“Se a China der um sopro, para o Brasil isso representará um furacão”. Assim a consultoria Agrifatto, especializada em pecuária, descreveu a importância do país asiático para os produtores de gado e para a indústria nacional de carne bovina. Em relatório, a consultoria traçou um paralelo entre a atual dependência dos frigoríficos brasileiros em relação à China e ao papel exercido pela Rússia, mercado muito relevante para a pecuária brasileira no passado recente.
Antes da emergência chinesa como grande importadora de carne bovina, eram as habilitações de frigoríficos por Moscou – e os corriqueiros embargos comerciais e sanitários aplicados pelo país – que provocavam furor em empresários do setor frigorífico.
Mas se a Rússia já teve o poder de ocasionar abalos consideráveis nos preços da carne e do boi gordo, e era temida por isso, a verdade é que a importância chinesa é muito maior. No fim de 2017, recorda o relatório da Agrifatto, Moscou bloqueou todos os frigoríficos brasileiros, o que fez as indústrias despejarem um volume significativo de carne no mercado doméstico, pressionando as cotações em 2018.
Atualmente, a China absorve aproximadamente 10% da produção brasileira de carne bovina. A Rússia representava 2% na época dos embargos, segundo a Agrifatto. Do lado dos importadores chineses, os frigoríficos brasileiros têm a mesma importância que tiveram para os russos no passado – 9% do consumo da proteína bovina no país é oriunda do Brasil.
“A exposição brasileira à China é muito maior do que sua exposição perante a Rússia em 2017. […] O que ocorreria caso a China resolvesse restringir ou condicionar suas compras?”, indaga a Agrifatto, indicando uma reflexão sobre o assunto, especialmente neste momento crítico de pandemia.
Em meio aos esforços para tentar conter a covid-19, Pequim decidiu bloquear mais de 20 frigoríficos em todo o mundo – três deles são brasileiros. As medidas aconteceram mesmo sem evidências científicas de que os alimentos transportados possam transmitir o vírus, e fontes do setor avaliam que a decisão da China visa a dar uma satisfação à população do país, uma estratégia que teria ganhado importância com a associação dos novos casos em Pequim à contaminação por meio de salmão comercializado em um grande mercado na capital chinesa.
Apesar da dependência brasileira, a Agrifatto pondera que a chance de uma redução do volume importado pela China é pequena por que o país ainda lida com a falta de carne provocada pela epidemia de peste suína africana, que restringiu a oferta de porcos. De qualquer forma, toda atenção é necessária.
“O alerta deve permanecer ligado, já que a carne bovina tem um preço por tonelada maior que a proteína suína e a de frango e, caso o governo chinês encontre substitutos para a carne bovina brasileira, os preços pecuários poderiam ser impactados”, destacou a consultoria. No momento, o cenário para os pecuaristas brasileiros segue positivo. Com oferta restrita no campo, os preços do boi gordo seguem em um dos maiores níveis da história. (Valor)