São Paulo – Enquanto o maior player do setor de carnes perdeu espaço no mercado brasileiro, os pequenos e médios abatedouros aproveitaram a brecha para crescer. Neste ano, a participação destas empresas nos abates deve chegar a 66%.

De acordo com a diretora da consultoria Agrifatto, Lygia Pimentel, em 2016 essas empresas responderam por cerca de 62% dos abates, o equivalente a 18,3 milhões de cabeças, considerando as 29,6 milhões abatidas no ano passado, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), que deve divulgar os dados de 2017 no próximo mês de março.

Esse aumento de participação se deve às mudanças substanciais que o mercado enfrentou neste ano, com a JBS reduzindo as compras. Além disso, ao longo de 2017, a margem entre o preço da arroba e o da carcaça – que costuma ser negativa – se manteve no terreno positivo, o que é um indicador de melhora da receita para todas as empresas do setor. Desta forma, mesmo aquelas que não trabalham com desossa, realidade comum a muitas das médias e pequenas indústrias de carne bovina no País, tiveram maior facilidade de ampliar a receita. “Praticamente durante o ano todo o valor da carcaça ficou acima da arroba e isso é inédito. Foi um período muito interessante para essas indústrias”, avalia.

Ela explica que o preço da carcaça é menos volátil que o da arroba e, por isso, seguiu firme enquanto o valor pago pelo boi gordo despencou logo após a operação Carne Fraca, a delação premiada e a posterior prisão dos sócios da JBS, os irmãos Wesley e Joesley Batista.

“Esse spread tende a oscilar de acordo com o ciclo pecuário e, como estamos em baixa, essa diferença positiva tende a permanecer para o ano que vem”, avalia Lygia.

Entre as empresas que aproveitaram a chance para crescer está a Naturafrig, de Rochedo (MS). Com quatro abatedouros, dois em Mato Grosso do Sul, um em São Paulo e outro em Mato Grosso, a companhia ampliou de 2 mil para 2,5 mil por dia o número de animais abatidos, uma alta de 25%. “Tivemos um ano melhor que todos os outros”, comemorou o sócio-diretor Alberto Sérgio Capuci.

Além de ampliar os abates, a empresa pretende começar a exportar para a China ainda neste ano e, em 2018, dar início aos embarques para a União Europeia. A empresa exporta 15% da produção para os países da chamada Lista Geral (que não exigem certificações). “Até então era complicado ampliar o acesso ao mercado externo, mas diante desse cenário os importadores também estão procurando diversificar as fontes”, disse.

Para ele, a presença de uma gigante como a JBS no mercado estrangula os pequenos e médios frigoríficos. “Eles tinham muitas vantagens que nós não tinhamos acesso. Pelo menos agora a briga ficou mais justa”, avaliou.

Confiança

O que pesou a favor de empresas como a Naturafrig foi a confiança. Logo após a delação premiada dos irmãos Batista, a JBS – que respondia por 25% dos abates no Brasil em 2016 – deixou de oferecer aos pecuaristas a possibilidade de escolher entre vender o gado a prazo (com 30 dias para pagamento) ou à vista, o que deixou os produtores alarmados.

Desde então, os produtores passaram a dar preferência aos acertos à vista, explica o presidente da Comissão de Pecuária de Corte da Federação da Agricultura e Pecuária de Goiás (Faeg), Maurício Velloso. “O pecuarista compreendeu que vale mais a pena vender por menos e à vista e ter um processo de comercialização em parceria.”

Para o CEO da Frigol, Luciano Pascon, essa será a base para as empresas que quiserem continuar a crescer no setor. “As relações entre produtor e indústria têm que ser reconstruídas. As empresas que compartilham dessa visão provavelmente terão mais êxito do que outras.”

A companhia, com sede em Lençóis Paulista (SP), também aproveitou as mudanças no mercado para se expandir, e arrendou uma unidade do Rodopa Alimentos, em Cachoeira Alta (GO), recentemente. Com esse movimento, ampliou a capacidade de abate em 25%, para 60 mil cabeças por mês, com receita estimada para este ano de cerca de R$ 2 bilhões.

Pascon acredita que essa reorganização do mercado terá uma estabilização em 2018. “Houve uma expansão bastante significativa dessas empresas menores e será um desafio manter o espaço conquistado no próximo ano”, salienta.

O executivo justifica que muitos dos pequenos e médios não têm acesso ao mercado de produtos de qualidade, e devem se limitar à commodity, o que diminui os ganhos. “Além disso, com a expansão do número de empresas buscando essa matéria-prima, o preço do boi pode se sustentar ou até subir”, destacou o CEO do Frigol.

(DCI – 27/11/2017)