Yago Travagini é economista e consultor de mercado pela Agrifatto
Caroline Matos é zootecnista e trainee pela Agrifatto
Resumo da semana:
A semana não teve grande novidades para o mercado do boi gordo brasileiro, e os motivos para essa falta de movimentação são parecidos com os da semana retrasada. O movimento de baixa de preços tenta ganhar corpo, já que as vendas no atacado derrapam e não conseguem fazer a carcaça casada do boi romper os R$ 15,00/kg, no entanto, esse movimento não adquire adesão pela ainda grande dificuldade dos frigoríficos em encontrar animais aptos para abate.
Apesar da falta de novidades em São Paulo, nos outros estados brasileiros, o preço do boi gordo tem avançado com mais força. O preço médio do bovino no mês de agosto/20 em Rondônia e Goiás já variou positivamente mais que o dobro do no estado paulista, desta forma, o diferencial de base recuou ao menor nível de 2020 na maioria dos estados brasileiros. Para se ter uma ideia da melhora nos preços no interior do país, a diferença de preços entre Pará e São Paulo deve ser a menor desde julho/17.
A avicultura deve uma semana difícil, isso por que, ao mesmo tempo em que vê o milho bater os R$ 60,00/sc em São Paulo, pressionando fortemente os custos. Ao olhar para os preços de venda, visualizou a cotação do frango resfriado recuar 2,57% e os preço dos ovos retrair mais de 5%. O setor é o mais atento e com grandes receios sobre a demanda interna, e mesmo com os dados do IBGE apontando criação de empregos em julho/20, o fim do auxílio emergencial pode ser comprometedor para o avanço dos preços.
Depois de semanas de calmaria e sem grandes imbróglios, a política brasileira voltou a demonstrar a sua força para causar volatilidade no país. A votação no senado que retirou o veto do presidente para um possível reajuste dos servidores que causaria um rombo fiscal enorme, fez com que o câmbio no Brasil voltasse a ser o centro das atenções, e com isso, o dólar rompeu novamente os R$ 5,60, após três meses abaixo desse valor. Apesar da Câmara ter revertido a decisão do Senado, o mercado vê que ainda há uma grande fragilidade por parte do Executivo em tocar possíveis reformas.
1. Na tela da B3
Novos testes e novas resistências a serem rompidas, assim tem se comportado o preço do boi gordo na B3. O vencimento para outubro/20 fechou a semana à R$ 230,60/@, valorizando 2,76% na semana. Sendo este o recorde histórico para tal contrato.
As negociações para novembro/dezembro já se mostram acima dos R$ 233,00/@, demonstrando assim que o mercado acredita que ainda há força para que os preços do animal avancem, e de fato há, principalmente pelo lado da oferta, no entanto, a fragilidade da demanda traz preocupações. Cabe ressaltar que os negócios para maio/21 já ocorrem, com as cotações já acima dos R$ 226,00/@, um preço 15% maior que o registrado em maio/20, podendo ser uma boa oportunidade para aqueles que já querem iniciar a proteção de 2021.
Com um saldo positivo de 10 mil contratos negociados, o total de negociações de boi gordo em aberto na B3 rompeu os 100 mil contratos nesta última semana, são 22,32 mil contratos futuros e 83,83 mil contratos de opções. Apesar do aumento nas duas categorias, quem puxou com mais força esse aumento foram as CALLs, que tiveram um acréscimo de mais de 6,87 mil contratos negociados na última semana.
Esse aumento na movimentação não se traduziu em uma grande formação de posição, as Pessoas Físicas seguem compradas, no entanto, aumentaram sua posição comprada em 35%, e as PJ Financeiras seguiram vendidas, com uma redução deposição de 3%. No gráfico abaixo, vemos que (com exceção destes dois participantes) não há uma posição relevante formada por nenhum outro participante.
1.1 O que o mercado futuro proporciona?
O mercado não arreda o pé de uma precificação de volatilidade maior, o que de certa forma faz sentido com os eventos recentes, desta forma vemos que a volatilidade para o boi gordo permanece acima dos 13%. No entanto, com o vencimento outubro/20 rompendo os R$ 230,00/@, as opções de proteção mostram um horizonte cada vez mais vantajoso.
