Yago Travagini é economista e consultor de mercado pela Agrifatto
Caroline Matos é zootecnista e trainee pela Agrifatto
Resumo da semana:
A timidez continuou a permear o mercado do boi gordo durante mais uma semana. O preço médio do boi gordo em São Paulo estacionou na casa dos R$ 227,00/@ desde quando o alcançou no final do mês de julho/20 e enfrenta uma resistência extrema para romper qualquer valor acima dos R$ 230,00/@ (na média). As explicações se concentram na oferta de animais, aparentemente o mercado paulista e adjacentes conseguiram adquirir mais bovinos nas últimas semanas, alongando as escalas e diminuindo a pressão de alta. Animais de semi-confinamentos, suplementados a pasto e de TIP finalmente chegaram ao mercado e deram fôlego as indústrias.
Sentindo a escassez de oferta devido aos ajustes produtivos aliado a uma demanda chinesa que não para de crescer e a valorização forte dos insumos (milho e farelo de soja), o preço do suíno vivo bateu mais um recorde de preços nesta semana, atingindo os R$ 7,26/kg posto no frigorífico no estado de São Paulo. Este é um recorde nominal para a suinocultura de corte e é respaldado pelas vendas da proteína no atacado, onde a carcaça suína especial é negociada acima dos R$ 10,40/kg.
E o queridinho, que tenta, mas não consegue sair do nosso resumo da semana é o milho. O cereal rompeu o patamar dos R$ 55,00/sc no mercado físico paulista, acumulando uma alta de mais de 4% na semana, imprimindo uma valorização sem precedentes na colheita da 2ª safra, com uma cotação que já estava alta quando a colheita se iniciou no país (início de junho), e chegando aos “finalmentes” desta colheita com o preço ainda maior, mesmo com uma teórica maior oferta disponível no mercado. O alto nível de antecipação dos negócios desta 2ª safra, o consumo interno crescendo pelas usinas de etanol de milho no MT e o dólar acima dos R$ 5,40 dão sustentação para que esse milho se valorize no país.
Além disso, nesta última semana tivemos divulgação do relatório de oferta e demanda do USDA, as alterações sobre o quadro de oferta e demanda de proteína animal nos EUA mudou muito pouco, com apenas um adendo: o órgão já prevê um aumento nas importações de proteína bovina em mais de 3% em 2020, movimento que vai de encontro ao maior volume embarcado do Brasil para os EUA nos últimos dois meses. No caso dos grãos, o USDA divulgou números ainda maiores para a produção de milho e soja no país, confirmando o impacto do clima favorável sobre as lavouras do país, no entanto, logo após a divulgação a confirmação de fortes tempestades sobre o estado do Iowa preocuparam o mercado e botaram em cheque esse aumento de produção, fazendo com que o preço se valorizasse apesar da perspectiva de maior produção.
1. Na tela da B3
Após sucessivos testes nos R$ 220,00/@, o boi gordo mostrou força e não rompeu os suportes desse patamar, com isso a cotação do vencimento outubro/20 virou durante essa semana, encerrando a sexta-feira cotado à R$ 224,20/@, circulando novamente próximo da resistência dos R$ 225,00/@.
A desvalorização que o físico e o futuro que sofreram na semana retrasada, baseado na melhora das escalas e na maior facilidade de originação de boi gordo, não teve grande respaldo nesta semana, já que vimos a escala recuar dois dias úteis no comparativo semanal, com isso o preço no físico continuou estável, mas sustentado acima dos R$ 227,00/@.
Com o aumento no volume de PUTs negociadas, o número de contratos (futuros + opções) negociados na B3 cresce 5,66% na última semana. Somente as PJs (Financeiras e não financeiras) movimentaram mais de 4,5 mil PUTs, sendo vendendo ou comprando tais papéis.
Apesar dessa movimentação nas negociações de PUTs, o quadro de posicionamento dos players do mercado se alterou muito pouco durante esta semana. Com destaque apenas para o aumento da posição vendida das PJs não-financeiras, que estão com um saldo de 4,44 mil contratos vendido, 446% maior do que era no início de julho/20. Esse aumento de posição pode ser explicado pelas agências financeiras (bancos) tomando posição através de operações com produtores e não deixar a operação “descoberta”.
1.1 O que o mercado futuro proporciona?
A demonstração de solidez do mercado futuro durante a semana, demonstrando cotações acima dos R$ 224,00/@ até o fim de 2020, solidifica o cenário de preços sustentado. Ainda assim, a volatilidade precificada nas opções continua acima dos 13%.
