos R$ 240,00/@, demonstrando que o mercado acredita em uma amplitude de preços ainda maior no final do ano. Para maio/21, as cotações fecharam a sexta-feira nos R$ 229,00/@, com um leve deságio frente aos preços atuais do mercado físico.
O número de contratos em aberto seguiu aumentando nesta semana, foram negociados mais 3,03 mil contratos durante a última semana, sendo que 1,82 mil foram contratos futuros e 1,21 mil foram contratos de opções. Desta forma, o total de contratos em aberto chegaram a 110,08 mil contratos, sendo 85,62 mil contratos de opções de boi gordo e 24,45 mil contratos futuros.
A forte valorização do boi gordo parece ter movimentado os participantes do mercados, isso por que o saldo comprado das PFs atingiu o maior valor dos últimos 90 dias, com pouco mais de 6,96 mil contratos, enquanto as PJs não financeiras aumentaram sua posição vendida para o maior valor desde 09/07/2020, com pouco mais de 2,50 mil contratos vendidos. O histórico recente demonstra que as PFs têm se saído melhor com o posicionamento comprado, será que esse aumento na exposição resultará em mais acertos? Só o tempo dirá.

 

1.1 O que o mercado futuro proporciona?

 

Sem novidades sobre precificação de opções, a volatilidade continua acima da média, no entanto, o cenário de alta traz novas opções de travamento.
Se na semana passada falávamos de PUTs de R$ 220,00/@ para outubro/20, agora o mercado já demonstra possiblidades palpáveis nos R$ 230,00/@ para outubro/20, com custo abaixo dos R$ 2,10/@. O mercado continua demonstrando firmeza e força para avançar ainda mais, a compra de PUTs para outubro/20 se mostra interessante para cobrir custos e se prevenir do imprevisível, como já dito na semana passada. Além disso, o vencimento maio/21 já está com liquidez de mercado, PUTs de R$ 200,00/@ podem ser encontradas por menos de R$ 2,50/@, o radar para a operação 2021 já deve estar ligado.
A PUT sintética segue no radar sendo uma estratégia atraente, especialmente se realizada em ajuste com a venda de animais a termo, visto que pode melhorar o preço mínimo se comparada à PUT simples sem incorrer na incidência de ajustes até que o mercado bata o strike da CALL. Uma boa operação a se analisar no atual momento.
Os futuros de boi gordo se apresentam como uma opção plausível, no entanto, com cuidados redobrados sobre a manutenção do caixa. O cenário de oferta restrita deve continuar até o fim de 2020, como dito na semana passada, para aqueles que necessitam fazer compras (reposição de animais ou frigoríficos) a compra de futuros pode ser uma boa opção. Além disso, os futuros para maio/21 já são negociados acima dos R$ 230,00/@, operações que entreguem boa rentabilidade a esses valores devem começar a analisar a venda de parte dos animais, já que há sim expectativa de uma melhora na oferta a partir de 2021.
O mercado a termo se acalmou, com frigoríficos se retirando das compras, devido a janela de compra para 2020 se reduzindo.

 

2. Enquanto isso, no atacado…

 