Para o pecuarista que ainda não fechou a proteção para o que resta de 2020, visualizamos PUTs com strike de R$ 220,00/@ para outubro/20 já negociadas com prêmios abaixo dos R$ 1,80/@. Vislumbrando somente a garantia de margem, as condições e preços nunca estiveram tão boas, e com a leve saturação que o mercado físico tem sofrido, a proteção de parte dos animais a esse preço se mostra interessante para aqueles que querem se prevenir do imprevisível.
A PUT sintética segue no radar sendo uma estratégia atraente, especialmente se realizada em ajuste com a venda de animais a termo, visto que pode melhorar o preço mínimo se comparada à PUT simples sem incorrer na incidência de ajustes até que o mercado bata o strike da CALL. Uma boa operação a se analisar no atual momento.
Os futuros de boi gordo se apresentam como uma opção plausível, no entanto, com cuidados redobrados sobre a manutenção do caixa. Para aqueles que necessitam fazer compras (reposição de animais ou frigoríficos) pode ser uma boa opção, principalmente visualizando o cenário até o fim do ano, espaço de tempo no qual não há grande perspectiva de oferta chegando o que poderia pressionar ainda mais preços.
O mercado a termo segue em pauta, no entanto, com a proximidade nas entregas e grandes contratos já firmados, o interesse dos frigoríficos se reduziu. Vale se atentar ao diferencial de base para outras regiões do país (fora SP), isso por que esse vem se reduzindo fortemente em agosto/20, abrindo espaço para que os descontos oferecidos pelos frigoríficos sejam menores.
2. Enquanto isso, no atacado…
Seguindo o ritmo de lentidão, estabelecido pela chegada da segunda quinzena do mês, os preços não avançaram e, graças a oferta enxuta, conseguiram se manter balizados nos mesmos patamares. A carcaça casada bovina fechou a sexta-feira (21) em R$ 14,70/kg. Dentre os preferidos da ponta compradora, o único que não foi acometido pela pressão negativa foi o dianteiro, que segue estável em R$ 13,50/kg.
A demanda enfraquecida também afetou as cotações do frango resfriado, que desacelerou 0,29% na última semana, encerrando a semana em R$ 5,09/kg. Já na comparação mensal, a 7,50%.
Enquanto a carne bovina escorrega, a carcaça especial suína bate um novo recorde nominal, com preços alcançando R$ 10,62/kg, registrando alta de 1,87% nos últimos sete dias e, na comparação mensal, o avanço de 19,58%. Com isso, a carne suína se aproxima da carne bovina e, consequentemente, se afasta da carne de aves, o que também pode começar a afetar sua competitividade ante seus principais concorrentes, como aponta o Cepea.
3. No mercado externo
A segunda semana de julho/20 trouxe consigo aumento nos volumes embarcados de carne bovina para fora do país, a média diária saiu de 5,90 mil toneladas na 1ª semana do mês para 7,02 mil toneladas na 2ª semana do mês, com isto a média do mês está em 6,60 mil toneladas/dia. Já são 52,80 mil toneladas de proteína bovina embarcadas no mês de julho/20, enquanto que no mesmo período do ano passado foram 46,33 mil toneladas.
A receita obtida com a venda da proteína bovina já chega à US$ 215,80 milhões, com a média diária avançando 13% frente a semana passada, estabelecendo-se em US$ 26,97 milhões/dia. Apesar destes avanços, os números de julho/20 ainda estão abaixo aos de junho/20, o que poderia indicar uma redução mensal da exportação de carne bovina, no entanto, com 15 dias úteis restantes, estimamos que julho/20 reserve uma exportação entre 130 a 150 mil toneladas de proteína bovina, dentro da linha dos últimos meses.
Apesar da aceleração e da melhora de 6% na média diária de milho exportada para fora do país, os embarques de cereal ainda seguem lentos frente ao mesmo período de 2019. Nos oito dias úteis de julho/20 foram exportadas 809,41 mil toneladas de milho, com uma média de 101,17 mil por dia. No comparativo com julho/19 a redução nos embarques chega a 60,73%.