No mercado de opções, a PUT com strike de R$ 215,00/@ para outubro/20 já é negociada com prêmios abaixo dos R$ 2,10/@. A precificação dos prêmios cai conforme o tempo decorrido até o fim do contrato diminui, a proteção se mostra atrativa ainda mais quando se olha um arriscado horizonte até para o último trimestre do ano.
A PUT sintética segue no radar sendo uma estratégia atraente, especialmente se realizada em ajuste com a venda de animais a termo, visto que pode melhorar o preço mínimo se comparada à PUT simples sem incorrer na incidência de ajustes até que o mercado bata o strike da CALL. Uma boa operação a se analisar no atual momento.
Assim como nas opções, os futuros de boi gordo se apresentam como uma opção plausível, no entanto, vale a ressalva que a demanda financeira para este tipo de operação é elevada. Elaborar uma estratégia de vendas parceladas de futuros em % definidas para as próximas semanas, também se mostra como algo interessante para aqueles que buscam proteção. O sentimento de incerteza sobre o caminho que o mercado irá tomar a partir de setembro é forte, o fim dos auxílios governamentais/seguros-desemprego deixa o mercado indeciso, no entanto, as festas de fim de ano e a típica demanda aquecida deste período traz esperança. Mas em um ano que “tudo” foi às avessas, por que a esta tradicional demanda também não seria?
O mercado a termo diminuiu levemente seu aquecimento durante esta semana, os indicativos e ofertas se voltam agora para o último trimestre do ano, no entanto, os preços oferecidos não tem atraído grande parte dos produtores.
2. Enquanto isso, no atacado…
O atacado paulista de carne bovina encerrou a segunda semana de agosto com a ajustes negativos nos produtos, o movimento veio em resposta ao baixo de fluxo de saída e, consequentemente, em um menor número de negociações sendo realizadas.
A carcaça casada bovina fechou a sexta-feira (14) cotada a R$ 14,70/kg, ajuste negativo de R$ 0,10/kg (-0,68%) ante a semana anterior. O dianteiro também cedeu, e fechou em R$ 13,40/kg. A menor procura por proteína bovina vem em linha com a chegada da segunda quinzena do mês, com a população menos capitalizada, o consumo migra para proteína mais baratas. Apesar do decréscimo sazonal, destaca-se o fato de que no comparativo com o mesmo período do mês passado o avanço é de mais de 5% no preço.
Neste cenário, a carcaça casada suína bateu recorde nominal, ultrapassando as máximas registras em dezembro/19. O produto fechou a semana em R$ 10,42/kg, alta semanal de 6,16% e quando comparado ao mesmo período do mês anterior, o avanço é de 29,52%. A exportação a níveis recordes e a demanda interna aquecida dão sustentação aos preços.
O frango, que resistia em romper a barreira dos R$ 5,00 finalmente o fez, encerrou cotado a R$ 5,11/kg, com avanço semanal de 8,39% e na comparação mensal a alta é de 8,62%. A alta nas cotações vem em resposta aos avanços dos insumos, que tem afetado diretamente o poder de compra dos produtores.
3. No mercado externo
A segunda semana de julho/20 trouxe consigo aumento nos volumes embarcados de carne bovina para fora do país, a média diária saiu de 5,90 mil toneladas na 1ª semana do mês para 7,02 mil toneladas na 2ª semana do mês, com isto a média do mês está em 6,60 mil toneladas/dia. Já são 52,80 mil toneladas de proteína bovina embarcadas no mês de julho/20, enquanto que no mesmo período do ano passado foram 46,33 mil toneladas.
A receita obtida com a venda da proteína bovina já chega à US$ 215,80 milhões, com a média diária avançando 13% frente a semana passada, estabelecendo-se em US$ 26,97 milhões/dia. Apesar destes avanços, os números de julho/20 ainda estão abaixo aos de junho/20, o que poderia indicar uma redução mensal da exportação de carne bovina, no entanto, com 15 dias úteis restantes, estimamos que julho/20 reserve uma exportação entre 130 a 150 mil toneladas de proteína bovina, dentro da linha dos últimos meses.
Apesar da aceleração e da melhora de 6% na média diária de milho exportada para fora do país, os embarques de cereal ainda seguem lentos frente ao mesmo período de 2019. Nos oito dias úteis de julho/20 foram exportadas 809,41 mil toneladas de milho, com uma média de 101,17 mil por dia. No comparativo com julho/19 a redução nos embarques chega a 60,73%.
A receita gerada pelas exportações de milho chegou a US$ 130,51 milhões nestes oito dias úteis de julho/20, mais do que o dobro de todo o mês de junho/20, no entanto, assim como o volume enviado, a receita obtida ainda está em níveis bem abaixo quando comparado a 2019. A tendência é que os embarques se intensifiquem apenas em agosto/20, com números compatíveis com os de 2019.