Os preparativos para a chegada de setembro e a oferta limitada de produtos, acarretaram em avanços nos preços no atacado paulista de carne bovina. Os estoques enxutos favorecem a pressão de alta, dada a visível baixa disponibilidade de produtos para barganhar.
A carcaça casada bovina fechou a sexta-feira cotada a R$ 15,40/kg, se aproximando cada vez mais dos preços visto em novembro do ano passado. O avanço registrado foi de 4,36% na comparação semanal e, já comparação mensal, chega a 12,41%.
Assim como a proteína bovina, os preços da carne suína seguem alavancados, impulsionados também pela oferta reduzida de animais, causado pelo ajuste produtivo com o início da pandemia de covid-19, e pelas exportações registrando volumes historicamente recordes. Neste cenário, a carcaça especial suína fechou a quarta semana de agosto em valor recorde, superando a cotação da semana passada. Os preços chegaram a atingir R$ 10,90/kg na sexta-feira, com valorização semanal de 2,68% e 15,59% na comparação mensal.
Enquanto as cotações da carne bovina e suína seguem alavancadas, os preços do frango perderam força nos últimos setes dias, com desaceleração de 5,21%, o frango congelado chegou R$ 4,83/kg. Enquanto as outras proteínas surfam na demanda avassaladora chinesa, as exportações de carne de frango não avançam no mesmo ritmo, e, sofrem para evoluir diante de um mercado interno combalido.
No mercado de ovos, os ares são de estabilidade. Apesar dos grandes descartes de matrizes, o mercado interno tem mostrado um reajuste frente ao cenário pós-pandemia, com criação de empregos já em julho/20, promovendo a migração de consumo para proteínas de maior valor agregado. Neste cenário, a caixa com 30 dúzias fechou a sexta-feira em R$ 89,00, sem grandes variações frente as últimas semanas.

 

3. No mercado externo 
O Mercosul detém 4 dos 10 países que mais exportam carne bovina, sendo responsável por cerca de 40 das exportações mundiais de proteína bovina.
No entanto, com o crescente apetite externo (principalmente chinês) por carnes mais nobres e com mais nobres e com mais “marca”, caso argentino e uruguaio, a relação comercial entre o Brasil e os países do eixo sul do Mercosul tem mudado nos últimos anos.
A Argentina, que até 2017 não comprava carne brasileira, está aumentando gradativamente as compras da proteína brasileira, com mais de 6 mil toneladas importadas no 1 º semestre de 2020, dispendendo US$ 17,17 milhões. Maiores valores da história para tal período.
Dentre os 3 países (Paraguai e Uruguai), o nosso maior cliente são os Uruguaios que já gastaram US$ 52,26 milhões neste primeiro semestre de 2020 com nossa carne bovina, o maior valor da história. A balança comercial da carne bovina com o Uruguai que historicamente sempre foi negativa para o Brasil, “virou”, e no primeiro semestre deste ano, o Brasil teve um saldo positivo de US$ 37,40 milhões.
Ainda assim, há muito o que se evoluir, já que a carne brasileira exportada ao Uruguai tem um preço 52% menor que a carne uruguaia vendida ao Brasil.
O interessante desta relação é que o Brasil tem encontrado mercado para vender sua carne em países que são relativamente autossuficientes na produção com a demanda chinesa por proteína bovina de todo o mundo, inflando os preços de exportação, a carne brasileira acaba sendo uma boa “reposição” na Argentina e Uruguai.
Sinal disto é a balança comercial da carne bovina brasileira com esses três países em valores mínimos negativos, chegando a apenas US$ 7 milhões no primeiro semestre deste ano.
Cabe a ressalva de que a balança comercial do Brasil com o Paraguai na carne bovina pouco se alterou, já que, apesar de estar vendendo nossa proteína mais cara aos paraguaios, a balança comercial é US$ 37 6 milhões negativos para o Brasil.
Confira o nosso Relatório de Mercado Externo na íntegra aqui.

 

4. A compra do pecuarista

 

