Sergio Pimentel é zootecnista, pós-graduado em julgamento de raças zebuínas e empresário rural na Fazenda Rancho Fundo
sergiopimentel87@gmail.com
Quando falamos em pecuária de cria, qual seria o conceito ideal para se atingir eficiência com produtividade e progresso genético?
De acordo com dados da Agrifatto baseados em números da ASBIA – Associação Brasileira de Inseminação Artificial -, em 2015 apenas 9,3% do rebanho foi inseminado artificialmente. A taxa considera a aplicação de 1,8 dose de sêmen por matriz, o que resulta em um rebanho inseminado de 7 milhões de fêmeas. Nesse contexto, deve-se ainda considerar que a grande maioria não trabalha com touros melhoradores mas, sim, animais ‘’cabeceira de boiada’’ (ou animais sem mérito genético comprovado), fica bem claro o quanto podemos crescer em eficiência desde que trabalhemos no caminho certo.
Quando o assunto é estação de monta, há grandes diferenças entre os índices médios das propriedades e a eficiência do sistema, sendo que as fazendas de maior progresso são aquelas focadas em maior eficiência no menor espaço de tempo, com alto ganho genético.
Com a taxa média de desmama no Brasil gira em torno de 62%, bem como o peso médio à desmama em torno de 180 kg, a necessidade de mudanças no cenário da cria é de extrema urgência no nosso pais.
Por outro lado, há propriedades que se superam a cada ano, com índices surpreendentes e muito acima da média. Isso significa que, dentro de um cenário de aplicação tecnológica e um contexto de excelência, nossa pecuária de cria se torna extremamente competitiva e ainda é extremamente capaz de superar gargalos.
Sendo assim, o que seria a matriz ideal para o sistema de produção brasileiro? Em outras palavras, o que você espera de suas vacas de cria? Qual é o seu objetivo de seleção? Em quais índices zootécnicos devemos concentrar nossas atenções?
Sem essas respostas, corremos o risco de obter multiplicação de animais sem um progresso genético efetivo ou de progredir em uma característica genética que seja antagônica ao meu sistema de produção.
Foto: Sergio Pimentel/Fazenda Rancho Fundo
Assim, trataremos de pontos vitais para estabelecer o que se espera de uma vaca de cria dentro do contexto de cada propriedade:
- Programação fetal
Como tudo começa na concepção e já está mais do que provado que fêmeas que sofrem restrição alimentar durante a gestação, consideramos que sua progênie apresentará potencial produtivo reduzido se mantida nessas condições.
O que ocorre nesses casos, é que o animal possui o gene, mas não encontra oportunidade de manifestá-lo. Esse gene segue bloqueado devido ao déficit nutricional na gestação.
Sendo assim, o planejamento da estação de monta é a principal ferramenta para otimizar o potencial produtivo e para oferecermos as melhores condições ambientais e nutricionais para os animais expressarem seu potencial.
Está provado também que os animais nascidos entre agosto, setembro e outubro são os mais pesados ao desmame, e as vacas paridas nesse período possuem os melhores índices de concepção, bem como intervalos entre partos mais curto.
O peso ao desmame dos bezerros cai, em média, 15 kg de um mês para o outro, e a diferença de peso ao desmame no mesmo sistema, no mesmo período, pode ser de até 40 kg entre um bezerro de agosto se comparado a um nascido em janeiro.
- Estação de monta
Sendo assim, trataremos de uma estação de monta ideal, que seria a mais curta possível com maior número de concepções entre os primeiros 40 dias de estação.
Para isso, 70% dos nascimentos devem ocorrer nos primeiros 40 dias da estação de nascimento. Assim, conseguiremos trabalhar com uma monta bastante reduzida com altas taxas de prenhêz já logo no início da estação, de modo a repetir o sistema todos os anos. Sendo assim, teremos maior peso ao desmame e maiores taxas de concepção no mesmo sistema e com o mesmo custo.
O mês em que ocorre a primeira concepção da novilha define toda a sua vida reprodutiva.
Novilha que emprenha tarde na estação de monta, sai cedo do sistema e muitas vezes não por ser ineficiente, mas sim por não ter tido condições mínimas de conceber.
Fazendas que, em ocasião do descarte de vacas vazias ao final da estação, possuem alto índice de primíparas ou secundíparas, dão sinal de falha no sistema. Nesse caso, o material genético mais novo está sendo descartado não por ineficiência, mas sim por falta de condição de expressar seu potencial produtivo. Desta forma, o progresso genético da propriedade é muito lento ou mínimo.