Justificada pela redução na oferta de oleaginosa disponível, a média diária dos embarques de soja para fora do país reduziu praticamente ¼ dentro de uma semana, saindo de 648,09 mil toneladas na primeira semana para 489,45 mil toneladas na segunda semana. Ainda assim, os números de julho/20 são mais de 50% maiores dos os que foram registrando em julho/19.
A receita obtida com a venda da soja já ultrapassou US$ 1,00 bilhão, e mesmo com a redução na oferta, deve chegar a mais de US$ 2,5 bilhões até o fim do mês. A janela de envio de soja para fora do país vai se fechando no Brasil, dando lugar aos embarques de milho, que devem começar a ocupar o lugar da oleaginosa nos navios graneleiros.
4. A compra do pecuarista
Apesar de querer de falar de outro assunto aqui na coluna da “compra do pecuarista” não tem jeito, o milho continua sendo a “bola da vez” para aqueles que precisavam adquiri-lo. O cereal que quando iniciou a colheita já tinha um dos maiores preços nominais da história, em torno dos R$ 50,00/sc, nutria a expectativa de desvalorização durante o processo de colheita. No entanto, diferentemente dos últimos quatro anos, desde o início de junho/20 a cotação do milho em São Paulo já subiu mais de 11,60%.
Tal movimento atípico é explicado pelos fatos que já comentamos anteriormente aqui, como o dólar, o alto volume negociado antecipadamente e a baixa “vontade” dos agricultores em negociarem o restante disponível a preços de mercado, já que esses estão bem capitalizados. Além disso, nessa última semana, surgiu o fator climático nos EUA, que fez as cotações do cereal norte-americano subirem vertiginosamente devido aos problemas com os fortes ventos e alagamentos enfrentados em um dos maiores estados produtores do país, o Iowa.
E o rally de alta do milho parece não parar por enquanto, já que a B3 aponta a cotação do milho para meados de setembro/20 acima dos R$ 58,00/sc. A valorização deste contrato é ainda mais impressionante que a do milho no físico, já que no dia 01/06/2020 a cotação do vencimento setembro/20 era de R$ 43,80/sc, e na última sexta-feira fechou à R$ 58,38/sc, valorizando 33% no período, destacando assim que a força do milho veio durante a colheita da 2ª safra no Brasil.
Acredito que o movimento esteja chegando a uma saturação, principalmente devido a competição nas exportações que devemos sofrer com a entrada do milho dos EUA. No entanto, o dólar da muita competitividade ao cereal brasileiro, e a curva na B3 demonstra que há espaço para que o vencimento setembro/20 venha até os R$ 60,00/sc. A movimentação dos agricultores que ainda tem cereal é que ditará o ritmo da possível evolução desses preços.
5. O destaque da semana
O destaque da última semana fica para os números parciais de abate de animais no Brasil divulgados pelo IBGE, que apontam uma redução de 9,7% no total de bovinos abatidos em comparação ao mesmo período do ano passado e de 1,2% quando comparado ao 1°trimestre de 2020. No total, foram abatidas 7,17 milhões de cabeças abatidas sob algum sistema de inspeção no Brasil.
A produção de carne bovina, consequentemente, também desacelerou. Foram produzidas 1,85 milhão de toneladas de carcaças bovinas, demonstrando uma queda de 0,5% ante o trimestre anterior e de 6,6% em relação ao mesmo trimestre do ano anterior. A queda foi menor justamente pela participação menor das fêmeas, o que garantiu na média, um peso maior de abate dos animais.
Na esteira da queda, a produção de aves também recuou, com o abate de 1,40 bilhão de cabeças de frangos, uma redução de 1,6% foi observada no comparativo anual e baixa ainda mais acentuada ante o 1°tri/20, registrada em -7,2%. Os reflexos dos ajustes produtivos iniciados em março/20 devido a pandemia começaram a refletir já em meados de maio/20 sobre a produção de frangos, devido o ciclo de produção ser mais curtos.
Em contrapartida o abate de suínos avançou 5,9% no último ano, com 12,07 milhões de cabeças sendo abatidas no 1°tri/20. Já na comparação com o trimestre anterior a alta registrada foi de 1,6%, e isso se deve ao maior descarte de animais feito pelos produtores diante da queda vertiginosa dos preços durante a pandemia, desestimulando a atividade. A expectativa é que essa redução na capacidade produtiva já está sendo refletida a partir de agora, já que vemos o preço do suíno chegar as máximas históricas.
6. E o que está no radar?