A receita gerada pelas exportações de milho chegou a US$ 130,51 milhões nestes oito dias úteis de julho/20, mais do que o dobro de todo o mês de junho/20, no entanto, assim como o volume enviado, a receita obtida ainda está em níveis bem abaixo quando comparado a 2019. A tendência é que os embarques se intensifiquem apenas em agosto/20, com números compatíveis com os de 2019.
Justificada pela redução na oferta de oleaginosa disponível, a média diária dos embarques de soja para fora do país reduziu praticamente ¼ dentro de uma semana, saindo de 648,09 mil toneladas na primeira semana para 489,45 mil toneladas na segunda semana. Ainda assim, os números de julho/20 são mais de 50% maiores dos os que foram registrando em julho/19.
A receita obtida com a venda da soja já ultrapassou US$ 1,00 bilhão, e mesmo com a redução na oferta, deve chegar a mais de US$ 2,5 bilhões até o fim do mês. A janela de envio de soja para fora do país vai se fechando no Brasil, dando lugar aos embarques de milho, que devem começar a ocupar o lugar da oleaginosa nos navios graneleiros.
4. A compra do pecuarista
Apesar da percepção de que a especialização está crescendo a cada dia, e que cada o foco no que você produz é essencial para se manter na atividade, nesta semana, tivemos mais um exemplo de como tudo está interligado, e isso também acontece no agronegócio brasileiro. O pecuarista que foi comprar milho, viu os votos do Senado refletir diretamente no bolso dele, já que o dólar bateu recorde de preço, o que no final resultou no milho atingindo o patamar de R$ 60,00/sc em São Paulo.
A grande volatilidade política pesa diretamente sobre o bolso do produtor, que acaba pagando o preço, já que o milho, o farelo de soja, o caroço de algodão são commodities que sofrem muita interferência do dólar, e como o dólar sofre variações com a política, a interligação fica nítida. Obviamente isso deve passar, mas com importantes reformas a vir, eleições municipais no Brasil e eleições presidenciais nos EUA o caminho de pedras está formado e, pelo menos até o fim de 2020, acredito que a pressão do dólar ainda existirá, fazendo com que as cotações do milho e soja continuem pressionadas.
Com uma relação de dependência menor com o dólar, mas, com preços bem elevados, vemos que a reposição de animais surfa ainda em uma forte valorização e um ágio acima da média histórica sobre o boi gordo. O bezerro tem preços quase 50% maiores que o do boi gordo no atual momento, fato explicado pela escassez de animais. No entanto, vemos que há de certa forma uma redução desse ágio em curso, com a percepção de que em 2021 a mudança será concretizada, com uma forte redução desse ágio. A atenção para quem leva um custo de reposição de bezerros adquiridos em 2020 para os anos de 2021 e 2022 tem que ser redobrada, pois o ciclo pecuário pode trazer margem apertadas e até mesmo negativas.
5. O destaque da semana
A pauta referente aos possíveis rastros de coronavírus detectados em embalagem de frango do Brasil na província de Shenzhen, na China, se estendeu até a última semana. Segundo relatos, o Ministério da Agricultura tem mantido uma linha direta de diálogo com as autoridades chinesas, que acompanham de perto o que tem acontecido em terras brasileiras.
Além da desconfiança chinesa, as Filipinas também suspenderam as importações de carne de frango do Brasil na última segunda-feira (17). O Ministério considerou “desproporcional” a decisão filipina, visto que ainda não existem comprovações científicas que apontem para contaminação de covid-19 via alimentos.
O ponto alto é, as autoridades chinesas têm deixado boa parte dos seus fornecedores com o cabelo em pé, dada a pressão pelo controle sanitário e suspensões que tem ocorrido em todo o mundo. Apesar de ainda não ter provas de que a transmissão de fato ocorre, as indústrias brasileiras têm se adaptado as exigências e fazendo testes em massa nos trabalhadores.
O que todos nós sabemos é: essa história ainda vai longe, mas a necessidade e a segurança alimentar chinesa é prioritário, logo, após meses de incertezas, o real impacto sobre nossas vendas externas parece nos reduzida.
6. E o que está no radar?