Precisamos adotar conceitos modernos que valorizem a eficiência do sistema e do conjunto vaca/bezerro.
De que adianta aumentar em 15 kg o peso ao desmame de um bezerro se a genética utilizada também aumenta 15 kg no peso adulto da matriz, aumentando assim sua exigência de manutenção?
Quando estabelecemos uma seleção por porcentual de quilos de bezerro desmamado em relação ao peso vivo da matriz, a conta fica muito mais interessante.
Como a melhor forma de melhorar os índices zootécnicos é descartar o que apresenta resultados abaixo da média (ou ineficientes dentro do sistema), é primordial a avaliação individual da produtividade das matrizes.
Em outras palavras, uma coisa é eficiência reprodutiva e outra eficiência produtiva.
Isso significa que não adianta uma vaca ser precoce, ter um intervalo entre partos de 12 meses e desmamar um bezerro com 20% do seu peso vivo, bem como também apresenta ineficiência uma vaca que desmame um bezerro com 60% de seu peso e tenha um intervalo entre partos longo. Em ambos os casos, os sistemas apresentam baixa eficiência.
Um modelo de altíssima eficiência de cria contaria com:
- Uma matriz que atingisse seu primeiro parto até os 26 meses de idade;
- Que obtivesse um intervalo entre partos de 12 meses;
- Que desmamasse um bezerro com 40% de seu peso vivo; e
- Cujo peso ajustado do bezerro aos 210 dias seja de 40% do peso de um boi (500 kg).
Nesse sistema, o resultado em 40 meses é uma matriz superprecoce, com 2 partos e prenhe do terceiro.
Se selecionarmos apenas por quilos de bezerro desmamado em relação ao peso vivo da matriz, corremos o risco de selecionar fêmeas muito pequenas e animais com baixo peso de abate em ambientes mais restritivos devido à interação genótipo X ambiente.
Para estabelecer metas, o que seria um bezerro em condições ideais? Um animal que:
- Aos 7 meses de idade (210 dias) atinge 40% do peso da mãe e 40% do peso de um boi (500 kg);
- Que corresponda a um peso ao desmame ajustado aos 210 dias de 200 kg;
- Que apresente ganho médio diário de 0,785 kg/dia, considerando um peso médio ao nascer de 35 kg.
Em resumo, uma matriz de até 500 kg de peso vivo que desmame um bezerro com 40% de seu peso, corresponde a um bezerro com 200 kg aos 210 dias com ganho médio diário de 0,785 kg/dia.
Assim, dentro do modelo aqui idealizado, selecionaremos fêmeas com alta precocidade sexual, que desmamam bezerros com alto porcentual de seu peso vivo, em um curto intervalo entre partos, garantindo assim um sistema mais eficiente, que produz bezerros que aos 7 meses de idade apresentam 40% do peso de um boi adulto.
Isso significa quase metade do caminho andado já aos 7 meses. Economicamente, resulta em maior diluição de custos fixos e, consequentemente, em maior produtividade por área considerando o mesmo rebanho.
Na prática, a conta em 40 meses é a seguinte:
(1 matriz superprecoce) + (1 cria adulta de 16 meses) + (1 bezerro/a ao pé) + (1 gestação)
3 = 4
- Simulações comparativas por eficiência
Sistema 1
N = 500 vacas (500 kg de peso vivo)
Porcentual em quilos de bezerro desmamado/PV matriz: 30%
Taxa de desmama = 80% (400 bezerros/ano)
Peso médio bezerros (210 dias): 175 kg
Produtividade anual: 175 quilos x 400 animais = 70.000,00 kg de bezerro/ano
Sistema 2
N = 500 vacas (500 kg de peso vivo)
Porcentual em quilos de bezerro desmamado/PV matriz: 40%
Taxa de desmama = 80% (400 bezerros/ano)
Peso médio bezerros (210 dias): 200 kg
Produtividade anual: 200 quilos x 400 animais = 80.000,00 kg de bezerro (+14,2%)
- Conclusões
Por selecionar fêmeas mais eficientes, o sistema 2 produziu 10.000,00 kg de bezerros a mais, um crescimento de 14,2% dentro de um mesmo rebanho, já que selecionou matrizes que desmamam bezerros com maior porcentual de seu peso vivo.
Reforçando: a melhor forma fazer subir a média, é eliminar o que está abaixo dela.
A produtividade com esse nível de eficiência em alta lotação animal torna a cria extremamente competitiva.
Altas lotações combinadas à baixa eficiência reduzem os índices zootécnicos, resultam em baixo progresso genético e pioram o resultado econômico da atividade.