Muitas novidades durante a semana para o mercado de milho e soja brasileiro, vamos por partes. Primeiro, na segunda-feira, dia 24/08/2020, o USDA divulgou o relatório de condições das lavouras nos EUA com os reais impactos dos ventos sobre as lavouras de Iowa e também do clima seco que perdurou durante as últimas semanas nos EUA, com isso, as condições boas/excelentes das lavouras de milho no país caíram 5 p.p. atingindo o menor nível desde o início do plantio, com 64% em boas/excelentes condições. Na soja, o recuo foi de 3 p.p., com 69% das áreas em boas/excelentes condições. Aliado a isso, o fato de a China estar comprando muito grão norte-americano, fez o preço da oleaginosa e do cereal avançarem mais de 5% na semana na CBOT, chegando próximo as máximas do ano.
O segundo fator que movimentou o mercado do milho e soja foi interno, o secretário de política agrícola do governo informou que pretenderia retirar o imposto de importação de países de fora do Mercosul para o milho, a soja e o arroz. Buscando desta forma, controlar a forte escalada que os preços desses tiveram nos últimos meses.
Diante desses fatos, um altista (vindo dos EUA) e um baixista (vindo do Brasil), o preço do milho no mercado físico viu suas altas fortes diminuírem de intensidade, com o preço em São Paulo fechando a semana com alta de 2,30% no mercado físico. Na B3, o sentimento negativo foi maior, com o vencimento setembro/20 recuando 1,01%, para R$ 59,65/sc.
Acreditamos que o impacto da medida do governo brasileiro em retirar as tarifas de importação é limitado, pois com o dólar acima dos R$ 5,40, a importação de milho ou soja de países com tal capacidade de exportar (EUA ou Ucrânia) deverá continuar com custos elevados.
O cenário traçado é de que os preços do cereal devem reduzir levemente, mas ainda assim continuar com preços elevados, acima dos R$ 50,00/sc, sobretudo se o dólar continuar acima dos R$ 5,40. Com isso a relação de troca boi/milho deve caminhar na faixa das 4,00 sc/@.

 

 

5. O destaque da semana
O destaque da última semana fica para o pronunciamento presidente do FED (Banco Central Americano), Jerome Powell, em que estabelece um nova abordagem da autoridade norte-americana sobre a inflação, indicando ao mercado de que estão disposto a permitir uma taxa de inflação um pouco maior que a meta (2% ao ano) em busca de apoiar a economia em geral.
Segundo relatos, o anúncio indica que os juros norte-americanos devem continuar baixos por mais tempo do que esperado, com a intenção de não os alterar até a economia ganhar força novamente, mesmo com indicativos de diminuição na taxa de desemprego. Com tais declarações, o dólar perdeu força frente quase todas as moedas mundiais, e, frente ao real não foi diferente, encerrando uma semana que foi de muita especulação no ambiente interno, mas que finalizou com o dólar à R$ 5,39, o menor valor dos últimos 15 dias.
A instabilidade da política interna continua a afetar negativamente a moeda brasileira, já que o impasse entre o executivo e o legislativo continua grande, e com o presidente e seu ministro da economia, Paulo Guedes, não se acertando sobre o programa Renda Brasil, que seria um substituto ao Bolsa Família, o receio sobre uma possível demissão do ministro da economia aumentou trazendo mais especulação ao já volátil mercado de câmbio brasileiro.
Com eleições presidenciais nos EUA, eleições municipais no Brasil e a real eficácia da vacina contra o Corona vírus ainda em voga para os quatro meses restantes de 2020, este último quadrimestre do ano deve reservar grande volatilidade para o mercado brasileiro.

 

6. E o que está no radar?

 

Com eminente chegada de setembro, o mercado de carne bovina aguarda uma reação positiva dos preços desta no atacado, dada a entrada dos salários e o auxílio emergencial. O feriado prolongado na próxima semana também pode dar aquele “empurrãozinho” para a melhora no fluxo de saída da carne bovina.
Enquanto isso não se concretiza, as exportações continuam como um forte suporte para as indicações atuais do boi gordo, em um cenário de alta de demanda externa favorecida pelo câmbio. Dentre os drivers de demanda, o que mais cabe a atenção é o consumo interno, já que a exportação de proteína dá sinais de consolidação até o fim de 2020, e com o fim do auxilio emergencial, a prolongação ou o encerramento deste pode dar novos ares ao comportamento da demanda interna.
Do lado da oferta, a chegada dos animais de confinamento entre o mês de setembro/20 e o próximo atenuam o problema de originação de animais, no entanto, a dificuldade de compras dos frigoríficos deve continuar elevada, tendo em vista o menor volume de bovinos que foram confinados e a forte elevação dos insumos que não dão estímulo para “fechar” mais animais no atual momento, como é o caso do milho e soja.
Neste ambiente, fica no radar uma possível melhora nas vendas de carne bovina e tendência de alta para arroba no curto prazo.