O Banco Central cortou nesta quarta-feira a Selic em 0,25 ponto, em linha com expectativa majoritária do mercado, à nova mínima histórica de 2% ao ano, e manteve a porta aberta para novos ajustes na taxa de juros à frente, embora tenha pontuado que, se vierem, eles serão ainda mais graduais e dependerão da situação das contas públicas.
“O Copom (Comitê de Política Monetária) entende que a conjuntura econômica continua a prescrever estímulo monetário extraordinariamente elevado, mas reconhece que, devido a questões prudenciais e de estabilidade financeira, o espaço remanescente para utilização da política monetária, se houver, deve ser pequeno”, disse o BC em comunicado
“Consequentemente, eventuais ajustes futuros no atual grau de estímulo ocorreriam com gradualismo adicional e dependerão da percepção sobre a trajetória fiscal, assim como de novas informações que alterem a atual avaliação do Copom sobre a inflação prospectiva”, acrescentou.
Em pesquisa Reuters, 35 dos 41 analistas consultados haviam estimado uma redução desta magnitude, enquanto seis previram manutenção dos juros básicos em 2,25%.
Esta foi a nona redução consecutiva da Selic, dentro de ciclo de afrouxamento iniciado em agosto do ano passado, e veio após a autoridade monetária destacar em junho que um novo corte seria residual.
A mensagem foi renovada nesta quarta-feira, com o Copom frisando que, para seus próximos encontros, irá avaliar os impactos do surto de Covid-19 na economia e as medidas já adotadas pelo governo para enfrentá-los, antevendo que “um eventual ajuste futuro no atual grau de estímulo monetário será residual”.
A próxima reunião do Copom acontece em 15 e 16 de setembro e, depois disso, o colegiado se reúne outras duas vezes neste ano, em outubro e em dezembro.
O mercado aguardava em peso o comunicado do BC em busca de pistas mais concretas sobre o fim expresso do ciclo de distensão dos juros ou uma parada com chance de retomada nos cortes adiante.
Após o BC ter destacado, em suas comunicações públicas, que o ritmo de evolução da economia —e seu consequente impacto na inflação— seria seu principal fator de análise para a tomada de decisão sobre os juros, o comunicado desta quarta-feira jogou mais luz sobre a visão da autoridade monetária a respeito de uma recuperação parcial.
Segundo o BC, os setores mais diretamente afetados pelo distanciamento social permanecem deprimidos, apesar da recomposição da renda gerada pelos programas do governo, numa provável referência ao desempenho dos serviços.
“Prospectivamente, a incerteza sobre o ritmo de crescimento da economia permanece acima da usual, sobretudo para o período a partir do final deste ano, concomitantemente ao esperado arrefecimento dos efeitos dos auxílios emergenciais”, disse.
Em nota, o economista-chefe do Banco Fator, José Francisco de Lima, avaliou que o espaço ficou entreaberto para quedas adicionais da Selic, embora o panorama traçado pelo BC pareça corroborar manutenção dos juros no piso até o fim de 2021.
Ele também chamou a atenção para a menção ao gradualismo adicional em eventual redução da taxa básica, ponderando se isso poderia significar um corte de 0,125 ponto após a tesourada de 0,25 desta quarta-feira.
O economista sênior do Banco MUFG Brasil, Mauricio Nakahodo, opinou que este deve ter sido o último corte do ciclo.
“A atividade econômica está se recuperando gradualmente e acreditamos que continuará assim nos próximos meses”, disse. “E o quadro fiscal, receio de frustração no campo das reformas, incerteza sobre gastos, defasagem da política monetária e dúvidas sobre a eficácia de mais cortes de juros devem levar o BC a adotar postura mais cautelosa.”
SEM ALTA DE JUROS À VISTA
No comunicado, BC também reiterou que os diversos programas de estímulo ao crédito e de auxílio direto que foram implementados no combate à pandemia de coronavírus podem ajudar a economia, consolidando assimetria altista ao balanço de riscos para a inflação.
Apesar de enxergar uma chance maior de a inflação ficar acima do que abaixo do calculado em seu cenário básico, o colegiado disse não antever altas na Selic a menos que as expectativas e projeções para a inflação fiquem suficientemente próximas das metas no seu horizonte relevante para a política monetária, que inclui 2021 e, em menor grau, o ano de 2022.
Em relação à novidade, o economista Alexandre Schwartsman, da consultoria econômica Schwartsman & Associados, avaliou que a mensagem parece ser a mais próxima de uma orientação futura (forward guidance) que o BC já adotou, numa possível tentativa de impedir que curva de juros fique mais acentuada quando o processo de relaxamento monetário acabar.
“Tudo posto, embora ainda haja uma pequena chance de um movimento final nos juros (de 0,25 ponto?) em meados de setembro, eu não apostaria nisso, mesmo que ainda acredite que a decisão de encerrar o processo de flexibilização esteja errada”, escreveu ele, em nota.
Sobre o avanço de preços na economia, a visão do BC é que diversas medidas de inflação subjacente (núcleos de inflação) permanecem abaixo dos níveis compatíveis com o cumprimento da meta para a inflação no horizonte relevante.
O BC atualizou seus cálculos para o IPCA no cenário híbrido —que considera a Selic extraída da pesquisa Focus e taxa de câmbio constante a 5,20 reais—, a 1,9% neste ano e 3,0% em 2021, abaixo dos níveis vistos em junho em 2% e 3,2% respectivamente. Para 2022, a expectativa é de um IPCA de 3,4%.
A meta de inflação deste ano é de 4,0%. Para 2021 é de 3,75% e para 2022 é de 3,5%, nos três casos com margem de tolerância de 1,5 ponto para mais ou para menos. (Reuters)